Partidários e opositores do golpe militar que depôs no último dia 3 de julho o presidente islamita Mohammed Mursi voltaram a medir neste domingo (07/07) suas forças nas ruas do Cairo com grandes manifestações, que evidenciam a divisão atual do Egito.
Os islamitas tentaram intensificar sua exigência que Mursi retorne ao poder comparecendo em massa a diferentes pontos da cidade, como a praça Rabea Adauiya e a sede da Guarda Republicana (unidade militar de escolta do presidente do Egito), onde acreditam que possa estar o presidente deposto.
Porém, os defensores do golpe, convocados pelo movimento “Tamarrud” (Rebelião, em árabe), responderam abarrotando a famosa praça Tahrir em defesa do novo presidente interino, Adly Mansour, cuja renúncia foi exigida hoje pelo grupo salafista Gama Islamiya, aliado de Mursi.
O cisma social egípcio já custou 35 vidas em cinco dias e faz temer uma deterioração ainda maior da situação.
Dentro desta queda de braço de protestos, que são pacíficos durante o dia e às vezes tornam-se sangrentos após o pôr do sol, a chamada Aliança Nacional em Defesa da Legitimidade Eleitoral, integrada pela Irmandade Muçulmana e outros grupos islamitas, mostrou sua força com concentrações grandes, uma delas na praça Al-Nahda, em frente à Universidade Árabe.
Milhares de islamitas e alguns salafistas se amontoaram ali perante um palco decorado com cartazes com palavras de ordem como “Sim à legitimidade” e “Abdel Fatah Al Sisi (chefe do Exército e autor do golpe) acabará afundando”.
Prova da crescente tensão no país eram as barricadas de concreto e sacos de terra instalados nos acessos, assim como os inumeráveis montões de pedras preparadas para serem lançadas em caso de confronto.
Para os islamitas, o vilão não é o novo presidente interino, Adly Mansour, mas o general Al Sisi, alvo da maioria de cânticos e cartazes.
“Meu presidente é Mursi, não o outro que nem me lembro como se chama. Mas dá na mesma, porque quem controla tudo na realidade é Al Sisi”, declarou o jovem Ahmed Mohsan.
Entre os presentes, muitos deles mulheres, havia poucas ideias concretas, mas muito otimismo sobre o retorno ao poder de Mursi, vencedor em 2012 das primeiras eleições presidenciais após a queda do ditador Hosni Mubarak, um ano antes.
“Se tiramos Mubarak sem armas, também podemos recuperar Mursi sem elas”, argumentou Mohsan.
“Não sei como nem quando, mas Mursi voltará, se Deus quiser”, afirmou Ruad Asem, de 17 anos, enquanto assentia sua mãe, coberta com um véu preto que só deixa entrever seus olhos.
NULL
NULL
O golpe uniu em torno de Mursi egípcios com diferenças ideológicas. Hisham Al Ayli diz que Abu Ismail, clérigo fundamentalista detido, é para ele “como o papa” para os católicos, o que envergonha seus dois amigos, Mustafa Mahmoud e Tamer Ibrahim, que não votaram em Mursi, mas em um islamita moderado, Abdel Moneim Abul Futuh.
Em Tahrir, também há pedras nos acessos, amontoadas como munição, mas o ambiente é de alegria, com um grande cartaz em defesa da “segunda revolução”.
“Mursi tinha que sair e dar lugar a alguém melhor que ele, porque fez o país retroceder, não ressurgir”, opinou o pedreiro Walid Magrebi.
Os manifestantes formaram uma onda de bandeiras nacionais e cantaram: “O povo acabou com o regime”.
“A Irmandade Muçulmana só quer excluir os demais. Só desejam controlar o poder”, criticou Haizam al Saadi, nascido há 40 anos na cidade de Sharquiya, a mesma de Mursi.
A instabilidade também chegou à cena política. O país foi dormir ontem com um novo primeiro-ministro, Mohamed ElBaradei, cuja nomeação tinha sido confirmada pela agência estatal “Mena”, e acordou sem ele, aparentemente pela rejeição salafista à decisão.
Além disso, o Ministério Público ordenou hoje a detenção de dois dirigentes do braço político da Irmandade Muçulmana, Esam el Arian e Mohammed el Beltagui, pela acusação de instigar a morte de manifestantes.