No programa SUB40 desta quinta-feira (18/11), o jornalista Breno Altman entrevistou Bia Caminha, vereadora petista em Belém do Pará, a mais jovem da cidade, sobre a necessidade de renovação, geracional e de agendas, do partido.
Um dos temas cuja agenda precisa ser repensada na opinião da vereadora, que também é vice-presidente estadual do PT Pará, diz respeito à Amazônia: “Nós somos reflexo de um desenvolvimento que nunca chegou, de uma agenda do centro-sul que foi imposta, que devastou tudo. O próprio PT aprovou projetos que nos atacaram, como Belo Monte. A Amazônia não é um lugar de exploração, é um lugar onde tem gente e nós somos sujeitos da história também”.
Ela reforçou que existe um olhar colonizador branco sobre a Amazônia e que, mesmo quando há tentativas de ajudar a zona ou pensar projetos mais adequados, eles são idealizados por pessoas, em geral brancas, que não vêm dali.
“Agora nós temos tanta gente, negra, indígena, quilombola, que vem pensando a Amazônia a partir de outra lógica…nós não invalidamos o conhecimento que vem de fora da região, mas queremos estar nos espaços de discussão de políticas”, enfatizou.
Por isso, num eventual novo governo Lula, Caminha espera que haja um tensionamento, justamente porque o Fórum Amazônia, iniciativa do PT para pensar políticas públicas para o local, “é um espaço só de gente branca que está construindo uma agenda para a Amazônia de 1990, muito retrógrada”.
De forma mais geral, a vereadora defendeu a importância de uma renovação geracional do partido para pensar em projetos mais atuais que atendam as necessidades reais da população. Ela deu como exemplo sua própria campanha.
Caminha revelou que sua candidatura não contou inicialmente com o apoio do PT. Ela não recebeu muitos recursos do fundo partidário e foi contra a diretriz de que as campanhas de candidatos petistas deveria se estruturar em torno do legado da legenda.
“A gente entendia que tinha que superar essa história do legado do PT, mas os candidatos eram mais velhos, então giravam em torno disso. E não é que a gente não reconheça a importância desse legado, pelo contrário, somos filhos dele, mas precisamos ter perspectiva. Com pessoas passando fome, a juventude sem perspectivas de futuro, de acessar a universidade, de ter emprego, não adianta só ficar lembrando o que Lula fez”, argumentou.
Graças à pressão de grupos de juventude, a vereadora afirmou que essa renovação vem ocorrendo, ainda que lentamente e enfrentando resistência. Ela disse, por exemplo, que não querem que ela seja candidata a deputada estadual nas eleições de 2022 porque tem chances de se eleger “e tirar um dos ‘nossos’ como me disseram, como se eu não fosse um dos nossos”, preferindo que ela se candidate a deputada federal, pois teria menos chances de ser eleita. “Mas, sinal da mudança, é que hoje a maioria apoia que eu me candidate a deputada estadual, e tendo construído um processo em cima disso”, complementou.
Apesar das dificuldades, Caminha, que começou sua vida militante logo no primeiro ano do curso de arquitetura da Universidade Federal do Pará, disse que não faria parte da política se não fosse através do PT.
“Cheguei a frequentar espaços do PSOL, que é muito forte em Belém, mas não me identifiquei. Sempre acreditei no PT enquanto projeto, minha vida foi atravessada pelo governo do PT, entrei na universidade pública graças ao partido. Tinha a convicção de aquele era o projeto que eu queria construir e até hoje não faz sentido para mim participar de outro projeto”, refletiu.
Política institucional versus militância
Caminha, que é abertamente bissexual e vem do movimento feminista negro, contou que sofreu muito preconceito e homofobia durante sua campanha, mas que a recepção que recebeu foi muito positiva depois de eleita.
Reprodução/Twitter
Vereadora Bia Caminha foi a entrevistada desta quinta-feira (18/11) do SUB40
Nas redes sociais, aumentou muito seu número de seguidores. Nas ruas, ela relatou que muitas pessoas se aproximam para conversar com ela. Na Câmara, diz, “sou combativa quando preciso, mas sou tranquila de lidar. Meus companheiros pensavam que eu ia só cancelar todo o mundo o tempo todo, mas tenho um trato tranquilo com os vereadores”.
Atualmente, ela desenvolve dois grandes projetos na Câmara. Um diz respeito à dignidade menstrual e o outro à crise climática: “Belém é a cidade com o menor índice de saneamento básico do Brasil e foi construída em uma região de alagamento. Então, sem um sistema de drenagem urbano e esgoto, a cidade vai afundar ainda mais, vai haver mais alagamentos por conta da crise climática e eles vão destruir bairros inteiros, principalmente bairros onde vive a população mais pobre, majoritariamente negra. Precisamos de mais instrumentos públicos de combate a esse processo, fazendo uma rede de drenagem urbana, por exemplo”.
Mas já venceu outras batalhas, como a de barrar a construção de hipermercados na orla de Belém, em zonas que haviam sido desalojadas para sua revitalização e que, uma vez revitalizadas, em vez de reincorporar os antigos moradores, seria vendida para grandes esses hipermercados, chamados de “atacadões”.
Levando em conta tudo o que tem feito, Caminha, que começou a participar de mobilizações em 2016 e se filiou ao PT em 2017, fez um balanço sobre estar na política institucional.
“Gosto de estar na política institucional porque muitas vezes sou a única mulher negra, jovem, então gosto de estar nesses espaços porque a representatividade é importante. Mas sempre fui muito militante e hoje não posso fazer quase nada, não posso ficar me expondo nas redes e às vezes é muito difícil isso. Sem falar que às vezes eu nem tenho tempo. Mas o nosso mandato é muito voltado para a militância”, concluiu.