A repressão, por parte do Estado, contra as polícias comunitárias que se multiplicaram nos últimos meses em diferentes regiões do México foi intensificada nas últimas semanas.
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Em Guerrero, a CRAC-PC (Coordenadoria Regional de Autoridades Comunitárias – Polícia Comunitária) está realizando um contundente protesto contra as instituições estatais e federais, devido à prisão da coordenadora do movimento, Nestora Salgado García, e à desaparição de pelo menos 40 policiais comunitários do município de Ayutla, promovidas pelo exército nos últimos dias. Por esse motivo, em 24 de agosto, cerca de 800 policiais comunitários ocuparam as instalações da prefeitura de Tixtla e desarmaram alguns dos soldados que estavam na região há meses.
Os representantes do movimento não estão dispostos a ceder às pressões do Estado, como confirma Gonzalo Molina, promotor da CRAC em Tixtla: “As ações vão continuar se não liberarem nossos companheiros.”
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Da mesma forma, no estado de Michoacán, a repressão por parte do Estado contra a polícia comunitária está aumentando. No último dia 20 de agosto, dois integrantes da polícia comunitária foram assassinados na cidade de Aquila por agentes da polícia.
Esses fatos, segundo os moradores, seriam a continuação do que aconteceu no último dia 14 de agosto, quando 700 membros do Exército, da Marinha Armada e do Grupo de Operações Especiais da administração estatal agrediram a população de San Miguel de Aquila, desarmaram e prenderam 45 policiais comunitários sem a intervenção dos órgãos jurídicos.
Federico Mastrogiovanni/Opera Mundi
Polícias comunitárias armam população e dividem opiniões no México
A campanha contra eles está sendo posta em prática diretamente pelo governador do estado de Michoacán, Jesús Reyna García, que diz que em Aquila “não existe uma polícia comunitária, mas um grupo armado que luta contra os outros moradores pelo direito à concessão das terras para a exploração das minas de ferro da companhia Ternium”.
Os moradores dessa comunidade explicam que a raiz do conflito, que fez com que formassem um corpo próprio de polícia, é política e tem a ver com a mineradora Ternium, que explora ferro em sua comunidade. A organização da polícia comunitária começou porque o cartel denominado “Os Cavaleiros Templários” começou a extorquir os indígenas da região pela extração de minerais em sua terra, que a mineradora opera há 30 anos sem pagar royalties à comunidade.
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Os moradores de Aquila afirmam que nem o governo estatal nem o federal jamais fizeram nada para impedir a delinquência organizada. “A Polícia Federal foi a única que agiu, ainda que pouco, mas já a tiraram daqui”, informa Homero Bravo, um dos moradores que saíram de Aquila para ver a situação dos detidos e não pôde voltar por causa das ameaças de morte que recebeu. “A existência de uma polícia comunitária que cumpra funções de segurança pública lesiona interesses e põe em evidência a pouca funcionalidade da polícia e das forças armadas.”
Ofélia Alcalá, de San Miguel Aquila, afirma que a empresa Ternium explora uma mina conhecida antigamente como “Las Encinas” e está operando no local há mais de 30 anos através de acordos com os comissionados dos bens comuns. Alcalá denuncia que a comunidade nunca recebeu royalties pela extração do mineral, somente pela ocupação das terras, e obteve alguns empregos temporários.
As complicações começaram quando a comunidade decidiu exigir pagamento de acordo com o volume de material extraído. “Mataram dois comissionados por isso. A comunidade deteve a extração por cinco anos, mas logo a empresa voltou a extrair o ferro sem pagar”, conta Alcalá.
“A única coisa que [os habitantes de Aquila] fizeram foi se unir para se defender do crime organizado e do governo que os afetou. Se o governo não está cumprindo as funções que a Constituição prevê, entre elas a de Segurança Pública, é evidente que os cidadãos podem se organizar em um estado de necessidade, para proteger não apenas suas propriedades, mas também as suas vidas e as de seus familiares”, disse Leonel Rivero, advogado dos moradores presos.
A situação entre o governo federal e as polícias comunitárias, acusadas nos últimos tempos de fazer parte do crime organizado, está mais crítica a cada dia.
É difícil apresentar um quadro unitário, mas o que parece certo é que a organização popular armada está se transformando cada vez mais em uma resposta concreta frente a um Estado incapaz de garantir a segurança e a justiça para os seus cidadãos mais desprotegidos.