O 4º aniversario do golpe de Estado que derrubou Manuel Zelaya acontece nas vésperas do pleito que escolherá o próximo presidente de Honduras. No próximo dia 24 de novembro, 3,5 milhões de hondurenhos irão às urnas para eleger, além do sucessor de Porfirio Lobo, 128 deputados e os prefeitos dos 298 municípios do país.
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A profunda crise político-econômica e social derivada do golpe sacudiu e dividiu a sociedade e as famílias hondurenhas. Juan Barahona, atual subcoordenador da FNRP (Frente Nacional de Resistência Popular) e candidato à vice-presidência da República pelo partido Libre (Liberdade e Refundação), assegura a Opera Mundi que na manhã daquele 28 de junho de 2009 o povo tomou as ruas de maneira espontânea para lutar contra a quebra da ordem constitucional do país.
De acordo com o também secretário-geral do Libre e histórico dirigente sindical, ninguém esperava que o FNRP pudesse se organizar e crescer tanto a nível nacional, dando vida, apenas três anos depois, a um partido cuja candidata, Xiomara Castro, encabeça todas as pesquisas de preferência de voto.
Leia os principais trechos da entrevista:
Opera Mundi: Faltam cinco meses para as eleições nacionais. Como o partido Libre está se preparando?
Juan Barahona: Somos um partido novo, que tem pouco mais de um ano de vida, e já contamos com estruturas em todos os municípios e estados do país. Fomos capazes de ir a eleições primárias para eleger nossos candidatos em vista das eleições nacionais de novembro.
Giorgio Trucchi/Opera Mundi
Barahona faz parte da candidatura favorita à eleição presidencial hondurenha, liderada por Xiomara Castro
Estamos crescendo e nossa candidata de consenso, Xiomara Castro, está encabeçando todas as últimas pesquisas. Isso nos indica que temos o apoio e o amparo da maioria do povo, porque soubemos interpretar suas aspirações de mudança e apresentar propostas concretas.
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OM: Quais são os elementos mais característicos da proposta política do Libre?
JB: Sem dúvida a proposta de estimular e governar com um modelo diferente do neoliberal, que historicamente concentra riqueza e reproduz a pobreza. Além disso, durante seu discurso na Assembleia Nacional do Libre, no dia 16 de junho, Xiomara Castro disse que quer promover um socialismo democrático, isto é, avançar para uma mudança do modelo capitalista.
São propostas que o povo está apoiando firmemente, não porque somos um partido novo, mas porque temos propostas concretas para mudar a situação econômica, política, social e cultural do nosso país. Libre é uma esperança para o povo e uma maior responsabilidade para aqueles de nós que cheguem a ocupar cargos no governo e na condução do partido através da eleição popular.
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OM: Como vão mudar um modelo que está feito para manter o status quo e para que tudo permaneça igual?
JB: Não é possível se não convocamos uma Assembleia Nacional Constituinte e não aprovamos uma nova Constituição Política. Tudo está legislado para garantir e legalizar os interesses dos oligarcas que têm mantido o controle do país, então é necessário um processo de refundação que rompa com esse estado de concentração de poder e de recursos.
OM: Neste caso não seria suficiente ganhar a Presidência, é preciso também ter a maioria no Congresso.
JB: Estamos trabalhando para ter força significativa no Congresso e controlar um número importante de prefeituras. Somente desta maneira poderemos gerar mudanças nas instituições e poderes do Estado, e na sociedade em geral.
OM: Sua trajetória pessoal está marcada por uma grande história de luta sindical ao lado dos trabalhadores. Qual é a proposta do Libre no âmbito trabalhista?
JB: O Libre prometeu respeitar as conquistas dos trabalhadores, que estão refletidas na legislação trabalhista nacional e nos convênios internacionais ratificados por Honduras, tais como o direito de organização sindical e de negociação coletiva. Também prometeu revogar a Lei do Emprego Temporal, que cerceia muitas conquistas obtidas em mais de 50 anos de luta.
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OM: Já se passaram quatro anos do golpe de Estado. Nestes dias tão difíceis, quais eram as expectativas e qual parte delas se tornou realidade?
JB: Naquele momento estávamos nas ruas, desafiando o estado de sítio e a suspensão dos direitos constitucionais, lutando para reverter o golpe e restituir o presidente Manuel Zelaya.
Mesmo assim não deixamos nem um dia de sair às ruas em todo o país. Foi um desafio a todas as medidas repressivas dos golpistas, sem pensar que íamos chegar a uma situação de força como a que temos agora. O FNRP está organizado em todo o país e abriu caminho para a organização de uma força política que está disputando o poder com o bipartidarismo, que governou o país por mais de cem anos.
OM: Já há sinais preocupantes quanto ao aumento da violência contra os membros do FNRP e do Libre. Teme que a situação possa piorar à medida que as eleições se aproximam?
JB: Desde o dia do golpe de Estado estamos sob uma repressão selvagem, uma violação sistemática dos direitos humanos e muitos companheiros e companheiras têm sido perseguidos, presos e até assassinados de maneira seletiva.
Um dia antes da celebração da nossa Assembleia Nacional assassinaram Marvin José Rivera, um jovem militante do partido Libre, que saía do lugar onde foi montada a estrutura para a atividade. No dia 24 deste mês o jornalista Aníbal Barrow foi sequestrado. Ele estava comprometido com a resistência e até agora não se sabe nada dele.
Acreditamos que, à medida que se aproximem as eleições, vamos enfrentar um aumento da repressão, porque os golpistas querem meter medo e gerar terror para que o povo retroceda e deixe de apoiar nosso partido.
Prova disso é o fato de o principal assessor do candidato oficialista, o atual presidente do Congresso, Juan Orlando Hernández, é J.J. Rendón, o mesmo que assessorou o candidato da direita venezuelana, Henrique Capriles, e enfocou sua campanha no confronto, na violência e no terror.
OM: Estão preparados para defender o voto nas urnas?
JB: Não estamos apenas preparados para defender o voto nas urnas, mas também nas ruas se tentarem roubar nosso triunfo. Também estamos nos preparando permanentemente para conservar nossas vidas, porque estamos neste projeto político para mudar a situação do nosso país, não para morrer.
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OM: Quais são seus planos no caso de ser eleito como designado presidencial (uma espécie de vice-presidente) no próximo dia 24 de novembro?
JB: Atualmente sou secretário-geral do Libre e na fórmula presidencial de Xiomara Castro serei o primeiro designado presidencial. Eu venho dos setores sociais e populares e vou representá-los na ocasião de um futuro governo. Minha responsabilidade será seguir do lado destes setores, que historicamente foram abandonados e excluídos, escutando suas necessidades e demandas, e dando respostas concretas do governo.