No programa SUB40 desta quinta-feira (25/03), o fundador de Opera Mundi, Breno Altman, entrevistou a drag queen e youtuber Dimitra Vulcana. Ela falou sobre sua trajetória, pessoal e como militante, e discorreu sobre a situação do marxismo na atualidade.
Falando sobre seu trabalho como youtuber, Vulcana foi categórica: “penso no meu canal como uma sala de aula”. Para ela, falar sobre política montada em drag “potencializa quem eu sou como professora”, tornando-se uma ferramenta para atingir mais pessoas.
Vulcana faz questão de reforçar, no entanto, que não é uma influencer: “minha função é a de formação política. Quando produzo conteúdo, a ideia é chegar nas pessoas, claro, com uma estética bonita, mas com um intuito político, de fazer um despertar da consciência de classe nas pessoas. E o papel do influencer não é o de agitação e propaganda”.
Nesse sentido, Vulcana ressaltou que seu trabalho pretende ir além do universo online. Ela quer fazer com que seus espectadores e ouvintes – pois ela também apresenta o podcast Hora Queer – percebam a necessidade de se organizar e o façam.
“O capitalismo canaliza o nosso tempo de forma a explorar ao máximo nossa força de trabalho de maneira que não sobra tempo nem para o lazer, quanto mais para se organizar. Nem todo o mundo que não está organizado coletivamente está assim porque não quer, é porque não tem tempo”, explicou.
Marxismo e Dimitra
Para ela, seu personagem e a forma como escolhe abordar os temas que debate em seu canal têm repercussão positiva até dentro da sala de aula: disse nunca ter sofrido homofobia nem dos alunos mais conservadores. “Existem pessoas que são homofóbicas, mas que veem uma drag queen ali e param para entender o que está acontecendo e no fim acabam me ouvindo. É uma pane no sistema hétero cisnormativo”, comentou.
“O surgimento do marxismo na minha vida vem junto com a Dimitra, que tem quatro anos de idade”, revelou Vulcana que também é doutora em Ciências da Saúde e ecossocialista. Seu primeiro contato com o marxismo foi por meio das feministas marxistas, “porque até então pensava que era um movimento de homens brancos héteros e cisgênero”.
Hoje, Vulcana é capaz de reconhecer que esse pensamento era resultado do sentimento anticomunista e identitário promovido pelo capitalismo. “Quando a gente coloca que as pautas LGBT são modernas e pessoas que não estão acostumadas com elas são atrasadas, a gente cria um distanciamento entre a classe trabalhadora LGBT e a classe trabalhadora não LGBT”, explicou.
A youtuber já formava parte do movimento LGBT quando entrou em contato com as ideias marxistas e ecossocialistas, por meio do coletivo Subverta, do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), do qual forma parte até hoje.
“O Brasil provoca um sentimento de ódio e angústia todos os dias. Mas esse ódio, quando é semeado de forma positiva e a gente consegue canalizá-lo para a luta de classes, para construir um país melhor, nos leva a nos organizar coletivamente. E, então, mesmo que a gente não veja um mundo melhor, estamos ajudando a trilhar um caminho para as próximas gerações”, afirmou.
‘Marx ainda é pop’
Vulcana acredita que sua forma de militância, nas redes, não apenas YouTube, mas TikTok, Instagram e Twitter, permite que ela contribua para o despertar revolucionário da juventude. “Marx não deixou de ser pop e podemos despertar esse sentimento na juventude, gerar um levante, se utilizarmos uma estética diferente”, ponderou.
Outra forma de fazê-lo seria abordar temas da cultura pop. Em seus vídeos, a drag queen fala sobre reality shows, games e quadrinhos, por exemplo.
“A indústria de games move muito dinheiro e explora muita gente. É machista, LGBTfóbica, cria uma subjetividade reacionária nas pessoas. A gente vê vídeos de homens que saem jogando Call of Duty atirando para todos os lados e destilando preconceito pelo microfone. Então ter uma drag queen jogando ao vivo e falando de Marx cria novas subjetividades que não são reacionárias”, argumentou.
‘A reabilitação de Lula foi uma dose de energia’
Discorrendo sobre a situação do Brasil, Vulcana celebrou a restituição dos direitos políticos de Lula: “senti uma dose de energia”. No entanto, confessou estar receosa de uma possível escalada de autoritarismo no país.
“Precisamos ver o movimento que a burguesia está sinalizando. Eu estava lendo O 18 de Brumário de Bonaparte e a situação é muito parecida. A burguesia favoreceu a inserção de Luis Bonaparte, mas, quando não o queria mais ali, já não tinha mais volta. Será que na hora que a burguesia não quiser mais Bolsonaro, com todo o aparelhamento que estamos vendo das Forças Armadas, chegaremos num ponto de não ter mais volta?”, questionou.