A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) avaliará 584 suspeitas de violações de direitos humanos no contexto dos sangrentos protestos na Colômbia. A maioria dos casos está nas mãos do poder público, conforme relatado pela Ouvidoria nesta segunda-feira (07/06).
O povo colombiano vive mais de um mês de sangrentas manifestações que eclodiram em 28 de abril em resposta ao aumento de impostos promovido pelo presidente Iván Duque, decisão depois descartada sob pressão de centenas de milhares de pessoas nas ruas. Como resultado, a Defensoria Pública entregou à Comissão Interamericana de Direitos Humanos um balanço dos casos de violações de direitos humanos registrados durante o período.
“É evidente que este é um contexto em que foram cometidas graves violações de direitos humanos, que temos rejeitado de forma consistente e contundente desde que começamos a registrá-lo”, declarou o defensor público Carlos Camargo, que assegurou na transcrição oficial de seu depoimento perante a CIDH que, de 28 de abril a 3 de junho, foram recebidas 417 denúncias que representam 584 violações de direitos humanos.
“Do total de denúncias recebidas no período de análise, 73% referem-se a membros da força de ordem como supostos responsáveis, e desse percentual 98% são atribuídos à polícia nacional”, relata o texto divulgado à imprensa. Para Camargo, “as violações mais graves se traduzem em 58 casos de supostos homicídios”, em que 45 ocorreram no departamento de Valle del Cauca (sudoeste), onde Cali é a capital.
A ouvidoria também apontou 113 atos de violência de gênero e 3.144 bloqueios de vias públicas que afetaram o abastecimento e a passagem de missões médicas.
“Esta visita [da comissão] à missão é histórica e estamos certos e certas de que é um ponto de partida para podermos dar passos importantes na promoção e proteção dos direitos humanos com base no diálogo e no respeito mútuo”, declarou em entrevista coletiva a presidente da CIDH, Antonia Urrejola.
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Povo colombiano vive mais de um mês de manifestações que eclodiram em 28 de abril contra o governo de Duque
Ataques a jornalistas
Na segunda-feira, a CIDH também se reuniu com a chancelaria e a promotoria. E afirmou que nos próximos dias escutará outras autoridades governamentais, organizações civis, coletivos, sindicatos, vítimas e suas famílias “para receber testemunhos, denúncias e informações”. A entidade também vai recolher dados da Fundação para a Liberdade de Imprensa sobre ataques a 233 jornalistas em que “o agressor mais recorrente são as forças de ordem, a quem se atribui 53,73% dos casos”.
A comissão afirmou que emitirá na próxima semana uma declaração pública com “observações e recomendações” para este “momento difícil”.
Uma missão da CIDH, órgão sediado em Washington e vinculado à Organização dos Estados Americanos (OEA), visitará, entre 6 e 10 de junho, as cidades de Bogotá, Cali, Popayán (sudoeste) e o município de Tuluá (sudoeste), os mais afetados pela crise.
A chegada da comissão coincidiu com o anúncio feito pelo presidente Duque, no último domingo (06/09), em que ele informa ter ordenado “um decreto que modernizará a estrutura orgânica da Polícia Nacional, especialmente para fortalecer a política de Direitos Humanos”, durante cerimônia de promoção da instituição em Bogotá.
Essa reforma buscará que todos “os policiais sejam certificados em direitos e no uso da força”, afirmou o ministro da Defesa, Diego Molano, à AFP. No entanto, ainda que o plano responda ao clamor popular por uma mudança na polícia, o analista Jorge Restrepo, profesor de Economia da Universidade Javeriana, expressou em seu Twitter que a medida é “tardia” porque “chega quando a confiança na instituição se deteriorou e não está articulada com a investigação dos abusos cometidos”.
A organização mais visível dos manifestantes suspendeu as negociações que vinha mantendo com o governo desde o início de maio e convocou novos protestos para esta quarta-feira (09/06). As manifestações são realizadas diariamente e com violentos confrontos entre civis e a polícia vez mais intensos.