CNDH pede arquivamento imediato de projeto que define termo 'antissemitismo' em âmbito nacional
Proposta 'serve mais para intimidação dos que não concordam com as violações em Gaza do que para proteger cidadãos judeus', afirma nota
O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) publicou nesta segunda-feira (01/07) uma nota técnica em que manifesta veemente oposição ao Projeto de Lei nº 472/2025, proposto pelo deputado Eduardo Pazuello (PL-RJ) e atualmente em tramitação no Senado Federal.
O texto propõe instituir, em âmbito nacional, a definição de antissemitismo elaborada pela Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA), além de criminalizar a negação ou relativização do Holocausto com base nesse conceito.
De forma categórica, o CNDH afirma que o projeto “contém restrições flagrantemente inconstitucionais ao direito fundamental de liberdade de expressão” e “atenta contra o princípio da taxatividade da lei penal”, cláusula pétrea da Constituição de 1988.
O conselho solicita o arquivamento imediato do projeto, alertando para os riscos jurídicos e políticos envolvidos em sua eventual aprovação.
Segundo o documento, o PL transfere a definição de antissemitismo a uma entidade estrangeira, sem qualquer debate democrático ou científico no país. “Introduz conceitos distorcidos de antissemitismo e, por consequência, de crime de racismo, oriundos exclusivamente de instituição estrangeira”, denuncia a nota.
O CNDH também critica a tentativa de “instrumentalizar o antissemitismo para perseguir e condenar quem se manifesta contrário à política do Estado de Israel”.

CNDH pede arquivamento do projeto de Pazuello que define antissemitismo
Fabio Rodrigues-Pozzebom / Agência Brasil
Projeto
A definição adotada pela IHRA — incorporada pelo projeto — considera o antissemitismo como “uma determinada percepção dos judeus, que se pode exprimir como ódio em relação aos judeus”. Isso inclui manifestações “contra indivíduos judeus e não judeus e/ou contra os seus bens, contra as instituições comunitárias e as instalações religiosas judaicas”.
No entanto, o CNDH afirma que essa formulação tem sido usada internacionalmente para limitar críticas legítimas às ações do governo israelense. “A vedação à exposição de fatos e debates sobre a conduta do Estado de Israel nas relações internacionais e nos conflitos armados em que está envolvido ocorreria por meio de sanções administrativas, cíveis e até mesmo criminais que poderiam ser aplicadas contra cidadãos brasileiros”, alerta o texto.
O Conselho também destaca que “críticas ao Estado de Israel e às ações de Israel no território da Palestina não são antissemitas, mas sim livre exercício de liberdade de pensamento e debate democrático quanto a fatos públicos e notórios”.
A nota reforça que o projeto abre caminho para a criminalização do antissionismo — isto é, a oposição política ao movimento sionista e à ocupação israelense da Palestina — ao confundi-lo intencionalmente com antissemitismo.
“Antissionismo não é antissemitismo, é responsabilidade dos agentes públicos, políticos, educadores e profissionais da mídia diferenciar o ódio ao povo judeu, por sua condição étnico-religiosa, e o direito legítimo de posicionar-se contra o Estado de Israel e seus crimes contra os palestinos – crimes que muitos judeus condenam publicamente e não aceitam que sejam praticados em seu nome.”
Conflito com tratados internacionais
A análise jurídica do CNDH é extensa e detalha como a proposta entra em conflito com a legislação nacional e os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.
A nota menciona a Constituição Federal, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana de Direitos Humanos. E ressalta: “toda e qualquer restrição ao direito de manifestação do pensamento deve estar expressamente prevista em lei e limitar-se à proteção de outros direitos igualmente fundamentais, como a honra ou a segurança nacional — nunca à censura política ou ideológica”.
O conselho argumenta que o projeto representa uma ameaça concreta à sociedade civil organizada e aos setores que denunciam o genocídio em Gaza e as violações aos direitos humanos cometidas por Israel nos territórios palestinos.
“A definição de antissemitismo proposta pela IHRA, além de não ter sido debatida com a sociedade brasileira, já tem sido instrumento para perseguições a estudantes, políticos e intelectuais em países que a adotaram, servindo mais para intimidação dos que não concordam com as violações em Gaza do que para proteger cidadãos judeus”, afirma o texto.
Confira a Nota Técnica CNDH nº 17/2025.
Com Fepal