Porto de Itajaí, em Santa Catarina: infraestrutura portuária é um dos gargalos da economia brasileira
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A era Lula de boas taxas de crescimento está sendo abandonada. No segundo mandato, longe de conselheiros liberais, o presidente Lula mostrou, com nitidez, capacidade de decidir pelo caminho do crescimento com inclusão social. O Brasil cresceu entre 2007 e 2010, em média, 4,5% ao ano, a despeito do tênue crescimento negativo do ano de 2009. O Brasil está retornando para a fase do crescimento medíocre. A taxa de desemprego ainda continua baixa, mas a geração de empregos formais sinaliza o enfraquecimento gradual da economia.
No ano de 2011, o governo errou e errou muito. Tentou desacelerar a taxa de crescimento do ano de 2010, que havia sido 7,5%, para algo em torno de 4,5%. Errou a mão: o crescimento de 2011 foi de 2,7%. A política monetária elevou os juros Selic ao longo do primeiro semestre do ano passado. Cortes de R$ 50 bilhões nos gastos públicos foram prometidos. O superávit primário foi aumentado em R$ 10 bilhões.
De fato, era necessário desacelerar o ritmo de crescimento estabelecido em 2010. O motivo não era a aceleração da inflação. Era preciso desacelerar a economia porque existem gargalos de infraestrutura, mão de obra qualificada e outros. O ritmo de crescimento de 4,5% dá o tempo necessário ao rompimento dos gargalos sem apagar a economia.
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Expectativas pessimistas
Ao derrubar a economia para o crescimento insatisfatório de 2,7%, o governo gerou um clima de expectativas pessimistas. Empresários ficaram em compasso de espera. Foi nessa conjuntura de desânimo que a crise europeia chegou ao Brasil. Diferentemente, a crise americana de 2008 chegou ao país em um momento de forte crescimento e expectativas otimistas.
Parte das políticas anticíclicas de 2008/2009 foram repetidas em 2011/2012. As políticas de desoneração, ampliação do crédito e redução de juros foram retomadas. Mas, a política fiscal anticíclica de 2008/2009 não foi aplicada em 2012. Em 2009, o superávit primário foi reduzido de 3,8% do PIB para 2,5%. Hoje, as perspectivas de reação não são boas. O governo repete o que não terá grande impacto e não repete o que teria. A política fiscal de gastos difere das políticas de desoneração e monetária porque enquanto a primeira depende apenas de decisões do governo, as outras dependem de haver reação do setor privado, dependem de expectativas.
As políticas de desoneração e creditícias dependem, portanto, de expectativas otimistas para funcionar. O empresário somente toma um empréstimo para investir hoje se espera vender amanhã. Acontece que o governo, em 2011, e a crise europeia, agora, construíram um cenário de paralisia com expectativas pessimistas. A alternativa do governo seria utilizar a política fiscal acelerando gastos e implementando novos projetos de investimento.
O governo federal, contudo, parece estar lento para realizar projetos de investimentos. Não se sabe exatamente o motivo. Podem ser problemas políticos, de excesso de centralização, de excesso de controles, de falta de pessoal… muita coisa pode ser. Uma alternativa imediata seria estimular os estados e municípios a realizarem investimentos dando-lhes incentivos. Um caminho seria o governo federal renegociar as dívidas que Estados e municípios têm com a União e carimbar os recursos novos com a rubrica investimentos.
Gastos com investimento
Os contratos de dívida, assinados no final dos anos 1990 entre a União e os entes subnacionais são inadequados aos novos tempos. Os Estados pagam ao governo federal a variação da inflação medida pelo IGP-DI (Índice Geral de Preço – Disponibilidade Interna) mais juros de, pelo menos, 6% ao ano. E comprometem, dependendo do Estado, 11,5%, 13% ou 15% das suas receitas para pagamento das parcelas devidas. Em uma renegociação, a taxa mais adequada a ser cobrada pelo governo federal aos Estados deveria ser a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo), que é a taxa cobrada ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) pelo Tesouro Nacional. E é hora de dar munição a cada Estado para realizar investimentos reduzindo a parcela da sua receita líquida real que é transferida à União como compromisso de pagamento da dívida.
O governo federal precisa descentralizar imediatamente as ações de investimento. A União tem ampliado muito a sua participação no investimento público total quando contabilizamos as três esferas de governo. Saiu de 12,5%, em 2003 para mais de 28%, em 2010. Entretanto, pode-se perceber que Estados e municípios têm um peso que pode ser decisivo, especialmente, em um momento de enfrentamento de crise internacional: Estados e municípios investiram, em 2010, mais que 70% do investimento público total (considerando-se as esferas federal + estadual + municipal).
A repactuação das dívidas dos Estados e municípios é uma saída politicamente acertada e economicamente factível. Os recursos liberados pela União aos Estados e municípios precisariam ser carimbados para o investimento. Essa seria uma saída de política anticíclica que descentralizaria, agilizaria e ampliaria os gastos com investimentos. As desonerações e a ampliação do crédito, isoladamente, não serão transformadas em ampliação do gasto privado porque as expectativas não são otimistas. É hora da política de gastos com investimentos e não de austeridade fiscal.
* Texto publicado originalmente na revista CartaCapital
João Sicsú é professor doutor do Instituto de Economia da UFRJ e ex-diretor do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)
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