O gás lacrimogêneo usado pela polícia para reprimir manifestações em
Santiago foi proibido há uma semana pelo governo. A munição, usada para
dispersar os manifestantes, é fabricada com clorobenzilideno
malononitrilo. De acordo com um alerta feito pela Universidade do Chile,
a substância tem efeito abortivo, provoca infertilidade e aumenta a
agressividade de quem inala o gás.
A proibição do uso da bomba no Chile havia sido anunciada na
quarta-feira da semana passada pelo vice-presidente chileno, Rodrigo
Hinzpeter. Mas acabou sendo suspensa pela Presidência na sexta-feira,
diante da pressão dos partidos de direita e dos comandantes da polícia.
O alerta sobre os riscos do clorobenzilideno malononitrilo foi
feito pelo médico Andrei Tchernitchin, da Faculdade de Medicina da
Universidade do Chile. Ele reconheceu, entretanto, que suas conclusões
“não são definitivas, precisam ser aprofundadas, mas já indicam que os
riscos são reais e as sequelas, irreversíveis”.
O gás, entretanto, é o mesmo usado amplamente por forcas policiais
de todo o mundo. Forças de Paz da ONU, como as que estão presentes hoje
no Haiti, também utilizam o mesmo produto.
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No Brasil, a maior produtora deste tipo de munição química é a Condor
Tecnologias Não-Letais, de Nova Iguacú, no Rio de Janeiro. Em seu
endereço na internet, a empresa apresenta, no alto da página, um
logotipo das Nações Unidas, recomendando seus produtos. “Vendemos
lacrimogêneo para praticamente todas as polícias do Brasil e garantimos
que, seguidas as especificações quanto ao manejo e as concentrações
adequadas, o produto não apresenta riscos à saúde”, disse a Condor por
meio de sua assessoria.
Tecnicamente, a preocupação não é apenas com a composição química
da bomba, mas também com a forma como ela é empregada. Grupos de
direitos humanos acusam a polícia chilena de lançar lacrimogêneo de
forma indiscriminada e em quantidade muito superior ao que seria
necessário. Assim, simples pedestres, moradores e os próprios policias
seriam afetados pela exposição ao gás.
No Brasil, a preocupação também está presente. “Existem casos de
morte e invalidez de agentes de segurança pública em alguns Estados do
Brasil, quando estes agentes foram expostos ao produto inadequadamente,
por instrutores pouco qualificados”, disse uma fonte da área de
Segurança Pública do Governo Federal que pediu para não ser
identificada. “É claro que grandes concentrações causam danos imediatos à
saúde de quem foi atingido ou exposto ao agente químico”, explicou.
“Todas as polícias da América Latina compram esse gás”, declarou
Tchernitchin. “Do ponto de vista científico, se há dúvida sobre a
segurança de um produto, ele deveria, por prudência, ser mantido fora
das ruas em todos estes países”, advertiu.
É comum no Chile que os Carabineros disparem jatos de água nos
manifestantes. Além de provocar ardência nos olhos e irritar as vias
respiratórias, o gás lacrimogêneo dá a sensação de queimadura química ao
entrar em contato com a pele molhada, o que caracterizaria um uso
sádico da força.
Suspeita de morte
As bombas de gás lacrimogêneo usadas no Chile são importadas de
Israel, onde, desde janeiro, as forças de segurança estão sendo acusadas
de provocar a morte do cidadão palestino Jawaher Abu Rahmah, por
inalação de altas concentrações do mesmo gás.
Em 2004, um estudo científico publicado por médicos do Exército
Israelense assegurava que, para ter efeito letal, o gás deveria ser
inalado numa concentração 800 a 5.600 vezes maior do que o normalmente
encontrado em situações de distúrbios de rua.
Alguns pesquisadores, entretanto, chamam a atenção para o fato de
grupos anti-motim usarem disparadores de granadas de gás capazes de
lançar até seis munições como esta de uma única vez, o que poderia
provocar uma alta concentração do produto num mesmo local, ainda que por
alguns instantes.
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