Um grupo de associações publicou nesta segunda-feira (03/06) um relatório no qual denunciam as remoções de sem-teto das ruas de Paris. O documento aponta que mais de 12 mil pessoas foram afastadas da capital e afirma que esse movimento tem se acelerado com a proximidade da abertura dos Jogos Olímpicos de Paris. As entidades criticam o que consideram uma “estratégia de limpeza social” antes do evento.
O relatório é divulgado pelo grupo Le revers de la médaille (O outro lado da medalha, em tradução livre), um coletivo que reúne 80 associações caritativas. O estudo contabilizou 138 operações que desalojaram 12.545 sem-teto das ruas de Paris e seus arredores, em um ano.
Segundo Paul Alauzy, coordenador de vigilância sanitária da ONG Médicos do Mundo e porta-voz do coletivo, os dados apontam para um aumento de 40% das remoções em relação ao ano anterior. A maior parte dessas pessoas são migrantes e, entre elas, “o número de menores triplicou”, alertou Alauzy em entrevista à RFI.
O porta-voz afirma que esse fenômeno de expulsões em massa se acelerou com a aproximação da Olimpíada. “No momento exato em que faltavam 100 dias para os Jogos, o maior acampamento da França foi desmantelado, com a remoção de 450 pessoas”, conta. Na semana passada, cerca de cem jovens migrantes também foram retirados pela polícia francesa de um acampamento às margens do rio Sena.
O coletivo denuncia a maneira como essas operações são realizadas, com o envio de policiais para desmontar as barracas usadas pelos migrantes e desabrigados ou simplesmente para afastar os sem-teto dos bairros mais turísticos. “Ao invés de enviar a polícia, essas pessoas deveriam ser acompanhadas por assistentes sociais”, propõe Alauzy.
Mas a principal reclamação do coletivo diz respeito à falta de opções dadas a essas pessoas afetadas pela precariedade, que são deslocadas para cidades isoladas no interior do país, onde geralmente podem ficar apenas três semanas. Passado esse período e sem solução de moradia perene, muitos voltam para as calçadas da capital.
“Há pessoas nas ruas e sabemos que os espaços públicos serão muito mais ocupados durante os Jogos Olímpicos”, admite Alauzy, em alusão aos 15 milhões de visitantes esperados. “Temos que propor a essas pessoas que estão nas ruas soluções dignas e perenes de alojamento”, conclui, afirmando que “seria necessária a criação de 20 mil vagas para abrigar os sem-teto, das quais 7.000 na região parisiense”.
Prostitutas e dependentes de drogas também são visados
O coletivo também denuncia a perseguição de trabalhadores do sexo que atuam em parques nos arredores de Paris. Paul Alauzy relata a situação de mulheres africanas pressionadas pela polícia no bosque de Vincennes, na zona leste da capital, que são obrigadas a correr para se esconder entre os arbustos para evitar os controles de documentos. “Elas são vistas como migrantes [ilegais] antes de serem vistas como vítimas”, aponta o porta-voz do coletivo.
Além disso, o relatório revela o aumento de operações para dispersar pessoas dependentes de drogas que consomem entorpecentes nas estações de metrô. Segundo as associações, há uma vontade deliberada das autoridades de “tornar a pobreza invisível”.
Esta não é a primeira vez que operações desse tipo são denunciadas às vésperas de Jogos Olímpicos, seja com a remoção de sem-teto ou de populações instaladas de forma considerada indevida nos arredores de locais que acolhem grandes eventos esportivos. Em 2013, a Anistia Internacional alertou em um relatório sobre os direitos humanos no mundo a situação de milhares de pessoas vítimas de remoção forçada por causa dos preparativos da Copa do Mundo de 2014 no Brasil e dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro.