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Análise

As crises dos impérios e a polarização assíncrona

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Quando o bolsonarismo tinha que lidar com as gravações que escancaravam o balcão de negócios no MEC, ganhou de presente do STF a condenação do deputadinho e isso lhe permitiu retomar o comando da pauta

Carlos Ferreira Martins

São Carlos (Brasil)
2022-04-24T21:18:08.000Z

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Um dos grandes desafios da política mundial neste período de reorganização dos imperialismos é a curiosa polarização entre uma direita do século XXI, antenada no controle dos novos meios de comunicação e nos modos de recepção da informação pelas massas e uma esquerda que oscila entre os paradigmas e modus operandi do século XX, entre as saudades de Rousseau e a revalorização de Stalin.

No âmbito internacional, o que temos visto ao longo destes dois meses de guerra na Ucrânia, é a esquerda oscilando entre os extremos da reiteração abstrata do princípio da não intervenção como critério inegociável e alguns casos, minoritários mas significativos, de olhar para Putin como o sucessor de Stalin.

Do outro lado, são mais interessantes as leituras de analistas profissionais, da direita política, vinculada ao trumpismo no caso dos estadunidenses ou não. Ex-militares ou agentes dos serviços de informação, inclusive europeus,  tem trazido leituras “frias” do conflito para logo depois se queixar de perseguição e acusações de simpatia pelo “putinismo”. 

Compreende-se que essas acusações causem perplexidade a quem, por dever de ofício, deve buscar a informação nua e crua antes do tratamento necessariamente ideológico que seus superiores políticos lhe darão. 

Para voltar ao exemplo clássico, os serviços de inteligência ocidentais, Colin Powell à frente, sabiam perfeitamente que Saddam Hussein não tinha as armas de destruição massiva usadas como justificativa para a invasão que deixou mais  de meio milhão de mortos e a quinta maior reserva petrolífera do planeta nas mãos das empresas estadunidenses.

Mas todos sabiam que a comunicação era parte tão decisiva da guerra quanto o poderio bélico, trazendo a um novo patamar o que os analistas militares chamam de guerra híbrida. Ou seja, aquela que se dá tanto no âmbito material da destruição de corpos e riquezas quanto no que desde o Vietnã se convencionou chamar da conquista de corações e mentes.

Esse longo excurso era para dizer duas coisas. Primeiro, que não cabe mais pensar os embates internos de qualquer país separados de uma conjuntura internacional de intensas crises e dramáticos rearranjos.  E segundo que o inegável crescimento planetário das posições de extrema direita passa pelo descrédito das formas tradicionais de organização partidária mas isso não é apenas um desgaste natural senão parte de uma estratégia, cruel mas competente.

Se olharmos para o Brasil a partir desse quadro encontraremos a curiosa situação de uma esquerda (e também de setores democráticos) que acusam o bolsonarismo de tosco e burro sem perceber que ele vem demonstrando ao longo de três anos uma extraordinária capacidade de pautar o debate e levar adiante seu programa. É o curioso caso do adversário incompetente mas que, até agora, vem ganhando de 7 a 1.

Quando o bolsonarismo tinha que lidar com as gravações que escancaravam o balcão de negócios no MEC e a canalhice explícita dos generais da mal chamada justiça militar fazendo piadas sobre as torturas, ganhou de presente do STF a condenação do deputadinho e isso lhe permitiu retomar o comando da pauta com a “graça” concedida.

Como se viu nestes últimos dias a isca funcionou outra vez. Textos e textos discutindo se a prisão e depois o perdão são constitucionais ou não é tudo que o bolsonarismo queria.  De boa parte da esquerda ao porta-voz oficioso dos Marinho, todos pedem que Lula se manifeste a respeito.

Ele, que não é perfeito nem infalível, mas já apanhou muito na vida, sabe que o candidato que está à frente nas pesquisas não segue a pauta dos adversários.

O crítico de arte e pensador marxista T. J. Clark escreveu no começo da década passada sobre a necessidade de uma esquerda capaz de descer do céu das utopias e “olhar o mundo”.  Não sei se Lula é essa esquerda. Mas é o que temos de mais próximo.

Ao menos ele sabe que a grande maioria da população brasileira, aquela que tem que viver com dois salários mínimos ou menos, não quer discutir se a condenação e o perdão do deputadinho são constitucionais ou não. Quer saber se conseguirá comer algo amanhã ou na semana que vem. E, como diz a campanha, quem tem fome tem pressa.

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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