Em uma passagem rápida por sua terra natal, Vincent Moon, cineasta francês que ficou conhecido por seu site La Blogothèque e seus vídeos musicais dos Concerts à emporter, conta ao Opera Mundi sobre seus dois últimos anos de viagens ao redor do mundo, responsáveis pela criação do selo nômade Petites Planètes.
Vincent, ou Mathieu Saura, de 32 anos, seu verdadeiro nome, deixou as chaves de seu apartamento na caótica babel que é o bairro popular de Belleville, no norte de Paris, e foi escutar sons de outras partes do mundo. Depois de passar por Europa, Estados Unidos e África, chegou à América do Sul. Entre novembro de 2010 e março desse ano, esteve no Brasil. “Me interessei mais por grandes senhores como Tom Zé e José Domingos. A cena brasileira atual tem muita coisa. Também gosto da Alessandra Leão e adoro Siba e a Fuloresta, o melhor músico brasileiro do momento”, afirmou.
Daniel Correia
Vincent Moon não encontra fronteiras em sua exploração musical
Planeta Brasil
São Paulo, cidade que defende como sendo a menos conservadora culturalmente, foi seu ponto de partida para conhecer o país. Rio de Janeiro, Belém, Brasília, Recife, Salvador e São Luiz também estiveram no roteiro. “Fiz filmes com Gaby Amarantos, Thiago Pethit e Thalma de Freitas. E me interessei mais pela música tradicional e a música religiosa do candomblé e da umbanda”.
Veja os vídeos de Vincent Moon em sua página no You Tube.
Mas foi Tom Zé quem estampa o primeiro volume da Petites Planètes.
Tom Zé
Para o cineasta, o Brasil está isolado do resto da América do Sul. “Todos os brasileiros com quem encontrei conheciam muito mal o resto do continente. Já quando estava na Argentina ou Colômbia, as pessoas também não conheciam o Brasil. A gente sente que isso está mudando, pois os países da região começam finalmente a se comunicar culturalmente”, diz.
A coleção se apresenta como experimental e híbrida pela presença de artistas de diferentes influências. “Pela primeira vez fui confrontado com músicos mais velhos. Falei com Gilberto Gil, mas ele não estava interessado. Filmei com Ney Matogrosso e com Elza Soares, mas foi muito difícil convencê-los. Afinal, por que eles fariam isso? No ponto em que estão em suas carreiras isso não lhes ajudaria em nada, o filme não vale como ferramenta de promoção. Por isso, foi preciso convencê-los sobre o lado artístico do projeto”, revela.
Uma câmera na mão e uma ideia na cabeça
R.E.M, Arcade Fire, Beirut e outros grupos de renome participaram do projeto, financiado graças a doações e colaborações de amigos. Todos os filmes são disponibilizados na internet para download, sob a licença Creative Commons.
“Muitas pessoas pensam que há uma grande produção por trás, que eu tenho uma vida boa e muito dinheiro. Na verdade, eu não ganho dinheiro, mas estou em uma posição que me interessa, a de experimentar”, afirma Vincent. Ele lembra que trabalha sem equipe e só conta, às vezes, com a ajuda de um amigo para captar o som.
Carlinhos Brown
Como percorrer o mundo sem financiamento? Desde o início da Blogothèque, em 2006, já foram produzidos mais de 200 filmes e outros estão a caminho. Atualmente, na Turquia, ele trabalha com músicos do Mar Negro para seu label e, até o final do ano, deve estar filmando na Indonésia.
José Domingos
“Para mim, os filmes cada vez mais abrem portas. As pessoas me convidam para muitos lugares. Nas viagens, nunca pago os bilhetes de avião. Me convidam para tal lugar e, em seguida, me hospedo na casa das pessoas que gostam dos meus filmes. Eles me convidam para restaurantes. Eu só ganho dinheiro em projeções e conferências. É pouco, mas suficiente para mim”, afirma.
Se o dinheiro é detalhe para Vincent, que vive apenas com uma mochila e se define como nômade, as pessoas valem ouro. “Em São Paulo, por exemplo, ouvi muita coisa, encontrei gente, fui a shows e, aos poucos, fui vendo que gostaria de fazer um filme com tal pessoa. É uma pesquisa longa e intensa. Eu preparo, mas sem definir o filme por antecipação”, explica.
Por muito tempo, ele não teve nem câmera. Foi com o equipamento de um amigo que rodou seu primeiro vídeo. “Somos mal preparados, mas isso é bom. Te deixa aberto ao imprevisto. É algo que sempre gostei e que eu guardo na minha maneira de fazer filmes hoje. É completamente amador e eu acho isso ótimo”, acrescenta.
O importante é fazer
O mapa sonoro que vem criando não tem servido apenas para responder a jornais e revistas do mundo todo. Tendo a web como vitrine, bandas fora do grande circuito ganharam visibilidade pela sua lente.
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Vincent fica pouco à vontade para reconhecer que uma linguagem visual que leva sua marca, com abordagem intimista e locações inusitadas, influencia a produção de outros vídeos musicais. Projetos brasileiros, como o Show Mambembe e o Música de Bolso, se inspiram nas ideias do parisiense. “É verdade que houve uma verdadeira repercussão. É legal, mas depois espero que as pessoas façam outras coisas”, diz, surpreso com a recente notoriedade que descobriu na América do Sul.
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O ex-aluno de fotografia, que afirma não acreditar no que se aprende nas universidades de cinema, hoje é convidado para dar palestras nessas mesmas instituições. Elétrico e boêmio, ele exerce certa rebeldia e idealismo. Em sua abordagem visual, tenta provar que é possível viver e produzir sem fazer parte do convencional esquema capitalista. “Eu não vejo filmes, isso não me interessa. Eu não escuto tanta música também, viajo e encontro pessoas. É isso que me inspira, uma caminhada na rua”, responde inquieto.
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