“Completa falta de proteção”. Com estas palavras, portenhos preocupados com a conservação arquitetônica da capital argentina definem a situação dos edifícios históricos de Buenos Aires, muitos deles construídos no início do século XIX. Segundo associações formadas para impedir demolições, a identidade da cidade está se transformando “drasticamente” como resultado da ineficiência de autoridades para a preservação das construções em risco.
Divulgação/Proteger Barracas
Em 2010, a organização World Monuments Watch incluiu o centro histórico da cidade e o Teatro Colón entre os 100 patrimônios culturais da humanidade que correm perigo por falta de conservação ou por catástrofes naturais. Alguns dos casos são evidentes. Ao lado da Praça do Congresso argentino, um edifício com um moinho, local onde funcionou uma tradicional confeitaria de 1917 a 1997, tem um aspecto sombrio e abandonado.
Formada por portenhos que decidiram se manifestar publicamente contra as demolições de edifícios de valor arquitetônico e histórico e para pensar em estratégias de defesas de parques, ruas e mobiliários urbanos da cidade, a organização Basta de Demolir garante que todos os pontos turísticos da cidade estão comprometidos.
“Buenos Aires tem como pólo de atração justamente suas construções singulares e ecléticas, com uma grande quantidade de edifícios de arquitetura francesa, art decó e nouveau, edificadas principalmente entre 1900 a 1941”, explicam representantes da organização. Segundo eles, “não há titubeios em afetar bairros como San Telmo, primeira área da cidade considerada patrimônio histórico”.
Representantes da associação Proteger Barracas, formada por moradores de um bairro que conserva construções anteriores a 1850, localizado ao lado de San Telmo, afirmaram ao Opera Mundi que a deterioração do patrimônio arquitetônico portenho se intensificou nos últimos cinco anos. “Apesar da existência de algumas áreas de Proteção Histórica, elas abarcam uma mínima parte das zonas de interesse patrimonial”, explicam.
“O que nos une é a percepção de que esta identidade está sendo modificada drasticamente. Ninguém quer morar em um museu, mas estamos convencidos de que a nova arquitetura pode viver em harmonia com a tradicional, integrando-se a ela, mas sem demolir indiscriminadamente”, defendem os representantes da associação.
Divulgação/Proteger Barracas
Segundo a organização, a grande quantidade de demolições se deve à modificação do Código de Planejamento Urbano da cidade, em 2000. O dispositivo aumentou a altura permitida para a construção de edifícios em algumas áreas na cidade “mudando a lógica econômica nestas regiões, estimulando mais a demolição e a falta de recuperação edilícia que a construção vertical fomenta”, explicam, sobre o aumento da especulação imobiliária.
A conservação do patrimônio arquitetônico de Buenos Aires depende da prefeitura, que tem um papel decisivo na instrumentação das políticas de estado em relação aos padrões de construções edilícias e de uso de solo. Segundo dados obtidos em maio pelo jornal Tiempo Argentino, somente 5% dos edifícios portenhos construídos antes de 1941 foram vistoriados pelo CAAP (Conselho Assessor de Assuntos Patrimoniais) da secretaria de Planejamento do Desenvolvimento Urbano.
Divulgação/Proteger Barracas
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Das 140 mil das construções edificadas há mais de 70 anos, somente cerca de duas mil foram catalogadas como patrimônio. Nos últimos anos, mais de 80 foram demolidas antes de serem vistoriadas.
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Os moradores esclarecem, no entanto, que apesar de que nenhuma das administrações anteriores da cidade tenham adotado a preservação como uma política de estado, a presente gestão, comandada pelo megaempresário Mauricio Macri, intensificou a tendência. “A maioria dos novos edifícios exibe baixa qualidade construtiva para baratear os custos”, garantem os militantes, que decidiram intervir ativamente na defesa do bairro.
Divulgação/Proteger Barracas
Teatro Colón
Apesar de passar quase três anos fechado para reformas estruturais, os trabalhadores do principal teatro da cidade alegam falta de condições para trabalhar nas oficinas de confecção de materiais utilizados nas produções, como figurino e cenário.
Membros da organização Basta de Demolir afirmam que as áreas de entrada e o salão principal do Colón passaram por um “minucioso trabalho” de restauração. Segundo eles, no entanto, na maior parte da construção, a reforma ainda não foi finalizada. “As reparações têm sido muito questionadas por artistas e trabalhadores do teatro e ainda não se sabe quando e como serão finalizadas”, explicam.
Um informe divulgado após uma inspeção realizada em maio do ano passado pela Superintendência de Bombeiros da Polícia Federal argentina corrobora as queixas. “As instalações elétricas das oficinas e das salas de ensaio [de Ballet e da orquestra] estão fora da norma” no que diz respeito a instalações elétricas, registra o informe. O comunicado também acrescenta que, em vários setores, “se observa a ausência de elementos de segurança”.
Na ocasião, o delegado dos trabalhadores do teatro, Máximo Parpagnoli, afirmou à imprensa local que a inspeção “comprova o grave estado em que [os funcionários] desempenham suas tarefas e o alto grau de perigo a que estão expostos”, atribuindo as falhas nas condições de segurança e higiene trabalhista à diretoria do Colón e à gestão do prefeito Mauricio Macri.
No início deste ano, os trabalhadores do local denunciaram também o descuido com instrumentos do teatro, como pianos “em estado deplorável”, e o abandono em depósitos ou containeres de materiais como figurino, sapatos, partituras, materiais de cenário, além de documentação e itens da biblioteca do teatro, sem nenhum tipo de preocupação com sua devida conservação.
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