Wikicommons
Nikos Anastasiadis, presidente cipriano, teria adiado debate e votação no Parlamento sobre medidas extraordinárias
O presidente do Chipre, Nikos Anastasiadis, justificou neste domingo (17/03) a decisão de impor até 9,9% de impostos depósitos privados e restringir transferências bancárias com o argumento que na reunião do Eurogrupo teve que escolher entre a quebra dos principais bancos e uma solução “que não queríamos”, mas que levará à saída da crise.
O debate no Parlamento e votação para aprovar a medida foi adiado deste domingo para a tarde de segunda-feira (18/03). Segundo a agência de notícias estatal Cyprus News Agency, foi o próprio presidente que pediu o adiamento, sem detalhar os motivos. A decisão enraiveceu também parlamentares, o que supõe dificuldades para aprovação entre os 56 assentos.
De acordo com a Associated Press, os donos de depósitos serão compensados com ações dos bancos, mesmo que valendo pouco. Averof Neophytou, vice-presidente do governista e cristão-conservador Partido Democrático do Chipre, afirmou que existem esforços para compensar essas ações com reservas de petróleo recém descobertas, ainda que as extrações estejam no longo prazo.
Em discurso televisado, Anastasiadis assinalou que após assumir um Estado em quebra há duas semanas, na sessão do Eurogrupo de sexta lhe colocaram, como se fosse uma chantagem, duas soluções: a quebra ou o perdão da dívida. Em nenhum outro pacote de ajuda internacional anterior havia sido criada uma taxa sobre os depósitos bancários.
Em sua mensagem, carregada de dramatismo e na qual falou da pior crise do país desde 1974 – ano da invasão turca do norte da ilha -, o líder conservador ressaltou que a segunda opção será definitivamente a menos danosa, por tratar-se de uma alternativa controlável “que levará à estabilidade da economia e ao crescimento”.
Anastasiadis prometeu que o imposto extraordinário que deverão pagar os depositários será aplicado uma única vez e que será possível recuperar a metade da soma submetida ao encargo.
“O Estado devolverá aos depositários que mantenham seus depósitos por um período superior a dois anos a metade de sua contribuição em bônus de futuras receitas pelo gás natural”, declarou em alusão ao carburante que projeta extrair nos próximos anos nas águas do Mediterrâneo.
NULL
NULL
O presidente do Parlamento europeu havia pedido a revisão da taxa para proteger os pequenos poupadores, mas Anastasiades afirmou que recusar o pacote de resgate significaria o colapso dos bancos do país e a perda de todos os depósitos dos poupadores.
De acordo com o ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, militares servindo no Chipre e bancos cipriotas na ilha britânica não serão afetados pela decisão.
Rússia
Acredita-se que os líderes da zona do euro, particularmente na Alemanha, insistiram na taxa sobre os depósitos por causa da grande quantidade de capital russo depositada nos bancos do Chipre, o que levantou suspeitas de lavagem de dinheiro.
Os poupadores russos temem perder pelo menos US$ 2 bilhões com o perdão da dívida do Chipre. As medidas prejudicam os interesses da Rússia, cujas economias na ilha se estimam oficialmente em US$ 20 bilhões, segundo denunciou neste domingo o líder de uma patronal bancária russa, Anatoli Aksákov.
Os russos, de fato, aglutinam mais da quinta parte de todos os depósitos nos bancos da ilha, que somam um total de US$ 91,5 bilhões, segundo dados oficiais. Alguns analistas vão além e apontam que as economias dos cidadãos russos na ilha mediterrânea alcançam os US$ 35 bilhões.
Efe
Cripriotas retiram dinheiro de um banco na capital, Nicósia, dois dias antes da decisão sobre impostos e restrição de transferências bancárias
A remissão imposta por Bruxelas transformou em realidade um dos piores augúrios assinalados na semana passada pela agência de qualificação de riscos Moody's, que antecipou em um relatório que os bancos russos poderiam perder até US$ 50 bilhões caso o Chipre decida recortar drasticamente sua dívida. A agência advertia, entre outras coisas, que, em caso do congelamento dos depósitos e seu uso para repartir a carga financeira de um resgate, as empresas russas sofreriam perdas e não poderiam repatriar seu dinheiro, algo que repercutiria de forma direta em sua capacidade para enfrentar seus compromissos de pagamento na Rússia.
Alheio a este inesperado giro na crise cipriota, o governo russo tinha preparado seu próprio pacote de exigências a Nicósia às vésperas de que o ministro das Finanças cipriota, Michalis Sarris, chegue a Moscou para negociar um novo programa de ajuda financeira ao Chipre.
O titular de Finanças russo, Antón Siluánov, havia antecipado na sexta-feira passada que Moscou pedirá a Nicósia informação sobre as contas dos cidadãos e empresas russas a fim de legalizar capitais não declarados em origem.
Perante a nova situação, Aksánov, presidente da Associação de Bancos Regionais da Rússia, ressaltou que a remissão de dívida prejudicará a economia russa, já que a ilha é o primeiro investidor estrangeiro na Rússia, paradoxalmente graças ao dinheiro russo que se refugia em sociedades offshore cipriotas (fora das fronteiras do país).
O também deputado do partido governista Rússia Unida e vice-presidente do comitê parlamentar de Finanças assegurava ontem que o Executivo russo “deve ajudar o Chipre, porque é o principal investidor estrangeiro em nossa economia”.
Enquanto isso, o vice-presidente da Associação Rússia, Aleksandr Jandrúyev, propôs condicionar um novo crédito de Moscou a Nicósia a que a remissão de dívida não seja aplicada em toda sua medida aos depósitos russos. “Acho que se poderia propor que a Rússia conceda ajuda financeira ao Chipre em troca que este imposto (extraordinário) não seja aplicado em sua totalidade ou seja adiado um tempo” para os poupadores russos, disse em declarações ao canal de televisão Rossiya 24.
Segundo dados do Banco Central russo, em 2011 o Chipre se situou como primeiro destino na fuga de capitais da Rússia, ao mesmo tempo em que também liderou o âmbito dos investimentos estrangeiros neste país, com mais de US$ 13 bilhões.
“Agora a confiança no Chipre como lugar para depositar dinheiro será rompida”, lamentou o presidente da Associação Rússia, a quem parece óbvio que os europeus não guardavam suas economias no pequeno país mediterrâneo e que o resgate privado imposto por Bruxelas será pago com o dinheiro dos russos e cipriotas.
Como se não bastasse, os bancos russos aprovaram créditos por um montante de até US$ 40 bilhões às sociedades offshore do Chipre, segundo a Moody's. Outros US$ 12 bilhões estão nas contas das filiais que os bancos russos têm na ilha.
* Com informações de Efe e AFP