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Christian Dunker explica como a crise política produz mal-estar e sofrimento
Mal-estar diz respeito à suspensão do futuro, ou seja, uma incerteza sobre o que irá acontecer. Essa definição é muito importante na produção e no tratamento do sofrimento. A indagação a ser feita é: qual é a projeção do futuro sobre aquilo que me faz sofrer agora?
Qual a relação de mal-estar e sofrimento com a crise política que vivemos atualmente no Brasil? Essa é questão que Christian Dunker, psicanalista e professor de Psicologia da USP, responde na Aula Pública Opera Mundi.
“Tivemos momentos em que boa parte da população experimentou uma espécie de suspensão das regras do jogo. Ou seja, golpe, descontinuidade constitucional e ruptura de como estávamos prevendo o futuro. O que acontece quando temos grandes movimentações: primeiro, a gente passa para um novo mundo, portanto deixando uma dívida com o mundo de onde viemos. Segundo, como irei lidar com o que aconteceu comigo? Nosso sofrimento depende de nossos ideais. Quanto maior a expectativa, maior o sofrimento. O que acontece com o Brasil depois de um tempo que passamos a sonhar com o futuro? De uma projeção possível de ascensão, passamos para uma marcha ré. O choque com os nossos ideais e com as nossas esperanças produz um curto-circuito na nossa experiência de sofrimento. Por que aquilo que foi prometido não foi entregue?”, questiona Dunker, autor do livro “Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros” (Boitempo, R$76,00)
Assista ao primeiro bloco da Aula Pública com Christian Dunker: por que há mal-estar e sofrimento na crise política?
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No segundo bloco, Christian Dunker responde perguntas do público na Universidade Anhembi Morumbi.
O mal-estar, explica Dunker, depende do fato de que há no mundo gente demais. Ou seja, a causa do sofrimento é um objeto intrusivo, de algo que está a mais na cidade e, portanto, deve ser posto para fora. A crise política brasileira se aproveitou de uma reversão das expectativas de grupos sociais importantes para tentar categorizar quem são os responsáveis. Ou seja, a culpa é dos esquerdopatas, dos corruptos, enfim, das pessoas. E, com isso, mobilizamos afetos — como a culpa, a inveja e ódio — que são pouco (ou nada) produtivos para a transformação da realidade.
“Há uma possibilidade mais simples, que permeia o cotidiano e também a imprensa. Qual é a causa do meu mal-estar? O outro. Existe alguém que está a mais, roubando esse fragmento de felicidade que me pertence. Esse outro precisar ter um rosto. Preciso criar uma materialidade, ou seja, uma posição que preciso criar para justificar porque as coisas não deram certo. Então, assistimos à emergência de inimigos, de pessoas e tipos sociais, que são responsabilizados pelo mal-estar”, afirma.