O presidente da Tunísia, Zine El Abidine Ben Ali, abandonou nesta sexta-feira (14/01) o país. Poucas horas antes, ele havia decretado estado de emergência – uma medida para tentar conter a onda de protestos que tomou conta da Tunísia há algumas semanas. Milhares de manifestantes marcharam por Túnis para exigir a renúncia de Ben Ali, gritando frases como “Fora Ben Ali” e “Ben Ali, assassino!”
Efe
Retrato de Ben Ali na capital tunisiana, Túnis, em meio às manifestações dessa sexta-feira
A insatisfação é causada pela alta inflação, desemprego e corrupção, além de os manifestantes exigirem maior abertura política. Na presidência do país africano desde 1987 – após suceder Habib Bourguiba – Bel Ali disse que deixaria o poder em 2014. Para Mansouria Mokhefi, especialista em Magreb (Tunísia, Argélia e Marrocos) no Ifri (Instituto Francês de Relações Internacionais), o exército poderia estar por trás da fuga de Ben Ali.
A decisão de Ben Ali abandonar a Tunísia era esperada?
É preciso ressaltar que a série de acontecimentos está muito acelerada. Ontem, o presidente fez declarações à população que mostravam que estava totalmente encurralado, sem saída. Hoje, anunciou o estado de emergência assim como a dissolução do governo e agora, fugiu do país. Fato que, apesar das autoridades, não significa a volta à tranquilidade: o espaço aéreo da Tunísia continua fechado. Prova disso é que agora há pouco um avião da Air France em direção a Túnis teve de dar meia volta. Ninguém sabe quem provocou a saída repentina, mas não estranharia se fossem as forças armadas.
Como explicar a explosão de manifestações durante as últimas semanas?
A população está cansada de viver sob um regime rigoroso, que monopolizou há muito tempo todo o poder político e econômico. Além disso, a atual crise econômica afeta especialmente os mais pobres, pois o aumento dos preços dos alimentos se encaixa em um contexto de desemprego alto (entre 24 e 26%). A juventude estuda, mas não tem nenhuma oportunidade de trabalho, sem mencionar a impossibilidade de sair do país para buscar outras oportunidades na Europa, como faziam as gerações anteriores.
A senhora apontaria a situação econômica como a principal razão para a crise política?
Ela é complementada pela ausência de democracia, sem dúvida, especialmente se comparamos a Tunísia com os dois países vizinhos – Argélia e Marrocos – que conseguiram alguns avanços, como um pluralismo controlado na abertura política e uma maior liberdade de imprensa, apesar de alguns temas tabus no Marrocos. Na Tunísia, a situação é de total ausência de democracia: a imprensa está amordaçada; o sistema político controlado pela polícia e há muita corrupção e nepotismo. Isso explica a mais complexa crise desde 1984, quando uma parte da população enfrentou o então presidente Habib Bourghiba.
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Como a senhora avalia as respostas dadas pelo regime à crise?
A principal resposta a essa crise foi uma feroz repressão sobre os jovens, que somente manifestavam seu desespero. A violência policial foi totalmente desproporcional e incompatível com os protestos e as ameaças que representavam no início. O fato de Ben Ali ter feito um discurso sem conseguir acalmar a população já demonstrava que ele não provoca mais medo em ninguém. A decisão de demitir ministros chegou tarde demais, assim como a de libertar os manifestantes detidos. No fundo, todos sabem que se a polícia disparou com balas de verdade contra a população, é porque o presidente autorizou.
Existe uma alternativa política viável para o país?
Não há oposição real no sentido democrático da palavra. É preciso lembrar que a crise de hoje é o resultado de um movimento espontâneo, que não foi orquestrado ou manipulado pelos sindicatos – todos corruptos – ou pelos partidos políticos, já que a oposição não existe. Muito menos por uma “mão estrangeira”, pois todos os países ocidentais aceitavam o regime de Ben Ali, sob o pretexto de ele protegia a Tunísia do perigo islâmico. Precisamos esperar para ver o que vai acontecer. Não tenho certeza se a saída de Ben Ali será suficiente para acalmar a população.
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