A presidenta do México Claudia Sheinbaum apresentou quinta-feira (23/01) um projeto para introduzir na Constituição do país a proibição do cultivo de milho transgênico e declarar o milho nativo patrimônio da identidade nacional.
O objetivo é conservar e proteger o milho nativo do país que apresenta a maior diversidade genética desse produto no mundo. São mais de 59 tipos diferentes só entre os cultivados comercialmente, sem contar os silvestres.
“A diversidade de milhos nativos e seus parentes silvestres no México representa um acervo genético incalculável e insubstituível, fundamental para a agricultura e a segurança alimentar mundial. É responsabilidade do Estado resguardar essa diversidade para as gerações futuras”, destacou a presidenta na declaração de motivos do projeto.
Segundo especialistas, a variabilidade genética é elemento chave para que um cultivo se adapte a mudanças no meio ambiente, como as decorrentes do aquecimento global.
O milho é considerado um dos alimentos mais utilizados pelos mexicanos, que consomem em média 328 gramas do produto por dia, o que corresponde a 39% das suas necessidades diárias de proteínas, 45% das calorias e 49% do cálcio.
Incorporar os agricultores ao desenvolvimento nacional
O projeto encaminhado à Câmara dos deputados propõe incluir no artigo 4 da Constituição que “o milho é elemento de identidade nacional, cujo cultivo deve ser livre de transgênicos, priorizando seu manejo agroecológico”.
Também propõe que o artigo 27 estabeleça como responsabilidade do Estado “fornecer as condições para o desenvolvimento rural integral, garantindo que os agricultores se incorporem ao desenvolvimento nacional”. Estabelece também que o Estado fomentará a atividade agropecuária e florestal para o uso ótimo dos recursos da terra “livre de cultivos e sementes para cultivo de milho transgênico”.

O México é o país com mais diversidade de espécies de milho
A variedade de tipos de milho do México é resultado da diversidade de ambientes naturais aos quais o produto se adaptou e foi adaptado por dezenas de povos originários da região. Há indícios de que o produto é cultivado no país há quase 8 mil anos. Atualmente, mais de 80 povos originários e famílias camponesas o cultivam com técnicas de manejo próprias.
“A semeadura das próprias sementes e a experimentação de novos materiais obtidos por através das trocas entre esses grupos mantêm vivos os processos de evolução e diversificação da cultura”, destaca o projeto.
Proteção do milho nativo irritou os Estados Unidos
A opção pelo caminho constitucional para proibir o milho transgênico decorre das anteriores tentativas de fazê-lo por lei. O ex-presidente Andrés Manuel López Obrador apresentou decretos, em 2020 e em 2023, com o mesmo objetivo de proteger a biodiversidade de milhos nativos.
A modificação genética feita no milho o torna resistente ao glifosato, agrotóxico que mata todas as outras plantas do entorno e que é considerado por muitos estudiosos como cancerígeno. Os projetos de lei de Obrador centravam seus argumentos nos danos que esse produtos faz à saúde humana e ao meio ambiente.
A iniciativa gerou tensão com os Estados Unidos, devido aos efeitos que essa proibição poderia causar às suas exportações. Durante o governo de Joe Biden (2021-2025), o país vizinho argumentou que a medida buscada pelo México violaria o Acordo Comercial entre México, Estados Unidos e Canadá (o T-MEC).
O parecer final entregue por três especialistas do T-MEC em dezembro de 2024, impugnou os aspectos dos decretos mexicanos que restringiam o milho transgênico e o uso do glifosato, com o argumento de que era de que a proibição não se baseava em evidências científicas.
O governo do México alegou que não concordava com a medida, pois suas políticas estariam “perfeitamente alinhadas com os princípios de proteção à saúde pública e dos direitos dos povos indígenas”. Porém, acabou acatando a determinação do T-MEC.
Banco de sementes para preservar variedades
De acordo com a proposta de emenda constitucional apresentada por Sheinbau, existem diversas disposições no marco regulatório mexicano e internacional que permitem proteger as espécies nativas.
Na quarta-feira (23/01), a prefeita da Cidade do México, Clara Brugada assinou um decreto que implementa a mesma proibição na capital do país. Ela também anunciou que criará de bancos de germoplasma (sementes) de milho nativo para garantir que nenhuma de suas variedades se extinga.