A partir do dia 15 de julho, todos os equipamentos usados para transmitir telegramas vão parar de funcionar
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No auge da sua existência, na década de 1930, seus 160 mil quilômetros de linhas espalhadas pela Índia carregavam 17 milhões de mensagens telegráficas todos os anos. No início da sua vida centenária, foi importante até para frear uma revolta popular contra o Império Britânico. A partir do dia 15 de julho, pondo um fim a 163 anos de trabalho, não será mais possível enviar um telegrama na Índia.
Há cerca de um mês, o Escritório Central de Telégrafos em Mumbai recebeu uma nota enviada pela chefia da empresa. Em não mais do que alguns parágrafos, explicavam aos funcionários que as operações de telegrama seriam desativadas na Índia. “É isso. Todas as histórias, todas as lembranças, tudo. Apenas uma carta, e é isso”, descreve Pradip Borse à revista indiana Open.
Notadamente, o telegrama foi engolido pelas novas tecnologias. Diante de emails gratuitos e serviços SMS baratos, não tinha chances. Nos anos oitenta, o escritório de Mumbai enviava mais de 3 mil mensagens todos os dias. Conforme meios de comunicações mais ágeis foram ficando disponíveis, o serviço telegráfico entrou em decadência. Nas últimas semanas, a equipe de telegrafadores não consegue superar a marca dos vinte telegramas por dia.
Em 2009, o custo de uma mensagem subiu de 5 para 25 rúpias (R$ 0,94), a cada 30 palavras enviadas. No Brasil, onde o serviço ainda é oferecido pelos Correios, o telegrama é cobrado por página e sua opção mais barata não sai por menos do que R$ 6,00.
Para o funcionário VA Kardhakar, todos sempre souberam que o fim era inevitável desde que os telégrafos foram separados do departamento postal na Índia. “Além de algumas poucas instituições e algumas pessoas mais velhas que parecem ainda gostar de telegramas, quase ninguém usa o serviço.”
No escritório, todos têm saudade dos tempos áureos. “Era um trabalho de prestígio”, diz Rama Nair, chefe da seção de telegramas ditados pelo telefone. O processo de seleção — que teve seu último recrutamento na década de 1980 — era rigoroso. “Tive que tirar 75%”, lembra.
Enquanto permaneceu como o único meio de comunicação rápido, seu papel foi soberano. Talvez com um pouco de exagero, muitos acreditam que a Revolta dos Cipaios de 1857 só não obteve sucesso, pois os revoltosos encontraram nas linhas telegráficas seu maior inimigo. Com a vantagem da comunicação, as forças do Império Britânico ficaram sabendo do levante com antecedência e logo mobilizaram tropas para esmagar a rebelião. Mais tarde, quando os cabos submarinos ligando Londres a Délhi foram colocados, ficou mais fácil para o império controlar e acompanhar as notícias da colônia.
Com o avanço da tecnologia, a dependência física de fios e cabos foi superada por transmissões a partir de torres e via web. Só não conseguiu superar a facilidade de comunicação trazida por esse mesmo avanço tecnológico e a dificuldade de penetrar nas mentes das gerações Y de agora. A apenas alguns dias do derradeiro fim — prolongado às custas da fidelidade das mensagens enviadas pelo exército, alguns bancos e tribunais —, talvez a única maneira de consolar os funcionários desempregados e saudosos seja telegramar uma versão indiana da canção de Zeca Baleiro.
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