Em uma longa transmissão ao vivo pelas redes sociais, o Partido Comunista do Chile lançou oficialmente, nesta quarta-feira (16/06), o programa de governo que Daniel Jadue, pré-candidato da legenda, pretende defender nas eleições presidenciais deste ano.
O próprio Jadue encabeçou o evento difundido através de mídias digitais e enfatizou que o cerne do seu projeto é a criação de um sistema de proteção social “que garanta uma vida digna a todas as pessoas e que signifique uma derrota estratégica sobre o neoliberalismo, que tanto sofrimento tem causado ao nosso povo”.
Entre as principais estruturas desta rede de proteção social, a mais inovadora é a proposta de criar o que o pré-candidato batizou de Sistema Nacional de Saúde, cujo conceito seria o de um sistema público similar ao que existe em vários países – como no Brasil, com o Sistema Único de Saúde (SUS) –, mas que não existe atualmente no Chile.
No caso da educação, o presidenciável do Partido Comunista admitiu que sua proposta de fortalecer o sistema público e gratuito educacional se baseia no aprofundamento das reformas iniciadas durante o segundo mandato de Michelle Bachelet (2014-2018), priorizando a ampliação da rede de ensino estatal, desde o ensino fundamental até as universidades e escolas profissionalizantes.
Outro tema sensível no Chile é a questão da previdência. Nesse sentido, o programa do Partido Comunista prevê a criação de um novo sistema público baseado em um modelo de repartição. Jadue lembrou que sua proposta, portanto, não é estranha no Chile, já que as Forças Armadas mantêm seus oficiais e funcionários nesse modelo até hoje – diferente do cidadão comum, que está obrigado a utilizar serviços oferecidos por empresas de previdência privada, a maioria delas ligadas a bancos.
Volta da previdência pública
A proposta previdenciária do candidato comunista não irá obrigar as pessoas a abandonarem o sistema privado, mas assegura que oferecerá garantias para que muitos dos trabalhadores que perderam fundos previdenciários durante a pandemia do novo coronavírus possam recuperá-los aderindo ao novo sistema.
Devido à falta de maior auxílio econômico por parte do atual governo de Sebastián Piñera, o Congresso do Chile, através de leis de emergência, autorizou o retiro de fundos previdenciários para que as famílias pudessem enfrentar a crise econômica que foi gerada por conta da covid-19.
Segundo a proposta comunista, o novo sistema previdenciário de repartição garantiria que todas as pessoas que aderirem a este modelo recuperarão seu direito à aposentadoria – porém, também afirmou que essa adesão não será obrigatória, e quem preferir se manter no sistema privado terá esta possibilidade.
Imposto permanente às grandes fortunas
Os principais questionamentos ao projeto comunista na imprensa chilena se referem ao possível alto custo dessas políticas. Sobre isso, Jadue foi bastante objetivo em suas considerações.
“O custo total estimado deste programa é de 11,2% do PIB. Essa proposta será viabilizada por uma reforma tributária que aproveitará para corrigir muitas das nossas desigualdades, cobrando daqueles que mais possuem e aliviando os setores vulneráveis”, explicou o pré-candidato.
Entre os diferentes pontos da proposta tributária comunista, o mais chamativo é a criação do imposto permanente às grandes fortunas, que propõe uma taxa anual de 2,5% sobre patrimônios a partir de cinco milhões de dólares.
Reprodução/ @danieljadue
Daniel Jadue pretende ser pré-candidato do Partido Comunista nas eleições presidenciais deste ano no Chile
Além disso, a reforma tributária que Jadue implementaria, caso seja eleito, pretende erradicar os mecanismos de evasão fiscal, obrigando especialmente os grandes contribuintes a atualizar permanentemente suas declarações patrimoniais. Outras medidas serão: o fim das isenções fiscais de qualquer espécie e a eliminação dos segredos bancários e tributários.
O economista Ramón López, um dos responsáveis pela parte econômica do projeto, respondeu com ironia críticas a respeito dessas ideias que surgiram em alguns meios de comunicação do país: “a maioria dessas medidas são utilizadas em países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e são recomendações que este organismo faz aos seus países membros, devido à sua preocupação em acabar com os paraísos fiscais”.
Meio Ambiente e Feminismo
Outros pontos importantes do programa anunciado por Jadue é a de nacionalização dos recursos naturais. O pré-candidato disse que promoverá uma nova lei de concessões para uso de recursos hídricos, mas garantiu que isso não gerará uma “onda estatizante ou expropriadora”.
Sobre este ponto, o líder comunista explanou que “algumas das transformações que nós queremos fazer não serão coisas de um só governo, terão que ser consolidadas a longo prazo, por pessoas que virão depois de nós”.
Ainda assim, ele assegurou que sua proposta se ajusta ao exigido por organizações ambientalistas chilenas, e destacou que o Partido Ecologista Verde é parte da sua coalizão.
Outro apoio importante mencionado por Jadue é o dos coletivos feministas, com os quais o candidato se comprometeu em impulsionar uma lei de igualdade salarial, um auxílio para financiar o trabalho domésticos e uma nova lei para legalizar o aborto em qualquer circunstância – em 2017, o governo de Michelle Bachelet sancionou uma lei que permite o aborto em casos de risco de vida materno, inviabilidade fetal e gravidez fruto de violência sexual.
Calendário eleitoral
Atualmente, Jadue é prefeito da comuna de Recoleta, uma das mais importantes da Região Metropolitana de Santiago. Também é um dos favoritos para ser o próximo presidente do Chile, segundo a maioria das pesquisas que analisam o clima político para o pleito.
Segundo pesquisa publicada nesta segunda-feira (14/06) pela consultora Pulso Ciudadano, Jadue aparece com 16% das intenções de voto, empatado com o candidato da direita, Joaquín Lavín.
Entretanto, devido à alta abstenção observada nas últimas eleições realizadas no Chile, a pesquisa também fez uma medição somente entre os que declararam que pretendem votar, e nesse caso, Jadue passa a liderar com grande margem: 21,5%, contra 11,1% de Lavín.
A pré-candidatura comunista enfrentará sua primeira disputa importante no dia 18 de julho, quando acontecerão as primárias. Nesse dia, a coalizão entre o Partido Comunista, a Frente Ampla e a Federação de Regionalista Verde escolherá seu candidato presidencial, em uma eleição entre Daniel Jadue e Gabriel Boric – deputado, ex-líder estudantil e candidato do partido Convergência Social, membro da Frente Ampla.
O primeiro turno das eleições presidenciais do Chile acontecerá no dia 21 de novembro. Caso seja necessário um segundo turno, será em 19 de dezembro.