Após ter contestado a indicação de seu sucessor, criando expectativas de um eventual golpe de Estado, o atual primeiro-ministro iraquiano, Nuri Kamal al Maliki, recuou ao afirmar nesta terça-feira (12/08) que as Forças Armadas devem ficar de fora da crise política.
O país vive dias de tensão, dividido com o avanço dos extremistas sunitas do EI (Estado Islâmico) no norte, ameaça que fez com que os Estados Unidos voltassem a intervir militarmente no Iraque após três anos da retirada das tropas, realizando bombareios aéreos e enviando assessores militares.
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Agência Efe
Soldado iraquiano monta guarda na capital Bagdá; atual premiê, prestes a deixar o cargo, pediu que Exército fique de fora da política
O recém-eleito presidente iraquiano, o liberal curdo Fouad Massoum, emitiu ontem um decreto nomeando Haidar al Abadi como o novo premiê do país. Proeminente político do Daawa, mesmo partido de Maliki, Abadi tem 30 dias para formar um novo governo — tarefa complicada, já que os parlamentares xiitas, maioria na cena política iraquiana, estão divididos.
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De acordo com a legislação iraquiana, o maior bloco parlamentar detém a prerrogativa de nomear o gabinete ministerial. Com 94 cadeiras, a coalizão xiita de Maliki (Coalizão Estado de Direito) afirma ter a maioria. Seus rivais, também xiitas, da Aliança Nacional, discordam e garantem que, com 170 deputados, formam a maioria no Legislativo.
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A notícia de demissão de Maliki do cargo de premiê — medida apoiada pela Casa Branca — ganhou força depois que o mais influente clérigo xiita do Iraque sinalizou que era hora do político se afastar do poder. Lideranças políticas dos partidos xiitas declararam, em mais de uma ocasião, que apoiariam a substituição do premiê para “salvar a unidade da coalizão xiita”.
O anúncio da nova nomeação feito ontem pelo presidente iraquiano frustrou os planos de Maliki de obter um terceiro mandato e manter-se à frente do Executivo, posição que ocupa desde 2006. Insatisfeito com a substituição, Maliki chegou a afirmar que a medida violaria a Constituição do país, dizendo também que o presidente iraquiano, Massoum, desrespeitou prazos legais para a escolha do premiê.
[Em frente a cartaz estampando o premiê Maliki, soldado iraquiano faz o número “três” com os dedos, em referência ao terceiro mandato do chefe de governo]
Maliki também realizou uma contra-campanha, tirando fotos com líderes xiitas que ainda o apoiavam no cargo. Além disso, setores das forças de segurança iraquianas pró-Maliki ocuparam algumas áreas da capital Bagdá no domingo, aumentando ameaças de ruptura da ordem democrática.
Apoio a Abadi
A considerável pressão — tanto doméstica, quanto da comunidade internacional — forçou Maliki a abaixar o tom de enfrentamento. Hoje, seu gabinete oficial emitiu um comunicado sinalizando um recuo: “Maliki pede que comandantes, oficiais e indivíduos permaneçam à margem da crise política e prossigam com suas tarefas militares e deveres de segurança para proteger o país, sem intervir na crise. Deixem esse problema para o povo, os políticos e a Justiça”.
Agência Efe (arquivo)
Político xiita, Haidar al Abadi conta com apoio de sunitas e curdos iraquianos, além dos EUA e Irã
Apesar da divisão no bloco xiita, a nomeação de Abadi obteve sinal favorável de diversos grupos na política iraquiana. Tido como autoritário, sobretudo em relação às minorias, Maliki enfrentava a oposição ferrenha dos partidos sunitas, que expressaram satisfação com a substituição do premiê, apoiando o nome de Abadi ao cargo. Outro grupo que não se opôs à indicação de Abadi foram os curdos iraquianos — responsáveis por combater o crescimento dos jihadistas do Estado Islâmico, avançando em direção a Erbil, capital do Curdistão, região autônoma do Iraque.
No cenário externo, Abadi conta com o apoio declarado de Washington, que, inclusive, fez lobby para a saída de Maliki. “Apelamos para a formação de um novo governo o mais rápido possível. O governo dos EUA está disposto a apoiar um novo governo de união nacional”, disse o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, pedindo urgência na formação do novo governo.
Outro importante sinal de apoio veio do Irã. Embora fosse considerado o principal aliado de Maliki na região, Teerã endossou a nomeação de Abadi. “A República Islâmica do Irã apoia o processo legal que foi realizado para a nomeação do novo premiê iraquiano”, declarou o secretário do Conselho Supremo da Segurança Nacional, Ali Shamjani, que também é o representante do guia supremo iraniano no conselho, o aiatolá Ali Khamenei.