DANIELLA AINDA VAI MEXER
A diplomacia brasileira se envolveu diretamente em uma das maiores crises políticas da América Latina ao receber Manuel Zelaya na Embaixada do Brasil em Tegucigalpa, na terceira tentativa do presidente deposto de voltar a Honduras, quase três meses após o golpe de Estado.
Esta não é a primeira intervenção do Brasil em questões políticas internas de outros países do continente na história recente. Um exemplo é a tentativa de golpe no Paraguai, em maio de 1996, contra o então presidente Juan Carlos Wasmosy. Na época, Wasmosy tentou afastar o general Lino Oviedo, pré-candidato ao cargo, do comando do Exército. Oviedo se recusou e ameaçou dar um golpe, bombardeando o palácio presidencial.
Na ocasião, o Brasil interferiu na crise para tentar impedir um “golpe de Estado à moda antiga” em um país vizinho e teve uma atuação de bastidores, conversando frequentemente com Oviedo, como relatou uma fonte do Itamaraty ao Opera Mundi. O então presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a ameaçar o Paraguai de isolamento político e econômico, junto com os presidentes argentino, Carlos Menem, e uruguaio, Julio María Sanguinetti.
O Brasil sinalizou que fecharia as fronteiras, além de bloquear os Portos de Santos e Paranaguá às exportações paraguaias e suspender o país do Mercosul. No final da crise, o Itamaraty ofereceu asilo a Oviedo.
Outro caso foi a intervenção brasileira em 2000 no caso Vladimiro Montesinos, ex-chefe de Inteligência do então presidente peruano Alberto Fujimori. Ele havia sido flagrado num esquema de corrupção e Fujimori precisou antecipar as eleições. Uma busca por Montesinos foi iniciada e a crise terminou quando este recebeu refúgio no Panamá, com mediação de Fernando Henrique, que telefonou para a presidente Mireya Moscoso e fez o acordo.
Há ainda outras situações, como interferências nos confrontos entre Equador e Peru, em 1995, que culminaram com a assinatura, em Brasília, do Acordo Global e Definitivo de Paz, em 1998.
O envolvimento da diplomacia brasileira no caso de Honduras não pode, no entanto, ser comparada a crise passadas, afirmou o funcionário do Itamaraty. Segundo ele, o governo brasileiro ajudou a transformar uma crise política interna em um problema do hemisfério e, agora, em uma questão bilateral. “É diferente defender a democracia em um país vizinho ou da América do Sul. No caso do Honduras, não temos nada a ver com isso”, pontuou.
Outra direção
Na avaliação do pesquisador André Martin, especialista em geopolítica do continente americano da Universidade de São Paulo, apesar de a política do Itamaraty ser mais concentrada na América do Sul, o Brasil foi tomado como liderança no caso de Honduras, “mesmo com a postura anti-intervencionista de sempre”.
Para Martin, o Brasil não teve ação nenhuma no caso, já que quem teria escolhido a embaixada brasileira foi o próprio Zelaya e, portanto, o país “foi pego de surpresa”. De acordo com o pesquisador, a partir do momento em que o presidente deposto está em território da representação brasileira, a diplomacia está diretamente envolvida.
A América Central é uma região prejudicada pelo atual molde da diplomacia do continente americano e, por isso, Tegucigalpa sofre as consequências por estar “em uma zona cinzenta entre o Nafta e a Unasul”, avaliou o pesquisador.
O Nafta é um bloco econômico formado por Estados Unidos, Canadá e México que começou a funcionar a partir de 1994. Já a Unasul (União das Nações Sul-Americanas), que existe desde 2004, reúne doze países da América do Sul com o objetivo de aprofundar a integração da região.
Segundo um diplomata do Itamaraty, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu outro rumo à política externa do país ao adotar uma “política terceiro-mundista”. Ele se refere ao fato de o Ministério de Relações Exteriores atualmente tentar uma aproximação maior dos países da América do Sul e não dar prioridade aos países desenvolvidos, como era feito na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1994-2002).
“Na época, o Ministério de Relações Exteriores, conduzido por Celso Lafer, tentava priorizar os países de primeiro mundo na agenda diplomática do país”, disse o funcionário do Itamaraty.
O Brasil é o mais envolvido com a crise política de
Honduras, mas outros países também estão se manifestando contra o golpe
militar dado no dia 28 de junho. Nenhum país reconheceu o governo
golpista e a maioria retirou os embaixadores de lá. Os Estados Unidos,
principal parceiro comercial do país caribenho, cortaram parte da
ajuda, a OEA (Organização dos Estados Americanos) suspendeu o país da
instituição e a ONU (Organização das Nações Unidas) aprovou resolução
unânime exigindo a volta de Zelaya.
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