O Peru aprovou esta semana um decreto que classifica a transexualidade e outras identidades de gênero como doenças mentais. A determinação, que tem a assinatura da presidente Dina Boluarte, atualiza o Plano do Seguro de Saúde Essencial e a lista de doenças e intervenções asseguradas. O decreto gerou polêmica em todo o país e vários grupos de direitos LGBTQIA+ protestaram
Para compreender a tensão entre a comunidade LGBT e o governo do Peru, é preciso entender que o Executivo reformulou o Plano Essencial do Seguro Saúde com base na décima versão da Classificação Estatística Internacional de Doenças, conhecida como CID-10. Este documento classifica a transexualidade e outras identidades de gênero como doenças mentais, mas ficou ultrapassado em 2022, com a criação da CID-11, que retirou a classificação.
Para Rodrigo Flores, porta-voz do Más Igualdad Peru, o decreto incentiva ainda mais a estigmatização da comunidade trans no país. “A associação tem recebido diversas reclamações e notícias de pessoas que denunciam que, em seus locais de trabalho ou em algum estabelecimento, estão dizendo: ‘O Estado diz que você está doente, que você está desorientado”, afirmou.
Terapias de conversão
A medida inclui as identidades de gênero como “patologias consideradas seguráveis”, o que poderia facilitar o acesso aos serviços de saúde para pessoas trans, que já têm de lidar com muitos problemas relacionados com o Documento Nacional de Identidade. Mas para o ativista, o decreto abre espaço para mais discriminação, como as terapias de conversão.

Para Rodrigo Flores, porta-voz do Más Igualdad Peru, o decreto incentiva ainda mais a estigmatização da comunidade trans no país
“Abre-se a porta para que práticas e terapias de conversão sejam realizadas e validadas”, teme Flores. A associação realiza pesquisas sobre o assunto. “Agora estamos em processo de lançamento da sua segunda versão, onde podemos constatar o que já está confirmado por dados: há muitos relatos de pessoas que afirmam ter sido submetidas a práticas de conversão, muitas delas envolvendo violência física ou psicológica, tratamentos degradantes etc, e em muitos casos isso também ocorre quando são menores de idade”, explica Flores.
Grupos de direitos humanos afirmam que o Ministério da Saúde deveria ter consultado as entidades antes, e assim teria evitado os protestos que estão sendo organizados por instituições como o Colectivo Marcha del Orgullo.
“Neste momento, estamos nos organizando e também convocando toda a população LGBTQIA+ e defensores de direitos humanos para este 17 de maio, que, paradoxalmente, é o Dia Internacional da Luta contra a Homofobia, Lesbofobia e Transfobia”, indica Jorge Apolaya, representante do coletivo. “Convidamos a todos a reagir a essas ações do Ministério da Saúde”,
As organizações de direitos LGBTQIA+ pedem que o governo peruano volte atrás na decisão e adote a CID-11 o mais rapidamente possível. Enquanto isso não acontece, elas afirmam que vão continuar a pressionar nas ruas, com manifestações.