Após as eleições para o parlamento catalão em que a aliança entre partidos e movimentos à esquerda e à direita do espectro político (notadamente os esquerdistas do ERC e os direitistas do CDC) chamada Junst Pel Si (JxS, Juntos pelo Sim) chegou perto da maioria para poder manter o líder da coalizão Artur Mas no comando do governo regional, novas eleições podem ser convocadas para os próximos meses.
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Artur Mas, do bloco independentista Junts pel Sí, tenta se manter no cargo de presidente da Generalitat, o governo catalão
Para governar, o JxS precisava dos votos da coalizão de esquerda nacionalista CUP (Candidaturas de Unidade Popular) que, em votação pouco antes da virada do ano, viveu uma situação insólita, em que 1515 pessoas presentes à sua assembleia aberta votaram por apoiar o JxS e Mas, e 1515 pessoas votaram contra. Diante do empate, o conselho político do partido decidiu, na tarde de 2 de janeiro, não apoiar o nome de Artur Mas e pedir pela indicação de outro político da coalizão, tendo preferência por Oriol Junqueras (que lidera o partido ERC) ou por Raül Romeva, um independente que foi eurodeputado pela Iniciativa Comunista-Verdes, que também faz parte da coalizão JxS.
Artur Mas se recusa a ceder e afirma ser o único candidato de sua coalizão e tal insistência poderá levar a Catalunha à novas eleições. Os soberanistas catalães tem até o dia 10 de janeiro para montar um governo e a única possibilidade que resta é a de um nome alternativo de consenso ser apresentado.
O debate sobre o novo governo tem girado em torno do nome de Artur Mas desde o primeiro dia após as eleições em que ficou claro que a coalizão JxS não seria capaz, sozinha, de governar. Os resultados combinados das formações nacionalistas (JxS e CUP) seriam suficientes para formar um governo estável, pese o total de votos soberanistas não ter chegado aos 50%, mas ser suficiente para assegurar a maioria absoluta no Parlamento. A intenção dos vencedores era clara: acelerar o processo rumo à independência preparando uma rota segura para a desconexão com a Espanha que, aliás, já vinha em curso com a recusa de altos cargos catalães a acatar decisões dos tribunais espanhóis em relação às decisões políticas tomadas.
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A CUP, coalizão pró-indepedência, não chegou a um consenso com o Junts pel Sí para a formação do governo catalão
Artur Mas é o atual presidente da Generalitat, o governo catalão, e um político visto com imensa desconfiança pelas CUP por suas políticas neoliberais e repressivas contra movimentos sociais, Ele tentou negociar bases para um acordo, revendo decisões suas e tentando agradar aos movimentos sociais incluindo propostas das CUP em seu programa de governo, mas todas as suas tentativas de acordo fracassaram.
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O temor das forças soberanistas neste momento é de que novas eleições possam enfraquecer suas fileiras ou mesmo inviabilizar o processo soberanista. Nas eleições espanholas de dezembro, o CDC – partido de Mas – viu seu número de votos recuar, ao passo que seus sócios do ERC cresceram. As CUP não participaram de eleições espanholas. A grande surpresa foi a votação do Podemos local, comandado por Ada Colau, prefeita de Barcelona, que apoia o direito de decidir dos catalães, mas não apoia a independência em si e que dificilmente comporia um governo com a participação da CDC/Mas ou que tivesse a independência como objetivo último.
Diante do crescimento do Podemos nas eleições espanholas recai a dúvida se em novas eleições catalãs o partido cresceria, inviabilizando qualquer possibilidade de governo puro-sangue soberanista e forçando a novas negociações que fariam o processo recuar em anos. Alguns analistas apontam que a insistência da CDC no nome de Artur Mas possa ser um subterfúgio para frear o processo independentista ao mesmo tempo em que colocam a culpa nas CUP pelo fracasso do processo. A CDC sempre foi mais autonomista e apenas em anos recentes adotou posição mais clara na direção da independência – mais especificamente após o Tribunal Constitucional ter invalidado o Estatut, ou a constituição que rege a Catalunha -, mas as suspeitas de que o comprometimento real com esta rota pela independência são cada vez mais fortes. Ao insistir no nome de Mas a CDC repassa às CUP o ônus pelo fracasso na formação do governo e pode manter sua atitude potencialmente falsa de combatividade frente ao governo espanhol com todos os ganhos políticos inerentes a tal posição.
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O Podemos se recusou a fazer parte do governo de Mariano Rajoy; na foto, o secretário-geral do partido, Pablo Iglesias
O apoio do partido de esquerda ERC, no entanto, ao nome de Mas segue uma incógnita. Já as CUP demonstram ser capazes de ir até as últimas consequências sme desviar de seu projeto de construção social e popular baseado em amplas consultas com sua base e de respeito às suas decisões, um partido que antes do Podemos já demonstrava a força dos coletivos e indivíduos organizados.
Restam poucos dias para que últimas negociações sejam feitas e que a coalizão JxS recue ou não, dado que as CUP tomaram sua decisão final. Caso haja novas eleições o cenário, no momento, é de dúvida quanto ao futuro do processo de independência da Catalunha e da própria Espanha. Ada Colau é cotada para suceder Pablo Iglesias, líder do Podemos, em algum momento, mesmo para governar a Espanha caso nem PP e nem PSOE sejam capazes de formar um governo – também na Espanha a formação de um governo estável se mostra complicada – e a questão catalã se coloca diante como um potencial problema.
A questão catalã, aliás, é um dos grandes empecilhos para a formação de um novo governo espanhol, dado que o PSOE se recusa sequer a pensar em um processo pela independência da Catalunha, ao passo que o Podemos se recusa a formar um governo com o PSOE caso este não aceite o direito de decidir dos catalães. A jogada do Podemos é inteligente, pois ao mesmo tempo em que se mantém fiel a seus discursos e bases, atrai a simpatia de movimentos e indivíduos soberanistas catalães podendo ser o fiel da balança nas próximas eleições regionais.
O panorama político espanhol mostra-se confuso, tanto quanto o catalão. E ambos estão intimamente ligados e o futuro de um poderá depender do outro ou definir o outro. Os próximos dias e semanas serão cruciais.