Uma ONG denunciou nesta quarta-feira (17/04) que produtos da empresa alimentícia suíça Nestlé destinados a bebês em países da Ásia, África e América Latina contém açúcar adicionado e acusou a multinacional de adotar um duplo padrão.
Na Suíça, onde a empresa está sediada, as principais marcas de cereais infantis e leites em pó vendidas por ela não contém açúcar adicionado. Também na Alemanha, na França e no Reino Unido – os principais mercados da Nestlé em solo europeu – todos os leites de crescimento para crianças de 1 a 3 anos vendidos pela Nestlé não contêm açúcar adicionado. E se determinados cereais destinados a crianças com mais de 1 ano o contiverem, os destinados a bebês a partir dos 6 meses estão isentos, afirmou a ONG.
Mucilon e Ninho
Os dois produtos analisados são o cereal infantil Cerelac (No Brasil vendido como Mucilon) e o leite em pó Nido (Ninho, no Brasil).
Ativistas da organização investigativa suíça Public Eye enviaram amostras desses alimentos vendidos na Ásia, África e América Latina a um laboratório belga para exames.
Os testes em produtos da linha Mucilon vendidos no Brasil mostraram que seis de oito produtos têm adição de açúcar, com três gramas por porção em média. Os outros dois não tinham adição de açúcar. Segundo a ONG, o Brasil é o segundo maior mercado dessa linha de produtos.
A ONG afirmou ter examinado 115 produtos do Cerelac vendidos nos principais mercados da Nestlé na África, na Ásia e na América Latina e que 108 deles contêm adição de açúcar.
No caso do Nido (Ninho), a Nestlé afirma não adicionar açúcar aos produtos dessa linha no Brasil por preocupação com a saúde e nutrição das crianças. A ONG afirmou ter examinado 29 produtos Nido comercializados pela Nestlé em alguns dos principais mercados de países de baixo e médio rendimento, e em 21 deles há adição de açúcar.
Açúcar vicia
“O ideal é evitar consumir esses ingredientes [açúcar] na infância, pois o sabor doce pode influenciar a preferência da criança por esse tipo de alimento no futuro”, alerta a própria empresa no site da marca no Brasil, que é o segundo maior mercado para o Ninho, segundo a ONG suíça.
Citado pela ONG, o epidemiologista Rodrigo Vianna, professor do departamento de nutrição da Universidade Federal da Paraíba, no Brasil, disse que a adição de açúcar “é extremamente preocupante”.
“O açúcar não deve ser adicionado a alimentos destinados a bebês e crianças pequenas porque é desnecessário e altamente viciante. As crianças procurarão cada vez mais alimentos açucarados, iniciando um ciclo negativo que aumenta o risco de distúrbios alimentares na idade adulta, como a obesidade, bem como outras doenças crônicas como a diabetes ou hipertensão”, disse.
Nos principais mercados europeus da Nestlé, incluindo o Reino Unido, não há adição de açúcar nas fórmulas para crianças pequenas. Embora alguns cereais destinados a crianças mais velhas contenham açúcar adicionado, não há nenhuma adição em produtos destinados a bebês entre 6 meses e 1 ano, segundo a análise da ONG.
Citado pelo jornal britânico The Guardian, o médio Nigel Rollins, da Organização Mundial da Saúde (OMS), disse que as descobertas representam “um padrão duplo que não pode ser justificado”.
A especialista em agricultura e nutrição Laurent Gaberell, da Public Eye, disse que “a Nestlé deve pôr um fim a esses perigosos padrões duplos e parar de adicionar açúcar em todos os produtos para crianças com menos de 3 anos de idade em todas as partes do mundo.”
Resposta da Nestlé
Em declarações ao Guardian, a Nestlé afirmou que acredita na qualidade nutricional de seus produtos para a primeira infância. “Priorizamos o uso de ingredientes de alta qualidade adaptados ao crescimento e desenvolvimento das crianças”, acrescentou.
Ela disse ao jornal britânico que dentro da categoria “altamente regulamentada” de alimentos para bebês, a Nestlé sempre cumpriu “as regulamentações locais ou padrões internacionais, incluindo requisitos de rotulagem e limites de conteúdo de carboidratos que englobam açúcares” e declarou o total de açúcares em seus produtos, incluindo aqueles provenientes do mel.
Segundo a Nestlé, variações nas receitas dependem de fatores como regulamentação e disponibilidade de ingredientes locais.
A empresa reduziu a quantidade total de açúcares adicionados em seu portfólio de cereais infantis em 11% em todo o mundo na última década e continuou a reformular os produtos para reduzi-los ainda mais. A sacarose e o xarope de glicose estão sendo eliminados dos leites de crescimento destinados a crianças pequenas em todo o mundo, acrescentou.