O uso da Inteligência artificial (IA) pelos Estados Unidos para vigiar a fronteira com o México deixa moradores da região preocupados. O tema da imigração ilegal no país é central na campanha para as eleições presidenciais de novembro.
Em abril de 2023, Alejandro Mayorkas, secretário de Segurança Interna dos Estados Unidos, criou uma equipe especial encarregada da inteligência artificial. “Estamos procurando implantar a IA para controlar melhor as cargas, identificar bens produzidos por trabalho forçado e gerenciar riscos. Nós vamos ver como usar essa tecnologia para detectar melhor o transporte do medicamento fentanil”, declarou na ocasião.
Uma das principais funções da IA é calcular o peso e a massa com base no que é declarado e detecta anomalias na carga dos caminhões, mas não apenas isso. Essa tecnologia também é utilizada para identificar movimentos detectados por câmeras automáticas em torres de vigilância. Ela também analisa se esses movimentos são de animais selvagens, gado, veículos de guarda de fronteira ou deslocamentos fora do comum de veículos, que poderiam ser migrantes tentando entrar discretamente nos Estados Unidos, ou de coiotes.
As novas ferramentas de vigilância baseadas na IA não deixam os habitantes da região, nem os proprietários de terras fronteiriças, tranquilos. Mariana Trevino Wright dirige o National Butterfly Center, localizado em Mission, nos arredores de McCallen, na fronteira entre o Texas e o México. O centro possui terras que margeiam o Rio Grande.
“Entrei na sala de controle da Guarda de Fronteira estacionada em McAllen, onde os agentes trabalham com as câmeras dessas torres e outras tecnologias ali presentes. Essas câmeras observam 360°, dia e noite. Eles possuem sensores que analisam movimentos em um raio de 10 km. As torres estão na fronteira. Eles podem ver facilmente o que está acontecendo no México”, observa Mariana Trevino.
Pelo menos 300 torres de vigilância instaladas
Estas novas torres automáticas são alimentadas por painéis solares, o que garante sua autonomia. Na maioria das vezes, estão localizados em terras particulares ou em reservas indígenas, onde há poucos agentes de fronteira. Existem pelo menos 300 torres de vigilância deste tipo, instaladas desde a costa da Califórnia, no oeste do país, até ao extremo leste do Texas, segundo a Electronic Frontier Foundation, que as identificou.
Mas para o secretário de Estado Alejandro Mayorkas, sua utilização é equilibrada e ponderada. “Nosso departamento usará a inteligência artificial para proteger nossa pátria de forma responsável. Ao mesmo tempo, garantiremos que a utilização da IA seja rigorosamente testada para evitar preconceitos e impactos discriminatórios. Garantiremos também que esta utilização seja facilmente compreensível para os nossos cidadãos”, insiste o secretário de Estado.
Segundo seus fabricantes, as torres podem ser programadas para não registrar movimentos no México, nem analisar o que está acontecendo em residências particulares.
Mas as pessoas que moram perto da fronteira não estão convencidas de que suas vidas não estejam sendo registadas. “Você é totalmente monitorado, registrado e analisado. Há uma rede digital ao longo de toda a fronteira, que registra os endereços IP dos telefones ou computadores que você tem. Os guardas da fronteira admitiram já ter implantado e utilizado esta tecnologia contra cidadãos americanos durante protestos, após a morte de George Floyd, em Minneapolis. E isso acontece todos os dias na fronteira!”, garante Mariana Trevino Wright.
Cães robôs capazes de verificar anomalias
Outra tecnologia, que poderia representar o último passo na automatização da vigilância das fronteiras, são os cães-robôs. Capazes de verificar anomalias detectadas por inteligência artificial, eles poderão transmitir dados ou vídeos de localização, em paralelo com drones já pilotados por agentes federais.
“As autoridades nunca irão eliminar as patrulhas humanas, mas os cães-robôs não são ficção científica. Eles foram desenvolvidos e o governo está tentando implantá-los. Seu impacto será o mesmo dos cães usados por milicianos brancos que procuravam escravos fugitivos ou considerados rebeldes nos Estados Unidos. E essas milícias foram dissolvidas há apenas 150 anos”, diz Mariana Trevino Wright.
Em 2022, o presidente mexicano assinou um acordo com a Casa Branca para investir U$ 1,5 bilhão em tecnologias a serem usadas na fronteira.