Com muito pouco você
apoia a mídia independente
Opera Mundi
Opera Mundi APOIE
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Podcasts
Opinião

Por que a Grécia cobra da Alemanha de Merkel indenizações da ocupação nazista?

Encaminhar Enviar por e-mail

Entenda o argumento por trás da demanda do premiê Alexis Tsipras, exigindo o pagamento de uma dívida 'financeira e moral' que persiste desde a 2ª Guerra

Filipe Figueiredo

2015-04-04T15:36:00.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

Há uma semana, o primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, esteve em Berlim, onde se encontrou com a chanceler alemã, Angela Merkel. O tema principal foi, obviamente, a discussão da dívida grega, que supera os € 300 bilhões. O governo Tsipras já abandonou a retórica do calote na dívida, mas insiste em discutir seus termos e, principalmente, garantir que o país tenha meios para sanar a “crise humanitária” decorrente do colapso econômico. Nas conversas com Merkel, entretanto, existe o componente da crescente antipatia grega ao governo alemão. Maior fiadora da moeda europeia, a Alemanha também é vista como a vilã causadora da crise, mas agora com um novo, e delicado, elemento: Tsipras, em plena capital alemã, afirmou que a Alemanha possui uma dívida “financeira e moral” para com a Grécia, decorrente da Segunda Guerra Mundial.

Leia aqui as outras análises do articulista Filipe Figueiredo

Agência Efe

"Nem gregos são preguiçosos, nem alemães são responsáveis pelos males da Grécia: devemos superar os estereótipos", afirmou Tsipras

A demanda grega é baseada em dois fatores principais. Em 1942, o governo fantoche da Grécia ocupada teria sido obrigado a emprestar depósitos em ouro no valor equivalente de 476 milhões de marcos, sem juros devidos, ao governo do Reich alemão. Um relatório do Bundestag, o Parlamento alemão, de 2012, estima que o valor corrigido seria de cerca de € 8 bilhões — a Grécia, por sua vez, calcula o valor em € 11 bilhões, apenas corrigido, sem a incidência de juros. O tempo verbal utilizado não é por excesso de zelo, mas pelo fato de que a existência de tal “empréstimo” é contestada. Claramente não se trataria de empréstimo, mas de confisco forçado por uma potência ocupante. Além disso, a natureza dos documentos é dúbia. Argumenta-se tanto que é uma dívida quanto que são apenas papéis de contabilidade da ocupação alemã na Grécia.

Além disso, a Grécia considera que não foi contemplada nos acordos de reparação e indenização do pós-guerra. O país foi indenizado pela Itália e pela Bulgária nos Tratados de Paz de Paris de 1947, mas a discussão de reparações pela Alemanha não foi feita, sendo deixada para o tratado de paz final. Isso foi acordado em 1953, com o Acordo de Londres sobre a dívida alemã. Após a divisão do país em duas repúblicas alemãs, a Federal (Ocidental) e a Democrática (Oriental), e a busca por espaço na polarização da Guerra Fria, o encerramento formal da Segunda Guerra Mundial se deu apenas em 12 de setembro de 1990, com o tratado sobre o acordo final em respeito à Alemanha, que reunificou o país. Assinado pelas duas repúblicas alemãs e pelas quatro potências aliadas (EUA, URSS, Reino Unido e França), o tratado não aborda indenizações financeiras e não contou com representantes de países tais como a Grécia.

A reunificação da Alemanha é essencial para a compreensão dessa dívida, pois o citado Acordo de Londres, além de amenizar o débito alemão, classificado de “impagável”, estabelecia que todas as dívidas fossem pagas pela Alemanha unificada, incluindo débitos decorrentes do Tratado de Versalhes, após a Primeira Guerra Mundial. O débido deste conflito de quase um século atrás só foi finalmente quitado quando a Alemanha pagou os últimos € 70 milhões em outubro de 2010.

No que concerne à Segunda Guerra Mundial, a Alemanha fez uma série de acordos bilaterais com outros países e também reparações pelas atrocidades cometidas contra as populações dos países ocupados. Por exemplo, no decorrer de décadas, a ex-Iugoslávia recebeu quase US$ 40 bilhões (data base de 1938) em equipamentos e fábricas transferidas. Na década de 1970, a Alemanha ocidental pagou mais de 1 bilhão de marcos à Polônia, além de compensações financeiras e territoriais pela então Alemanha oriental.

Dívidas do holocausto

O caso mais conhecido é o de reparações pelo Holocausto pagas ao Estado de Israel, considerado herdeiro legal para famílias de judeus que não deixaram parentes vivos. Estima-se que, em valores atuais, as compensações foram equivalentes a US$ 150 bilhões, pagos por duas décadas. Em 1960, a Alemanha ocidental pagou 115 milhões de marcos em compensação às vítimas gregas do Holocausto, e esse é o único pagamento alemão para a Grécia confirmado.

Entra-se, então, em uma disputa legal, baseada na retórica jurídica. A Alemanha considera que já indenizou os países devidos, incluso a Grécia em 1960, e que os temas de compensação entre países foram encerrados pelo tratado da reunificação de 1990; Merkel afirmou que o assunto está “legalmente e politicamente encerrado”. A Alemanha, hoje, aceita apenas casos de compensação individual.

A Grécia, por sua vez, afirma que a indenização de 1960 foi para indivíduos, que nem o país foi indenizado e nem o empréstimo forçado de 1942 foi compensado. A Grécia teve quase meio milhão de mortos durante a guerra e a consequente ocupação, de uma população de pouco mais de 7 milhões de habitantes. Cerca de 300 mil morreram de fome ou doença durante a ocupação e quase toda a população judia do país foi exterminada. Daí a frase de que a Alemanha possui uma obrigação moral para com a Grécia. Logo após a Segunda Guerra Mundial, a Grécia viveu em guerra civil até 1949. Temerosos por uma vitória da guerrilha comunista que resistiu aos nazistas, os EUA colocaram a Grécia no Plano Marshall; a rápida separação da Europa em duas zonas de influência efetivamente suspendeu as conversas sobre reparações alemãs. Chega-se ao ponto de ameaças veladas de confisco de propriedades alemãs por Nikos Paraskevopoulos, Ministro da Justiça do governo Tsipras.

Precedente aberto?

A diferença de perspectivas sobre o tema é clara. A Alemanha foca-se nos aspectos políticos e legais de uma eventual reparação à Grécia, especialmente o temor de que abra um precedente perigoso. Bélgica, Noruega, Dinamarca, República Tcheca e Eslováquia foram ocupados diretamente pela Alemanha e poderiam pedir compensações semelhantes. A Grécia baseia-se na condenação moral do país derrotado no maior conflito da Europa e no fato de que a indenização teria fins humanitários, a recuperação da economia e da sociedade gregas. Algumas estimativas extrapolam que compensações totais e seus respectivos juros simplesmente cobririam toda a dívida grega. Para o cidadão alemão, entretanto, a Grécia passa por caloteira; além de não querer pagar suas dívidas, é oportunista em querer usar a Segunda Guerra Mundial como escudo. Essa acusação não é totalmente verdadeira.

O governo grego fala do assunto, na atual conjuntura, desde 2012, ainda durante o governo do conservador Antonis Samaras. A cobrança, entretanto, é histórica. O europarlamentar e herói da resistência Manolis Glezos cobra o governo alemão desde a década de 1970. Para os gregos, fica o ressentimento de um país que se viu como alvo de especulação, especialmente por uma potência que ocupou e vitimou o país. E as notícias fazem com que o ressentimento fique difícil de esquecer. Uma das queixas gregas é que a Alemanha foi um dos maiores beneficiados dos orçamentos gregos nos últimos 15 anos; a Grécia assinou contratos de mais de € 8 bilhões para aquisição de cerca de 500 tanques e quatro submarinos alemães. Há uma semana, no dia 26 de março, 32 gregos, civis e militares, foram indiciados por corrupção no processo de compra dos submarinos. Do tema, delicado, das indenizações pela guerra, fica a reabertura de feridas entre os dois países e, principalmente, entre as duas sociedades.

(*) Filipe Figueiredo é redator do Xadrez Verbal

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Constituinte no Chile

'Base de um Chile mais justo', diz presidente da Constituinte na entrega de texto final

Encaminhar Enviar por e-mail

Ao cumprir um ano de debate, Convenção Constitucional encerra trabalhos com entrega de nova Carta Magna a voto popular

Michele de Mello

Brasil de Fato Brasil de Fato

São Paulo (Brasil)
2022-07-04T21:39:54.000Z

Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

Aconteceu a última sessão da Constituinte chilena nesta segunda-feira (04/07) com a entrega de uma nova proposta de Constituição para o país. 

"Esta proposta que entregamos hoje tem o propósito de ser a base de um país mais justo com o qual todos e todas sonhamos", declarou a presidente da Convenção Constitucional, María Elisa Quinteros. 

Após um ano de debates, os 155 constituintes divulgaram o novo texto constitucional com 178 páginas, 388 artigos e 57 normas transitórias.

O presidente Gabriel Boric participou do ato final da Constituinte e assinou o decreto que convoca o plebiscito constitucional do dia 4 de setembro, quando os chilenos deverão aprovar ou rechaçar a nova Carta Magna.

"Hoje é um dia que ficará marcado na história da nossa Pátria. O texto que hoje é entregue ao povo marca o tamanho da nossa República. É meu dever como mandatário convocar um plebiscito constitucional, e por isso estou aqui. Será novamente o povo que terá a palavra final sobre o seu destino", disse.

No último mês, os constituintes realizaram sessões abertas em distintas regiões do país para apresentar as versões finais do novo texto constitucional. A partir do dia 4 de agosto inicia-se a campanha televisiva prévia ao plebiscito, que ocorre em 4 de setembro. 

Embora todo o processo tenha contado com ampla participação popular, as últimas pesquisas de opinião apontam que a nova proposta de constituição poderia ser rejeitada. Segundo a pesquisa de junho da empresa Cadem, 45% disse que votaria "não", enquanto 42% dos entrevistados votaria "sim" para a nova Carta Magna. No entanto, 50% disse que acredita que vencerá o "aprovo" no plebiscito de setembro. Cerca de 13% dos entrevistados disse que não sabia opinar.

Reprodução/ @gabrielboric
Presidente da Convenção Constitucional, María Elisa Quinteros, e seu vice, Gaspar Domínguez, ao lado de Gabriel Boric

"Além das legítimas divergências que possam existir sobre o conteúdo do novo texto que será debatido nos próximos meses, há algo que devemos estar orgulhosos: no momento de crise institucional e social mais profunda que atravessou o nosso país em décadas, chilenos e chilenas, optamos por mais democracia", declarou o chefe do Executivo. 

Em 2019, Boric foi um dos representantes da esquerda que assinou um acordo com o então governo de Sebastián Piñera para por fim às manifestações iniciadas em outubro daquele ano e, com isso, dar início ao processo constituinte chileno.

Em outubro de 2020 foi realizado o plebiscito que decidiu pela escrita de uma nova constituição a partir de uma Convenção Constitucional que seria eleita com representação dos povos indígenas e paridade de gênero.

"Que momento histórico e emocionante estamos vivendo. Meu agradecimento à Convenção que cumpriu com seu mandato e a partir de hoje podemos ler o texto final da Nova Constituição. Agora o povo tem a palavra e decidirá o futuro do país", declarou a porta-voz do Executivo e representante do Partido Comunista, Camila Vallejo.

A composição da Constituinte também foi majoritariamente de deputados independentes ou do campo progressista. Todo o conteúdo presente na versão entregue hoje ao voto público teve de ser aprovado por 2/3 do pleno da Convenção para ser incluído na redação final.

Com minoria numérica, a direita iniciou uma campanha midiática de desprestígio do organismo, afirmando que os deputados não estariam aptos a redigir o novo texto constitucional. Diante dos ataques, o presidente Boric convocou os cidadãos a conhecer a fundo a nova proposta, discutir de maneira respeitosa as diferenças e votar pela coesão do país, afirmando não tratar-se de uma avaliação do atual governo, mas uma proposta para as próximas décadas. 

"Não devemos pensar somente nas vantagens que cada um pode ter, mas na concordância, na paz entre chilenos e chilenas e pela dignidade que merecem todos os habitantes da nossa pátria", concluiu o chefe de Estado.

Você que chegou até aqui e que acredita em uma mídia autônoma e comprometida com a verdade: precisamos da sua contribuição. A informação deve ser livre e acessível para todos, mas produzi-la com qualidade tem um custo, que é bancado essencialmente por nossos assinantes solidários. Escolha a melhor forma de você contribuir com nosso projeto jornalístico, que olha ao mundo a partir da América Latina e do Brasil.

Contra as fake news, o jornalismo de qualidade é a melhor vacina!

Faça uma
assinatura mensal
Faça uma
assinatura anual
Faça uma
contribuição única

Opera Mundi foi criado em 2008. É mais de uma década de cobertura do cenário político internacional, numa perspectiva brasileira e única. Só o apoio dos internautas nos permite sobreviver e expandir o projeto. Obrigado.

Eu apoio Opera Mundi
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!
Opera Mundi

Endereço: Avenida Paulista, nº 1842, TORRE NORTE CONJ 155 – 15º andar São Paulo - SP
CNPJ: 07.041.081.0001-17
Telefone: (11) 4118-6591

  • Contato
  • Política e Economia
  • Diplomacia
  • Análise
  • Opinião
  • Coronavírus
  • Vídeos
  • Expediente
  • Política de privacidade
Siga-nos
  • YouTube
  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram
  • Google News
  • RSS
Blogs
  • Breno Altman
  • Agora
  • Bidê
  • Blog do Piva
  • Quebrando Muros
Receba nossas publicações
Receba nossas notícias e novidades em primeira mão!

© 2018 ArpaDesign | Todos os direitos reservados