Discutir a guerra da Síria na fila do café da manhã, aprender sobre o conflito colombiano enquanto escova os dentes ou descobrir o funcionamento das ditaduras africanas surante a preparação para o jantar na cozinha. Situações como estas podem ser inusitadas para a maioria das pessoas, mas são bastante comuns no albergue Welcome, em Madri, capital da Espanha.
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Inaugurado em 2008 pelo empresário Alex Teruel, o estabelecimento possui convênios com diversas ONGs de defesa dos direitos humanos e acolhe dezenas de pessoas que esperam pelo estatuto de refugiado, concedido pelo governo espanhol.
“Nós víamos o fluxo massivo de imigrantes que chegavam à Espanha e os problemas que diferentes entidades denunciavam em relação à situação de alojamento destas pessoas. Por isso decidimos criar um projeto neste sentido”, afirma Teruel.
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Albergue consegue abrigar até 190 hóspedes por vez, entre turistas e imigrantes
Segundo o proprietário, a ideia nasceu em 2005 e demorou cerca de dois anos para se concretizar. No início, Teruel pensava apenas em disponibilizar um alojamento limpo e barato para ONGs como a Cruz Vermelha ou a CEAR (Comissão Espanhola de Ajuda ao Refugiado), mas, depois de algumas reuniões com estas entidades, onde apresentou o projeto do albergue, ele descobriu que também deveria fazer algumas adaptações importantes no estabelecimento.
“Em relação ao tema da comida, por exemplo, tivemos que adaptar o nosso cardápio de acordo com as diferentes tradições ou culturas que temos aqui. Realizamos o Ramadã quase todos os anos e também deixamos de oferecer carne de porco no cardápio. Dependendo da época, tivemos diferentes prioridades, dependendo dos cultos que predominavam no albergue em cada momento. No geral, o [culto] mais abundante sempre foi o muçulmano”, conta o empresário.
Além da comida, o Welcome também busca um padrão diferente de funcionário para lidar diariamente com diferentes línguas e culturas. Teruel conta que todas as pessoas que trabalham no albergue devem dominar o inglês e o francês, idiomas principais dos grupos que chegam ao estabelecimento por meio dos convênios com as ONGs. “Atualmente, estamos treinando os funcionários para que comecem a compreender árabe também”, diz.
Outra mudança no projeto inicial foi a criação de um espaço reservado para o trabalho das ONGs, onde os funcionários destas entidades possam realizar a ajuda administrativa e psicológica dos refugiados. Mas, apesar da existência desta área separada, o albergue estimula a interação entre os turistas que chegam para visitar a capital espanhola e as pessoas que esperam a concessão de refúgio.
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“Recebemos hóspedes de todas as nacionalidades, asiáticos, americanos, australianos, de onde você quiser. Eles não apenas sabem que existem outros hóspedes refugiados, como também interagem com eles. Sempre respondemos perguntas sobre este tema, porque chegamos a ter até 190 pessoas, entre subsaarianos, libaneses, cubanos, colombianos, ucranianos”, explica Teruel.
Imigrantes de extrema vulnerabilidade
“As pessoas que nós temos alocadas ali são solicitantes de proteção internacional, ou seja, eles se encontram em extrema vulnerabilidade”, afirma Maiko Escobar, da Cruz Vermelha de Madri.
Segundo ela, a Cruz Vermelha possui funcionários no albergue para prestar os primeiros cuidados de acolhida a estas pessoas. “Temos trabalhadores sociais, advogados e psicólogos. Dependendo da função da intervenção que seja necessária, se desenvolve um trabalho diferente ali. Há uma etapa de acolhida, de seguimento e de saída”, explica.
Olmo Calvo/Opera Mundi
Os solicitantes de asilo permanecem no albergue até que o pedido de refúgio seja declarado admissível, o que pode demorar até 30 dias. Uma vez que o processo é aceito, os imigrantes são encaminhados a outros centros espalhados pelo país, onde recebem a ajuda do governo e das ONGs até que lhes seja concedido o estatuto de refugiado.
Segundo Teruel, o projeto deu tão certo que agora ele pretende aumentar o número de convênios com ONGs especializadas em diferentes temas: “Já temos acordos com entidades que cuidam de mulheres que sofreram algum tipo de agressão e de pessoas que perderam suas casas por causa da crise. No futuro, queremos facilitar a acolhida de qualquer tipo de pessoa que a necessite”.