Apesar de, nas últimas semanas, pesquisas de intenção de voto terem indicado uma diminuição da margem de votos entre o recém-eleito presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e o candidato opositor, Henrique Capriles, os resultados da eleição de domingo (14/04) surpreenderam. Estudos das consultoras mais confiáveis do país apontavam que a diferença de votos variaria de seis a oito pontos percentuais, quando no resultado final foi de apenas 1,77, segundo o último relatório do CNE (Conselho Nacional Eleitoral), com a quase totalidade da apuração concluída.
Segundo analistas consultados por Opera Mundi, um dos fatores que impactou na diminuição da margem de votos foi o tempo transcorrido após a morte do líder venezuelano Hugo Chávez. Apesar de afirmar que não se poderia esperar que Maduro tivesse a mesma quantidade de votos que o falecido presidente recebeu em outubro do ano passado, o analista político Alberto Aranguibel reconhece que o tempo de campanha pode ter impactado na aprovação do candidato governista.
“A campanha foi muito curta se a ideia era apresentar Maduro como candidato”, afirma, explicando que devido à campanha das eleições anteriores, na qual Chávez foi reeleito, Capriles já era tinha sua imagem de candidato consolidada, entre a população. “Maduro exerce o papel de candidato há apenas 15 dias, contra Capriles que vem percorrendo o país há dois anos. Isso pesa muito em uma campanha eleitoral, conhecer o candidato e suas propostas”, diz.
Por outro lado, Aranguibel considera que a campanha foi muito longa para apresentar Maduro como o sucessor indicado por Chávez. “Se fosse uma campanha imediata, após a morte do presidente, ele teria ganhado com muitíssimo mais vantagem, esse impacto na sociedade teria uma tradução automática em votos”, afirma, esclarecendo que transcorridas várias semanas, há uma diluição da comoção pelo falecimento do líder venezuelano.
O analista Luis Vicente León, presidente do instituto Datanálisis, concorda que o distanciamento da data de morte de Chávez seja um fator de influência nos resultados eleitorais. “As pesquisas já mostravam uma diminuição da margem, devido a um desgaste do impacto emocional após a morte do Chávez. A partir daí a campanha se voltou para os candidatos”, explicou, ressaltando que Maduro não é um candidato tão atrativo e carismático para a população, como acontecia com Chávez.
Agência Efe
“Foi uma campanha mal pensada, fazendo com que ele não aparentasse ser nem o Chávez nem o próprio Maduro. Ele era um clone sem carisma de Chávez e não conseguiu conectar os eleitores independentes, que Chávez conseguia convencer”, analisou, em relação à migração de votos para o candidato opositor. Para Aranguibel, a capacidade de comunicação do ex-líder venezuelano com a população, sem formalismos, fazia com que os venezuelanos votassem em candidatos designados por ele “apesar de críticas” a alguns aspectos da gestão, principalmente em âmbito regional.
De acordo com ele, a ausência de Chávez faz com que haja uma “alteração do sentido natural” de eleitores que, em apoio ao líder, deixavam algumas reivindicações em segundo plano, e que nesta campanha passaram a observar mais os candidatos. Segundo Aranguibel, a vitória de Capriles em Estados como Bolívar e Anzoátegui, que mostravam apoio a Chávez, se explica pela restauração da crítica e descontentamento em relação a deficiências de administrações regionais aliadas ao governo nacional. “Em geral se votava por Chávez e não por uma figura particular”, afirma.
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A ausência de Chávez determina essa reversão, que faz com que Maduro passe a ser avaliado em função de sua capacidade para dar continuidade à revolução, explica o analista, afirmando que o próprio perfil de Maduro não é comparável ao antecessor, que segundo ele, além de carisma, estava em sintonia com as expectativas da população: “Ele soube ler as aspirações, as necessidades do povo, trabalhou e construiu o seu discurso político, mas não só isso, porque o concretizou”.
Para León, Maduro tem uma governabilidade “mais frágil”, além de escassa capacidade para fazer com que os venezuelanos posterguem suas expectativas. Segundo ele, outro fator que determinou a diminuição da margem de votos entre Capriles e Maduro foi a campanha da MUD (Mesa de Unidade Democrática), aliança do candidato opositor. “À diferença da campanha de outubro, Capriles pôs na mesa os problemas do país e os atribuiu ao governo. Seu discurso tinha sido mais moderado em outubro”, analisa.
Aranguibel, por outro lado, considera que os votos dirigidos a Capriles não são para o candidato, mas para a opção anti-chavista. “O bloco opositor é conformado por partidos heterogêneos, às vezes tantos que chegam a ter ideias opostas. Cada partido de direita sozinho não tem mais de 3 a 5% de apoio do povo. Por isso se unem, porque sozinhos não significam nada”, atesta.
Em sua opinião, o fato de Capriles ter decidido aparecer somente uma vez na cédula de votação, sob a sigla da MUD, e Maduro ter mantido todos os partidos da aliança chavista, teve peso na votação. Na eleição passada, todos os partidos da MUD apareciam na cédula, fazendo com que a foto de Capriles aparecesse mais vezes do que a de Chávez. “É uma estratégia que concentra a atenção do eleitor e gera um impacto visual, que contribui com a ideia de unidade”, diz.
Futuro
Quando questionado sobre os rumos da denominada “Revolução Bolivariana”, Aranguibel afirma que é preciso revisar o trabalho político com a população, pensando a construção ideológica nas bases do partido. “Esta é uma etapa de transição muito difícil, ainda não chegamos a um modelo de igualdade e justiça, não se pode decretar isso. É preciso trabalhar para a construção de um ideário coletivo acerca do significado da revolução, fazendo uma leitura das bases”, afirma.
Segundo ele, é necessário atuar para que a revolução iniciada por Chávez não perca apoio. “Se não há um trabalho ideológico sólido, consistente, com um discurso só para os pobres, as pessoas se despopularizam, principalmente num processo de ascensão do poder aquisitivo e de maior acesso aos serviços”, explica. “Talvez sobrem dissabores e aspirações populares, e haja pouco trabalho político”.