Pesquisa recente comprova o que alguns “pessimistas” vêm dizendo há tempos: a situação política está longe, muito longe, de estar favorável para a esquerda.
Depois de 14 meses de governo, com várias notícias boas para contar, não houve uma alteração significativa a nosso favor.
Pior ainda: confirmando a máxima quase universal segundo a qual aquilo que não sobe, desce, uma pesquisa recente aponta uma queda na avaliação do governo Lula.
A aprovação do governo caiu de 54% em dezembro de 2023, para 51% em fevereiro de 2024.
E a desaprovação subiu de 43% para 46% no mesmo período.
Até aí, previsível, exceto para os puxa-sacos e chapas-brancas de plantão.
Por óbvio, é preciso tomar medidas.
E medidas exigem diagnóstico das causas.
Causas, no plural, pois trata-se de um combo.
Não existe uma única causa.
Mas, como não podia deixar de ser, tem gente que achou um culpado.
Seria Lula.
Mais precisamente, seria a declaração de Lula comparando o ataque de Israel contra Gaza com a postura de Hitler quando resolveu matar os judeus.
A esse respeito, aliás, a tal pesquisa fez uma pergunta do tipo faça-o-favor-de-responder-aquilo-que-o-entrevistador-quer-ouvir.
A pergunta foi a seguinte: “Lula exagerou ao comparar o que acontece em Gaza ao que Hitler fez na Segunda Guerra?”
Como é óbvio, o resultado foi “exagerou”, com 60%.
Com base nisso, começaram as “teorias”.
Ouvi pelo menos três.
Uma é direta e reta: põe a culpa no apoio de Lula à causa e a vida palestina.
A outra é sofisticada e inclui várias mediações.
Sintetizo assim, por minha conta e risco: as declarações firmes do presidente Lula contra o genocídio, acompanhadas de uma campanha midiática atacando a “comparação” que ele fez entre o ataque de Israel contra Gaza e Hitler, teriam provocado uma queda na popularidade do governo, especialmente entre evangélicos, mais suscetíveis a uma lavagem cerebral ideológica.
A terceira é a culpada-mas-otimista: a pesquisa em tela não teria captado a mudança na opinião pública, posterior ao crime cometido por Israel contra refugiados que estavam junto a um comboio humanitário.
Como a comprovação desta terceira versão depende de nova pesquisa, vejamos se os dados da pesquisa recente confirmam as duas primeiras versões.
Fato: 60% dos brasileiros consideram que teria havido exagero na comparação.
Fato: 69% dos evangélicos rejeitam a comparação.
Porém, tem vários detalhes.
Um deles é o seguinte: a queda na popularidade do governo vem de antes da tal declaração de Lula.
Aliás, a queda já fora detectada em pesquisas anteriores.
Tudo indica que teria acontecido nova queda, com ou sem declaração.
Acontece, também, que a queda detectada atinge parte da base social do governo (estamos caindo entre jovens, entre mulheres, entre apoiadores de Lula).
Por quais motivos isto estaria acontecendo?
Como já foi dito, há um combo de motivos.
Vejam os citados aqui: Em nova pesquisa, sinal de alerta para Lula – Outras Palavras
Reproduzo dois parágrafos do texto supracitado:
“Um dos temas da pesquisa é especialmente útil para identificar a queda de satisfação da sociedade: a Economia. Agora, 38% acham que ela “piorou” nos últimos 12 meses, contra apenas 26% que julgam ter “melhorado”. É uma diferença de 14 pontos.”
“Há uma percepção esmagadora de que os preços dos alimentos aumentaram (73% x 13%) e de que o mesmo ocorreu com as contas de consumo, que se referem em geral a serviços privatizados, mas administrados pelo governo (63% x 7%). Isso pode ajudar a explicar a queda da avaliação entre as mulheres.”
Afirmação semelhante pode ser lida aqui:
14/ É a primeira vez que cai a avaliação positiva da economia entre eleitores do Lula. Saiu de 55% para 46% os lulistas que achavam que a economia melhorou, enquanto passou de 11% para 15% os lulistas que achavam que a economia piorou. pic.twitter.com/cVe8y5gTTD
— Felipe Nunes (@profFelipeNunes) March 6, 2024
Em resumo, o conjunto da obra não está causando o efeito político necessário, especialmente num ano de eleição, especialmente num contexto em que a extrema-direita está na ofensiva.
E o problema central está na política econômica, mais precisamente nos seus efeitos sobre a economia popular.
Dizer que “a culpa é da Palestina” – ou, para ser mais preciso, dizer que a queda acontece quando polarizamos no debate político ideológico – só faz sentido para quem defende Israel, a Faria Lima e o “austericídio”.
Dizer que “a culpa é da Palestina”, entretanto, não encontra amparo nos dados e não ajuda a resolver o problema.
O tal problema só será resolvido quando acontecer uma inflexão na política da esquerda em geral e do governo em particular.
E é melhor fazer isto já, em tempo de beneficiar nosso desempenho nas eleições de 2024.
ps. matar 30 mil pessoas não é “exagero”, é crime de guerra, é genocídio.
ps. comparar com Hitler não é “exagero”, é boa história e boa política.