Cerca de 65% da população carcerária do estado de São Paulo tem entre 18 e 36 anos, e muitos destes jovens detentos não enxergam a prisão como uma experiência negativa. Pelo contrário, diz o pesquisador do Gevac – Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) Felipe Athayde Lins de Melo: “eles acreditam que passar pela prisão é uma forma de construir uma caminhada, ou seja, uma trajetória no crime”.
“A reclusão deixou de ser há muito tempo uma barreira na vida das pessoas. Passar pela prisão para boa parte desta juventude é visto como chance de construir o que eles chamam de uma ‘caminhada’. Ou seja, se estou em um posto mais subalterno no crime, posso desenvolver algumas ações para ganhar reconhecimento. E no mundo do crime isso significa cometer algumas ações de oposição ao Estado, sobretudo às forças policiais. Neste contexto, ir à prisão é um caminho onde você, além de ganhar reconhecimento, constrói relações”, analisa o autor de “As prisões de São Paulo” (Alameda, 238 págs, R$40,00).
O cotidiano das prisões
Embora muitos jovens criminosos enxerguem a prisão como ‘faculdade’ e também uma oportunidade de crescimento no mundo do crime, Athayde Melo destaca que o convívio no cotidiano das penitenciárias de São Paulo é marcado pela tensão. Para exemplificar, ele relembra um episódio envolvendo presos em conflito com o PCC (Primeiro Comando da Capital) que foram transferidos provisoriamente para uma unidade que abrigava detentos por crimes sexuais.
Leia mais:
Prisões de SP são administradas em articulação do Estado com o mundo do crime, diz pesquisador
Palestinos presos em cadeias israelenses desenvolvem curso de formação política
DOI de São Paulo ensinou técnicas de tortura a chilenos, uruguaios e argentinos em 1974, revela livro
“O convívio nas penitenciárias é marcado pela tensão diária. No livro, narro uma situação em que, para reconquistar o respeito do PCC, alguns presos promoveram um motim, decapitaram algumas cabeças e avançaram para um processo que é chamado de ‘tomar a cadeia’. Esse é o tipo de situação em que os presos são levados para um lugar onde eles não deveriam estar, levantando a dúvida sobre qual é o motivo do Estado colocar esse tipo de preso – em conflito com a facção – na unidade prisional que recebe presos por crime sexual”, indaga.
Edson Lopes Jr./ GESP
Penitenciária de Presidente Venceslau é uma das prisões de segurança máxima do Estado de São Paulo
Athayde Melo também narra situações em que, para desenvolver projetos educacionais dentro da penitenciária, foi necessário pedir autorização para os chefes do crime. Para o pesquisador, este tipo de negociação acontece diariamente nas prisões de São Paulo e quem faz a gestão destes processos não é o Estado. “A divisão dos espaços e das tarefas – que são negociações de tensão entre os presos – dentro das unidades prisionais é administrada pelo crime”, analisa
Em nota oficial, a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) afirma “desconhecer os fatos relatados levianamente pelo pesquisador, que não condizem com a realidade do sistema prisional paulista”.
“Felipe Athayde Lins de Melo nunca teve autorização da SAP para a realização de qualquer pesquisa. Sua atuação em presídios foi única e exclusivamente na área educacional, como servidor comissionado da Fundação Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel”, diz a nota.
As prisões de São Paulo
Editora: Alameda
Número de páginas: 238
Preço: R$40,00
Compre online
NULL
NULL