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Política e Economia

História do Mali é marcada por conflitos separatistas desde o início do século XX

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Da colonização francesa até a guerra na Líbia, conflitos do passado ajudam a explicar crise atual

João Novaes

2013-01-19T12:48:00.000Z

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O mundo passou a olhar com mais atenção para o Mali desde o dia 11 de janeiro, quando o presidente francês, François Hollande, anunciou a entrada da França no conflito interno do país africano após um apelo de emergência feito pelo presidente Dioncounda Traoré.

No entanto, o conflito tem implicações que datam desde o início da colonização francesa, em 1890. Passa por uma série de rebeliões separatistas provocadas pela população tuaregue no início do século XX, envolve a guerra civil líbia em 2011 e enfim desemboca no atual conflito, iniciado em janeiro de 2012.

Leia abaixo o resumo dos fatos históricos que contribuíram para o quadro atual.

WikiCommons - O sudão francês
Sudão francês

A colonização francesa sobre o território do atual Mali começou em 1880, tornando-se oficial dez anos depois (1890). Até 1959, foi recortado administrativamente por diversas vezes, passando a receber nomes como “Sudão Francês” (por duas vezes) e “Alto Senegal e Níger”.

Os gritos pela independência ficaram mais fortes a partir do sim da II Guerra Mundial (1945), quando foi iniciado o processo de descolonização do continente. A independência foi finalmente conquistada em janeiro de 1959, com um território federalista chamado Federação do Mali (do qual também faziam parte Senegal, Dahomey (atual Benin) e Alto Volta (atual Burkina Faso). Porém, dois meses depois a iniciativa foi esfacelada, restando apenas Senegal e Mali. Desconfianças militares acabaram por separar os dois definitivamente no ano seguinte. Assim, o Mali passou a adotar o nome, bandeira e território atuais.

Saiba mais sobre os tuaregues e os grupos insurgente que lutam pelo controle do Mali aqui.
Conheça todos os aspectos envolvendo a intervenção francesa no país clicando aqui.

Após a independência, sob o comando de Modibo Keita o país teve oito anos de um regime socialista com partido único e fortes laços com a União Soviética. As tentativas de forma agrária do governo socialista geraram revolta nas tribos tuaregues no norte, que não queriam ceder terras para um governo do qual alegavam não terem sido convidados para fazer parte. Após sangrenta repressão, acabaram derrotados em 1964.

Em 1968, Keita caiu após um golpe de Estado militar organizado por Moussa Traoré. Esse período foi marcado por opressão e instabilidade política, sucessivas tentativas de golpe de Estado, uma forte seca (1968-1974), revoltas estudantis em todo o país e crescente insatisfação na região norte do país.

WikiCommons

Nômades tuaregues em 1907, sendo exibidos durante uma exibição colonial em 1907

O Mali passou por um processo de abertura política na última década do século XX. Os tuaregues do país e do Níger (onde ainda são mais populosos, cerca de 800 mil) tentaram novamente levantes esporádicos, mas volumosos, pela independência de 1990 a 1995. Uma das reclamações dos insurgente era de que eles não tinham acesso a altos postos no Exército. Por fim, um quarto levante entre 2006 e 2008 acabou após novo tratado de paz. Mas essa rebelião ficou marcada pela interrupção da produção de ouro nas montanhas do Níger. Mali e o vizinho Níger acusaram a Líbia de financiar os insurgentes.

Muitos dos atuais insurgentes do MNLA (Movimento Nacional de Libertação de Azawad – nome do território dado ao norte do Mali) lutaram nos dois lados na guerra civil da Líbia em 2011, que terminou com a queda do regime do coronel Muamar Kadafi (1969-2011). Os rebeldes voltaram ao Mali desempregados mas fortemente armados. Oficialmente, o grupo se formou em 23 de outubro de 2011, três dias após a morte de Kadafi.

O conflito atual

De janeiro a abril de 2012, forças separatistas tuaregues comandadas pelo MNLA começaram a atacar as bases militares no norte do país, principalmente nas regiões de Gao, Kidal e Timbuctu. Eles ganharam muito terreno em março, chegando a conquistar cidades sem enfrentar qualquer oposição do governo, afundado em uma crise política.

No dia 22 de março, um grupo de militares comandados pelo capitão Amadou Haya Sanogo depõe o presidente Amado Tumani Touré, alegando “incapacidade” do chefe de Estado em administrar o conflito que se acentuava. O golpe foi condenado pelo Conselho de Segurança da ONU, a União Africana e a Cedeao (Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental). Em 6 de abril, após negociações com os países vizinhos, foi acordado que o país seria governado interinamente por Diounconda Traoré. 

No dia 1º de abril, o MNLA, com a ajuda dos grupos religiosos do Ansar Dine (Defensores da Fé), AQIM (sigla em inglês da Al Qaeda no Magre islâmico) e Mujao (Movimento pela Unidade e Jihad na África Ocidental), tomam finalmente o controle de todo o norte malinês. O primeiro grupo proclama a independência do estado de Azawad seis dias depois, o que é condenado pelo governo de Bamako e pela UA (União Africana). Nenhum outro país reconhece a separação.

Conflitos na aliança insurgente

Em 6 de junho, na cidade de Gao (leste do Mali), a população se manifesta nas ruas contra a imposição da sharia e é violentamente reprimida pelo Ansar Dine. Dois dias depois, militantes das duas milícias entram em confronto armado na cidade, que resulta em duas mortes. Depois de tentativas fracassadas de fusão, ocorre o rompimento definitivo dos dois grupos.

No dia 20 do mesmo mês, o Ansar Dine afirma ser contra a independência de Azawad, e que o objetivo do grupo é a imposição da sharia em todo o Mali. Os confrontos entre os separatistas e os fundamentalistas só se intensificam: em julho, o MNLA perde controle de Gao, Kidal e Timbuctu. O norte do Mali ficou sob o controle da coalizão islâmica.

Em Timbuctu, documentos medievais e construções consideradas patrimônio da humanidade pelas Nações Unidas foram vandalizados. Nas cidades tomadas, a música regional malinesa também foi interditada.

Em outubro, o MNLA retoma controle da cidade de Ménaka, que sofre um grande afluxo de pessoas fugindo das cidades sob controle da coalizão islâmica.

No dia 12 de outubro, o Conselho de Segurança aprovou, por unanimidade, uma resolução proposta pela França para auxiliar o exército malinês e preparar uma intervenção militar que seria organizada por UA e Cedeao, mas ainda sem o envio de tropas, apenas a apresentação de um plano em 45 dias. No mesmo mês, parte de Ménaka foi tomada pela coalizão islâmica. Em Bamako, manifestantes marcham nas ruas pedindo intervenção internacional.

Já em 8 de janeiro, segunda a Al Jazeera, 12 tropas do governo foram capturadas pelos rebeldes na cidade estratégica de Konna, centro do país (700 quilômetros de Bamako). Dois dias depois, a cidade é tomada, o que poderia significar o primeiro passo para o avanço em direção a Bamako. Um grupo de cerca de 1.200 rebeldes avança em direção ao oeste e se aproxima de Mopti.

Durante esse período, Traouré apela ajuda emergencial a Hollande, que no dia seguinte, anuncia a entrada na França no conflito através da Operação Serval. Nos primeiros dias, a ofensiva se concentrou em ataques aéreos, a maioria deles partindo do Chade, ao leste. A intervenção, inesperada, obteve apoio da ONU, União Europeia, União Africana, Cedeao e MNLA.

Agência Efe (16/01)

Tanques franceses participam da Operação Serval no Mali

A Operação Serval já levou ao menos 800 oficiais franceses ao país. Nas próximas semanas, estima-se que o número de tropas francesas no país deve chegar a 1,7 mil, totalizando 2,5 mil oficiais. Entre os dias 12 e 15 de janeiro e nesta quinta (17/01), jatos franceses bombardearam diversas cidades de controle rebelde entre a região norte e o sudoeste do Mali.

Em um congresso realizado por seus líderes, o MNLA adverte o exército malinês para não ultrapassar as fronteiras do que eles consideram sua pátria, mas afirmam que gostariam de negociar futuramente essa questão de forma diplomática com o Mali e a Cedeao. No entanto, só resta aos separatistas o controle de algumas áreas rurais, próximas às fronteiras com Argélia, Mauritânia e Níger.

Na madrugada do sexto dia de intervenção, as tropas francesas, em conjunto com as malinesas, iniciaram as operações e os combates terrestres. Os oficiais contam com tanques e equipamentos típicos do combate de guerra. As tropas terrestres se concentraram nos primeiros dias em cidades controladas pelo governo e próximas dos postos rebeldes

Em uma semana, a ofensiva obteve progressos significantes. Em 18 de janeiro, após dias de batalhas e informações desencontradas, foi confirmada a retomada de Konna pelas tropas do governo, além de Diabali (400 quilômetros de Bamako), tomada por rebeldes cinco dias antes. Um dia antes, foi registrado, em Londres, o primeiro protesto contra a intervenção francesa: um grupo de 60 pessoas em frente à embaixada exigia a retirada das tropas de intervenção sob cartazes de que “a sharia era a única solução para o Mali”.

Crise humanitária

Com a intensificação do conflito, a crise humanitária no país africano se agravou. Segundo estimativas da ACNUR (Agência de Refugiados das Nações Unidas), a crise no Mali deve provocar a fuga de mais de 400 mil pessoas para os países vizinhos e de, pelo menos, 300 mil internamente.

Em alguns países vizinhos ao Mali, foram instalados campos provisórios para abrigar os refugiados. Ao mesmo tempo, a agência da ONU tenta ajudar os que procuram abrigo fora de seu país, enviando especialistas para a região com o objetivo de apoiar a assistência aos refugiados.
 

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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