A escassez ou falta completa de determinados produtos nos supermercados fazem parte da realidade na Venezuela, um país que ainda importa a maioria do que consome. Itens como papel higiênico, farinha de milho e frango rapidamente somem das gôndolas; um problema cuja uma das soluções está sendo garantida pela visita que o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, faz por Uruguai, Argentina e Brasil, grandes produtores de alimentos.
Efe
Cristina Kirchner recebe de Maduro um retrato do presidente Hugo Chávez, falecido em 5 de março deste ano
Nesta quarta-feira (08/05), em Buenos Aires, o chefe de Estado firmou um convênio com a presidente Cristina Kirchner para garantir a reserva alimentária por três meses. Os produtos que serão importados são óleo de soja, arroz, carne bovina, leite em pó, margarina, milho e frango. Antes de partir, ainda em Caracas, Maduro admitiu que um dos principais objetivos do giro pelos países do Mercosul era amenizar o desabastecimento.
“Sim, há problemas severos de abastecimento. Isso está ligado a alguns fatores. Um deles é a sabotagem”, ressaltou Maduro. Caracas reclama das grandes cadeias importadoras venezuelanas, que manipulariam a distribuição de produtos com o intuito de enfraquecer o governo. Desde o final do ano passado, medidas para coibir a estocagem ilegal de itens foram colocadas em prática em todo o país, mas o cenário ainda não foi revertido. O presidente sublinhou que a reserva também contará com produtos venezuelanos.
Maduro admitiu que a falta de diversificação da economia durante os 14 anos de governo chavista afetaram a autossuficiência do país com alguns produtos, principalmente agrícolas. “Há 100 anos, a Venezuela sofreu mudanças que amputaram os conhecimentos agrícolas. Por isso agora pedimos apoio. Convidamos os empresários argentinos para fazer empresas mistas, produzir na terra fértil e fazer uma revolução alimentar, que é parte da revolução na qual estamos empenhados”.
Beneficiado pela renda petroleira, a Venezuela trocou no começo do século XX o desenvolvimento da agricultura e da indústria pela importação. No início do governo Chávez, o país importava 70% dos alimentos e a atividade rural não chegava a 5% do PIB (Produto Interno Bruto). A estratégia central é aliar ampliação da agricultura familiar com grandes corporações estatais.
Essas empresas, além de terem sua própria produção, compram a safra dos pequenos agricultores e das cooperativas locais, além de fornecerem crédito e assistência. Também distribuem os alimentos nas cidades, tanto através da rede privada quanto do sistema Mercal, controlado pelo governo e com preços subsidiados. Vários desses projetos contam com apoio e sociedade da Pdval, braço agrícola da PDVSA.
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A urgência do desenvolvimento industrial foi outro tema abordado pelo presidente venezuelano, que desembarca em Brasília nesta quinta-feira (09/05), na última etapa da viagem pelos países do Mercosul. “Precisamos ampliar os convênios que já estão avançando para a industrialização da Venezuela, um desenvolvimento agro-industrial no llano [campo] venezuelano”. Sobre a industrialização, o ministro de Indústria venezuelano, Ricardo Menéndez, definiu a criação de um grupo de trabalho com a Argentina para a troca de experiências e transferência de conhecimento “no desenvolvimento de parques industriais e tecnologia de gestão dos mesmos”.
Menéndez informou que já estão funcionando na Venezuela três fábricas para o processamento de frutas e tubérculos e quatro do setor de carnes. Segundo ele, há novos projetos vinculados à fabricação de elevadores, produtos de higiene pessoal e cozinhas a gás, com pré-contratos assinados com as empresas Servas, Emege e ESME.
Argentinos comentam visita de Maduro antes de ato em Buenos Aires:
Cristina e Maduro assinaram ao todo 12 acordos, em áreas como desenvolvimento tecnológico, pesca, cooperação espacial, turismo, defesa e energia. Foi definida a importação de 10 mil veículos argentinos pela Venezuela, enquanto os dois presidentes concordaram na ampliação da aliança estratégica entre as estatais YPF (argentina) e PDVSA (Venezuela). A Venezuela vende petróleo a preços subsidiados para a Argentina, no âmbito da aliança. De acordo com Cristina, a recém estatizada YPF poderá avançar em acordos “muito mais importantes” com a venezuelana.
Brasil
Fontes oficiais brasileiras disseram à Agência Efe que, de manhã, Maduro terá uma série de “atividades privadas”, entre elas uma reunião com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que durante a campanha para as eleições de abril pediu aos venezuelanos que lhe apoiassem. Depois do meio-dia, Maduro será recebido por Dilma no Palácio do Planalto. Segundo um comunicado do Ministério das Relações Exteriores, a visita “dará continuidade às reuniões periódicas de alto nível entre os dois países”, que mantêm vastos programas de cooperação bilateral.
Essa cooperação, estabelecida durante o mandato de Hugo Chávez, existe nas áreas de integração produtiva, segurança alimentar, políticas públicas, saúde e desenvolvimento social e tecnológico, entre outras. Além disso, Brasil e Venezuela desenvolvem iniciativas de apoio conjunto a países do Caribe, com os quais cooperam em agricultura familiar e desenvolvimento social, entre outros setores.
A Venezuela é um dos principais destinos das exportações brasileiras na América do Sul e o comércio entre os países chegou no ano passado ao número histórico de US$ 6,05 bilhões, com a balança claramente inclinada em favor do Brasil.
Na agenda discutida por Dilma e Maduro, o Ministério das Relações Exteriores ressaltou uma análise do processo de adesão da Venezuela às normas do Mercosul, ao qual se incorporou em junho do ano passado, em coincidência com a decisão que suspendeu o Paraguai. Além disso, está previsto que os dois presidentes analisarão os passos para o retorno do Paraguai ao bloco após as eleições do último dia 21 de abril, vencidas por Horacio Cartes, do Partido Colorado e que assumirá o poder em agosto, quando a Venezuela controlará a presidência semestral do Mercosul.