Quem anda nas ruas movimentadas de Xangai, cercada por arranha-céus e lojas internacionais por todas as partes, talvez imagine que a cidade seja unicamente o símbolo de força econômica da China. Não é. Xangai tem construído ao longo dos anos uma história de credibilidade política junto a Pequim. Prova do prestígio alcançado com o governo central é o status de província que a cidade adquiriu e uma certa autonomia governamental.
De volta aos eventos de 1989, mesmo distante mais de mil quilômetros das agitações estudantis de Pequim, a cidade teve um papel fundamental no desfecho daquelas manifestações, que resultaram no massacre da Praça da Paz Celestial.
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Jiang Zemin era o prefeito de Xangai desde 1985. Diante de um clima de inquietação, não teve dúvidas: agiu rápido para evitar manifestações. Enquanto Pequim passou sete semanas em negociação, Zemin não deixou que Xangai virasse palco de protestos.
A ação rápida do então prefeito foi bem vista pelo presidente Deng Xiaoping, que o nomeou secretário-geral do PCC (Partido Comunista Chinês). Em geral, quem ocupa esta cadeira tem grandes chances de se tornar presidente do país, o que aconteceu em 1993, quando Zemin foi eleito pelo Congresso Nacional do Povo.
Exceção no contexto chinês
Para a pesquisadora e historiadora Kerrie MacPherson, da Universidade de Hong Kong, a cidade sempre foi pioneira, seja na política, economia ou urbanização.
Vale lembrar que o primeiro Congresso Nacional do Partido Comunista Chinês, em julho de 1921, teve a cidade como sede. Hoje o local dá espaço a um museu na charmosa área de Xintiandi, que recria com estátuas de cera Mao Tse-Tung e seus companheiros.
Autora de inúmeros livros e publicações sobre o desenvolvimento da cidade, MacPherson acredita que Xangai conquistou ainda mais êxitos, além do prestígio político.
“Em termos de ser um motor de crescimento econômico, [a cidade] é um sucesso. Em termos de internacionalização, Xangai tem historicamente sido uma exceção no contexto da China. Em termos de lidar com problemas de crescimento populacional – habitação, saúde, saneamento básico, a cidade foi quem deu os primeiros passos rumo ao avanço”.
Construção de uma megalópole
No início da década de 1990, Xangai focou toda sua atenção no desenvolvimento econômico. A favorável localização portuária ajudou no projeto de tornar a cidade um exemplo do que a China quer ser. A construção da área de Pudong, onde está a torre de TV (Oriental Pearl Tower), ícone da cidade, se tornou um sucesso de empreendimento.
“Ninguém acreditava no projeto da nova área de Pudong, mas ao final o plano se mostrou amplamente bem-sucedido”, diz MacPherson.
Em 2005, Xangai já era o maior porto do mundo em números de cargas. Só no ano de 2007, foram 560 milhões de toneladas.
Desde então, a cidade tem atraído milhares de estrangeiros que querem fazer negócio com a China.
Cecilia Oliveira, 26 anos, é uma dos quase 20 milhões de moradores da cidade. A jovem franco-brasileira, que já estudou na França, Suíça e Portugal, está em Xangai há oito meses e ocupa um cargo de gerência em um luxuoso hotel da cidade.
“Xangai é hoje uma cidade do mundo, internacional. Aqui você tem milhares de opções pra tudo. Dá pra sair todo dia e fazer algo diferente, conhecer gente diferente. Até pela história que tem, você percebe a abertura da cidade”.
História
De fato, a história de Xangai ajuda a entender melhor sua diferença do resto da China. A pequena vila de pescadores e mercado têxtil já tinha inclinação ao comércio desde o século XIX, por causa da localização privilegiada, perto do mar. Em 1842, a cidade abriu seu comércio para o mundo.
Os primeiros anos da Revolução Comunista, em 1949, colocaram um temporário fim ao desenvolvimento mercantil, recuperado depois, com a abertura da economia chinesa.
Xangai tem várias áreas de concessões. Quando a China perdia alguma disputa internacional, era uma parte da cidade que era tomada por estrangeiros. Por isso, a cidade tem hoje uma arquitetura variada.
“A impressão que tem quem vive aqui é que Xangai não é a China de verdade. Se você viaja para o interior, alguns quilômetros daqui, daí sim, você vê a China”, diz Cecilia.
Xangai hoje
O desenvolvimento econômico bem sucedido da cidade tem ajudado a lançar ainda mais nomes locais na política nacional. É consenso geral que Xangai é hoje uma escalada política para a presidência do país.
Xi Jinping, atual vice-presidente da China, não nasceu na cidade, mas consolidou sua carreira política aqui. Conhecido por suas políticas liberais, mãos de ferro contra a corrupção e sua inclinação às reformas políticas, ele é hoje visto como o candidato com mais chances para um dia dirigir o país.
Para MacPherson, nada disso é surpresa: “Os moradores de Xangai cresceram junto com a cidade. Eles compartem histórias, memórias, problemas e sucessos. Eles se modernizaram antes do resto da China e fizeram que o país se conectasse com o ‘mundo lá fora’. Se as pessoas de Xangai são diferentes, se destacam, é porque elas são um microcosmo da nação”.
Veja imagens da manifestação em Hong Kong pelo aniversário do massacre da Praça da Paz Celestial-EFE:
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