Denis Bocquet / Flickr
“Te vi no Tinder”, em uma parede no bairro de Trastevere, em Roma
Funciona quase como uma lista de homens e mulheres. De acordo com faixa etária e distância pré-determinadas, surgem na tela do celular uma sucessão de fotos – o “perfil” da pessoa – que são descartadas ou aprovadas na velocidade de um toque com o dedo para um dos lados. Depois, só resta esperar o “match”, ou seja, que outra pessoa também escolha você e habilite o chat. O aplicativo Tinder, o mais popular na Argentina com 400 mil usuários, marca a nova tendência para conseguir um encontro, na maioria das vezes de sexo casual, e uma mudança de paradigma no que se refere a encontros pela internet: o que antes era ocultado por ser constrangedor, agora é comum e popularizado.
“O Tinder, diferentemente de outras redes sociais, é cool e, de alguma forma, está na moda”, comenta Tomás Balmaceda, especialista em redes sociais. “É gente que mostra a cara, em atividade. Ninguém esconde que está lá, pelo menos os solteiros, e os que se escondem em geral são os que já têm parceiros e os estão enganando. A sexualidade hoje está muito vinculada com práticas tecnológicas; o Tinder tem muito a ver com o ‘curtir’ do Facebook ou o ‘seguir’ no Twitter.” Segundo os criadores do aplicativo, há 5 milhões de “matches” por dia.
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“Vinte anos atrás, havia lugares onde em cada mesa havia um número e se você gostava de alguém, pegava um papelzinho e ligava para a pessoa”, lembra León Roberto Gindin, professor de sexualidade e saúde na Universidade Aberta Interamericana, em Buenos Aires. “Hoje há pessoas que se casaram após se conhecer pela internet. Hoje, se você não conhece alguém no bar e ninguém te apresenta, há este recurso. Eu o uso muito em sexologia. Não creio que isso nos torne mais superficiais, é apenas uma nova forma de comunicação”.
Há números que demonstram que essa mudança de paradigma. Um estudo realizado pela Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos com 19 mil norte-americanos concluiu que um em cada três casamentos realizados entre 2005 e 2012 no país foi entre pessoas que se conheceram pela internet. Outros estudos dão conta de que nos EUA há um total de 54 milhões de solteiros e 41 milhões deles já experimentaram encontros online. Destes, 21 milhões marcaram encontros pelo portal Match.com, que conta com 2,2 milhões de usuários na Argentina. “As pessoas tendem a confundir e colocar tudo no mesmo saco: redes sociais, sites de encontros e aplicativos. São coisas totalmente diferentes”, explica Valeria Shapira, especialistas em relacionamentos do Match.com para a América Latina. “O Match é basicamente um site para encontrar uma esposa ou um marido, no qual quase 80% dos usuários que se registram e pagam pela assinatura dizem estar buscando um relacionamento sério”.
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O australiano Jarrod Allen ficou famoso com suas paródias de fotos de perfil no Tinder
A argentina Maria, de 35 anos, e seus amigos usam o aplicativo. “Minha geração não sai para dançar, já conheço todo mundo no trabalho e não estudo mais, então o aplicativo é uma boa maneira de conhecer pessoas.” Maria conta que conhece diferentes casos: uma amiga que conheceu o namorado pelo Tinder e outra que conheceu um rapaz que em poucos segundos já estava mandando fotos em que estava nu.
Mas o Tinder não é o único aplicativo do tipo. Há o Grindr e o Manhunt, por exemplo, para homens gays. Para Pablo, de 28 anos, o primeiro “geralmente serve para uma noite, e, se der certo, você pode estabelecer um relacionamento ou ficar amigo da pessoa”. Pablo fez uma viagem por várias cidades da Europa e fez sexo em cada uma delas com homens diferentes. “Os aplicativos servem também, por exemplo, para pessoas que não têm experiência no mundo gay e querem conhecer alguém”, comenta.
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Também surgiram outros aplicativos mais controversos, como o Luxy, cujo slogan o vende como um Tinder “sem gente pobre”. O porta-voz do aplicativo inclusive afirmou que “os membros dirigem os melhores carros, hospedam-se nos melhores hotéis, moram em casas maiores… Não é preciso muito tempo para expulsar os que pertencem a outra classe social”. Há também o Good2Go, que se propõe como uma ferramenta mais eficiente para evitar situações incômodas ou de abuso. Lulu, Down e OkCupid são outros exemplos.
A popularidade do Tinder segue crescendo, e o comprova Kirra Cheers, uma fotógrafa de Nova York que realizou um projeto fotográfico registrando os 17 encontros que teve durante dois meses. “No começo, os encontros já eram desconfortáveis, porém somava-se a pressão do projeto, que me deixava ainda mais nervosa”, conta. Ou a fama do australiano Jarrod Allen, de 25 anos, que após uma série de foras no Tinder começou a parodiar fotos do perfil de mulheres no aplicativo. Além disso, muitas celebridades se animaram a experimentar. O apresentador norte-americano Jimmy Fallon abriu uma conta para Britney Spears ao vivo em seu programa, e dizem que as cantoras Lily Allen e Katy Perry também têm uma conta no aplicativo.
“De fato é um fenômeno crescente e que vem desde 2000”, comenta o psicanalista Sergio Rodriguez. “Ouvi sobre casos bons e ruins em meu consultório. Há aqueles que deram certo e que se casaram, e outros casos que deram muito errado, porque nas redes, logicamente, cada um põe sua melhor foto. Quando se encontram, a pessoa é outra, e se isso acontece com a imagem, pode-se imaginar com o conteúdo. A única coisa nova que a tecnologia trouxe para esse tipo de questão é que ela facilita relacionar-se com uma maior quantidade de pessoas e com mais rapidez. O que acontece é que isso gera ilusões mais rápidas. A melhor maneira de lidar é que as pessoas se deem um tempo para se conhecer.”
Tradução: Mari-Jô Zilveti
Matéria original publicada no site argentino Veintitrés.