A última sessão da CoP 15 durou mais de 24 horas. Chegamos na quinta-feira passada de manhã e saímos de lá na sexta à tarde com a certeza de que demos um enorme passo atrás, não pelo teor do documento que foi semi-aprovado, mas pela perda de confiança entre as partes em virtude de um processo pouco transparente e, por vezes, autoritário.
É comum que as negociações, em algum ponto, dependam de acordo político em níveis elevados. A diferença em Copenhague foi que a agenda ficou travada praticamente no primeiro item, que tratava do compromisso de redução de emissões dos países desenvolvidos para o segundo período de Quioto, único instrumento legalmente vinculante entre as partes dentro da convenção do clima da ONU (UNFCCC). Dessa forma, a tarefa política foi dificultada, pois não havia consenso entre os negociadores e especialistas que pudesse suportar um acordo.
Pouco aconteceu do início da CoP até quarta-feira (17), quando chegaram os chefes de Estado e, por meio de um grupo de 25 países, dos quais 14 em desenvolvimento, denominado “amigos do chair”, desenharam um documento de conteúdo político que tratava de dar continuidade dos mecanismos de mercado, do financiamento de mitigação e adaptação e de perseguir o aumento na temperatura do planeta não superior a dois graus Celsius, aspecto amplamente contestado por nações que afirmavam que isso significaria seu desaparecimento.
A posição do Brasil e da maioria dos países em desenvolvimento era a favor do documento Acordo de Copenhague, não por convicção, mas por acreditar que era melhor esse passo que nada. Era evidente que não haveria consenso. Os países em oposição ao Acordo de Copenhague, Venezuela, Bolívia, Cuba e Nicarágua, principalmente, expressaram sua indignação pela forma como o documento foi concebido e também desacordo com seu conteúdo. A única forma de aceitar esse documento, por esses países, era classificá-lo como informativo ou miscelânea, o que significava que não teria caráter de decisão, mas de expressão de vontade das partes que o produziram e de que aquilo seria considerado em futuras discussões.
Lambança
Esse documento foi acatado pela mesa e submetido à plenária, que teria 60 minutos de recesso para avaliá-lo, para que então fosse tomada uma decisão. O desacordo era evidente. Ainda assim, a mesa, liderada pelo primeiro-ministro dinamarquês, fez “lambanças” como, por exemplo, contar e nomear os países em oposição ao acordo na tentativa de definir por votação o resultado, sendo que não há mecanismo alternativo ao consenso nesse tipo de reunião na ONU.
Após o rechaço, e a pedido da delegação do Reino Unido, a mesa tentou aprovar o texto por quatro vezes durante a madrugada, causando indignação e aumentando o atrito entre as partes. Como resultado, que só veio depois da substituição do presidente da mesa, foi aprovado o Acordo de Copenhague, já disponível no site da UNFCCC, e os mandatos dos grupos de trabalho, estabelecidos há dois anos em Bali, foram estendidos para a próxima CoP, no México.
O sentimento que fica é que pode ser interessante promover um encontro intermediário, antes do México, assim que o Congresso dos EUA tenha criado as condições para um instrumento legalmente vinculante. O trabalho será difícil, pois as agendas não convergem. E agora, além disso, a confiança entre as partes foi dilacerada em virtude de um processo mal conduzido.
Felipe J. Bottini, economista pela USP com especialização em
sustentabilidade pela Harvard Extension School e sócio da Green Domus
Desenvolvimento Sustentável, escreveu este artigo para o Opera Mundi.
NULL
NULL
NULL