O impasse em torno da abertura dos arquivos da ditadura militar boliviana (1964-1982) – ordenada por meio de ordem judicial – teve novos desenrolares essa semana. Ontem (24), as forças armadas permitiram que o promotor Milton Mendonza acessasse os arquivos, porém, proibiram que fossem retirados do quartel de Miraflores, onde estão guardados. O fato revoltou os familiares das vítimas, que anunciaram o início de uma greve de fome.
Segundo Mendonza, que é membro da comissão do Ministério Público que investiga crimes cometidos durante a repressão, a cúpula militar alegou que as arquivos serão entregues a um juiz amanhã (25). Mesmo assim, o promotor classificou a decisão como “despropositada”, segundo o jornal boliviano Los Tiempos. As forças armadas já haviam frustrado a entrega dos documentos em outras ocasiões.
Martin Alipaz/Efe
Familiar de ativista desaparecido na ditadura boliviana protesta em La Paz
Leia também:
Bolívia entrega restos de guerrilheiros mortos há 40 anos
O fato foi considerado um desrespeito pelos familiares das vítimas, que protestaram na porta do quartel militar. “Vamos manter a manifestação até que os chefes militares nos apresentem os arquivos, as informações dos desaparecidos”, disse ao jornal El Deber Olga Flores, irmã de Carlos Flores, ativista trotskista morto em 1980.
Para Marta Montiel, filha de um dos ativistas de esquerda da década de 1970, Tirso Montiel, os militares não estão cumprindo a legislação, que prevê a transparência de informações pública, e as ordens do presidente, Evo Morales. “Estamos cansados de tudo. As forças armadas burlam o poder judicial e o governo. Parece que os militares não têm Deus, nem lei, porque se sobrepõem a todos”, declarou hoje à Efe.
Leia também:
Investigação de crimes da ditadura é um caminho sem volta na região, dizem especialistas
No último dia 17, Morales determinou que o Ministério Público tivesse livre acesso à documentação necessária para dar início a investigações dos ativistas políticos de esquerda que lutaram contra o regime e desapareceram. De acordo com os cálculos das entidades de direitos humanos e autoridades federais, há pelo menos 156 pessoas desaparecidas no período, entre elas o líder do Partido Socialista, Marcelo Quiroga Santa Cruz, e o dirigente sindical Carlos Flores Bedregal.
Entrega agendada
Segundo o ministro da Defesa, Rubén Saavedra, o chefe da instituição militar, general Ramiro de la Fuente será responsável por entregar os arquivos à Milton Mendoza e ao juiz Roger Valverde amanhã, quinta-feira, a partir das 16h (hora local) nos escritórios do Estado Maior.
“Esta predisposição da instituição militar é uma mostra a mais da vontade dar transparência às informações e colaborar com as autoridades que estão encarregadas de investigar os casos dos desaparecidos”, afirmou Saavedra.
Os militares negam que em seus escritórios existam arquivos sobre a dura repressão contra ativistas de esquerda e dirigentes sindicais opositores às ditaduras que vigoraram no país.
Também nesta segunda-feira, o despacho da Defensoria do Povo emitiu uma resolução que obriga o chefe das forças armadas a abrir os arquivos militares da época ditatorial na Bolívia. Esta é a primeira vez que as forças armadas da Bolívia permitem revisar informações secretas sobre as ditaduras.
NULL
NULL
NULL