O negociador chefe do Brasil para a Rio+20, embaixador André Corrêa do Lago, minimizou os prognósticos de que a conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, a ser realizada no Rio de Janeiro entre 13 e 22 de junho, transforme-se em um fracasso devido à crise financeira global e a incerteza da presença dos principais chefes de estado.
“Quando você está em um período de crise em que os países mais ricos estão precisando de dinheiro para resolverem os seus problemas, fica muito difícil de obter desses países compromissos maiores de recursos financeiros para o desenvolvimento sustentável dos países de menor desenvolvimento relativo. Por outro lado, essa conferência trata do desenvolvimento sustentável a longo prazo. E se estamos pensando novos paradigmas, o fato de se ter uma crise mundial ajuda a pensar alternativas”, disse Corrêa do Lago em entrevista coletiva sobre os preparativos do evento, realizada na quarta-feira no Rio.
Para o embaixador, a Rio+20 acontece em um momento de gravíssima crise econômica e financeira, além de uma crise social que tem colocado em questão direitos que já se consideravam totalmente naturais em vários países, e também uma crise ambiental. “Ou seja, você tem uma crise nos três pilares do desenvolvimento sustentável. Então, se a ideia do Rio de Janeiro é pensar um mundo diferente, em um momento de crise há muito mais disposição para se questionar o que há hoje em dia”, reforçou ele.
Corrêa do Lago listou os dois principais pontos que a conferência da ONU tentará seguir na busca desses novos paradigmas que a partir do meio ambiente ataquem as crises social e financeira. Eles são “a economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza” e “a estrutura da governança internacional para o desenvolvimento sustentável”.
De acordo com o embaixador, o primeiro tema tenta definir o conceito de economia verde, já que ainda não há na ONU um consenso sobre isso. “Uma das funções da Rio+20 é basicamente explicar o que seria esta nova etapa”, afirmou Corrêa do Lago, ressaltando que em decorrência de uma ação dos países em desenvolvimento “a economia verde estaria claramente colocada no contexto do desenvolvimento sustentável e erradicação da pobreza”.
Sobre a governança internacional, o negociador chefe do Brasil disse que a ideia é “ter uma estrutura na ONU que realmente integre essas três questões: o econômico, o ambiental e o social”. Ele adiantou que os países trabalham em duas grandes linhas sobre a questão. A primeira, defendida pela maioria dos países em desenvolvimento, segundo Corrêa do Lago, “quer uma estrutura que fortaleça essa coordenação: o desenvolvimento sustentável”. A outra linha, principalmente dos países europeus, “defende que essa estrutura deve ser fortalecida através do pilar ambiental. Ou seja, o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) se transformar em uma agência especializada”, revelou o embaixador.
Direitos Humanos
Questionado sobre o retrocesso nos rascunhos que estão sendo traçados em Nova York para o documento oficial da conferência, principalmente no quesito Direitos Humanos, o embaixador Corrêa do Lago também minimizou a contribuição do país. “As posições do Brasil são conhecidas pelo documento que mandamos para as Nações Unidas em novembro, mas o processo negociador faz com que certas coisas ganhem mais peso e outras diminuam de peso. Então é muito importante que as ONGs continuem chamando atenção para esse tipo de coisa para vermos de que maneira essas questões podem receber mais espaço na posição do grupo de países”, disse ele, completando que “o fato do grupo não adotar a posição que o Brasil tem, não quer dizer que o Brasil muda de posição. O Brasil continua apoiando aquilo, simplesmente aquilo não vai ter consenso no documento”.
Na Cúpula dos Povos, OAB-RJ focará o Direito Ambiental
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) espera que os debates realizados na Cúpula dos Povos, evento realizado em paralelo à Rio+20 entre os dias 15 e 23 de junho, combatam os retrocessos jurídicos que o país vem sofrendo na gestão das questões do meio ambiente. Flávio Ahmed, presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB-RJ e integrante da comissão ambiental do Conselho Federal da OAB, aponta um momento de retrocesso no país a partir de dois exemplos, a aprovação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara do Projeto de Emenda à Constituição (PEC) 215, que obriga o Executivo a submeter ao Congresso propostas de demarcação de terra, e as alterações inseridas no Código Florestal. Segundo Ahmed, “estamos discutindo no Brasil a flexibilização da legislação ambiental com uma naturalidade que não se pode admitir”.
Outro item abordado pelo advogado é a polêmica construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, no Pará. “A questão energética vem sendo tratada por meio de modelos como o da usina de Belo Monte, com ofensa às populações indígenas que se traduzem nas violações dos direitos humanos, quando deveríamos primar por projetos baseados em fontes alternativas”, diz ele.
As comissões de Direito Ambiental e de Direitos Humanos da OAB-RJ querem mobilizar a sociedade civil durante a cúpula para discussões que estão minimizadas na conferência oficial da ONU e são cruciais para o desenvolvimento em conjunção com o meio ambiente, temas como moradia, saneamento, formas de proteção das populações tradicionais e instrumentos jurídicos de gestão territorial, entre outros.
“A cúpula se articula como a grande instância da sociedade civil, e o advogado tem uma clara função social de operador da realização da justiça”. Diz Ahmed.
Publicado originalmente no site Carta Maior
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