Agência Efe
A Doutrina Parot, ou Sentença 197/2006, responsável por violar os direitos humanos de presos políticos bascos e impor a pena de prisão perpétua a centenas de bascos e bascas, foi derrubada pelo TEDH (Tribunal de Direitos Humanos da União Europeia), em Estrasburgo na manhã desta segunda-feira (21/10).
Na realidade, a decisão do dia 21 apenas reafirma sentença anterior, de julho de 2012, que declara ilegal a aplicação de tal doutrina sob a luz do artigo 7 da Convenção Europeia de Direitos Humanos que declara “não há pena sem lei”. A Espanha recorreu à decisão de 2012 e, desta vez, acabaram-se os recursos.
Agora, a Espanha será forçada a alterar sua política carcerária o mais rápido possível. Caso contrário, poderá sofrer sanções do tribunal.
[Inés del Rio, detida em 1987 por participar de ações armadas da ETA e presa há 25 anos; apelação de seus advogados derrubou doutrina Parot]
Desta tentativa de reduzir pena, nasceu a doutrina, aplicada pelo Tribunal Supremo da Espanha, que alterou a compreensão sobre cumprimento de penas, considerando que as condenações deveriam ser cumpridas de forma consecutiva até o limite de 30 anos, ou seja, o benefício de redução da pena não teria validade.
O caso de Inés del Rio
Esta decisão do TEDH vem do pedido de Inés del Rio, detida em 1987 por participar de ações armadas da ETA e presa há 25 anos. Em 2008, a Doutrina Parot lhe foi aplicada, impedindo sua saída da prisão apesar da redução de 9 anos em sua sentença por trabalhos realizados na prisão, o que resultou na invocação do artigo 7 da Convenção Europeia junto ao TEDH.
Além disso, os advogados de del Río denunciavam a aplicação retroativa e, à luz do artigo 14, denunciavam a discriminação aos presos da ETA que viam a aplicação de tal doutrina como uma vingança contra suas ações pela independência do País Basco.
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Condenada a 4,8 mil anos, Inés del Río só poderia ficar presa por 30 anos e este seria o teto do cálculo de redução de sua pena. Devido à Doutrina Parot, ela teve 9 anos reduzidos dos 4,8 mil anos a que foi condenada, não alterando, enfim, os 30 anos legais a que poderia ser condenada.
Hoje, existem ao menos 160 presos submetidos à Doutrina Parot, a ampla maioria deles ex-membros da ETA, mas também alguns assassinos comuns.
Passo para a paz
Bascos, lideranças nacionalistas de esquerda (Abertzales) e o PNV (Partido Nacionalista Basco), atualmente no poder, comemoram a decisão, vista como um passo adiante no processo de paz basco.
Diversos partidos e organizações bascas lutam há anos pelo fim da Doutrina Parot, pela libertação dos presos políticos doentes ou que já cumpriram suas penas e pelo fim da política de “fragmentação” e “distanciamento” dos presos ligados a ETA, que, por vezes, são enviados a prisões a centenas de quilômetros de sua região natal como forma de punir coletivamente suas famílias.
Além disso, exigem que o governo espanhol, hoje controlado pelo PP (Partido Popular) da centro-direita, abra negociações com a ETA. Há exatos 2 anos (completados no dia 20 de outubro), o grupo declarou cessar fogo unilateral e a intenção de negociar seu fim junto à Espanha com a exigência de respeito de seus presos e ao direito de autodeterminação.
Por parte do governo espanhol nenhuma surpresa
O Ministro do Interior, Jorge Fernández, reafirmou a falta de vontade do governo em negociar com a organização independentista e declarou mais uma vez que a ETA estaria “derrotada” e que a política penitenciária espanhola de espalhar os prisioneiros não mudaria.
Além disso, o Ministro da Justiça, Alberto Ruiz-Gallardón, defendeu a reforma do Código Penal espanhol que legalizaria a vingança de Estado e “legalizaria” a Doutrina Parot e afirmou, em claro desrespeito à decisão europeia, que a Espanha não pagará a multa de 30 mil euros a del Río decidida pelo TEDH pelos danos infringidos.
Pese a declaração de Fernández, a Espanha será forçada a rever ao menos parte de sua política carcerária e continuará a sofrer pressões vindas da União Europeia para revisar uma política que é vista por muitos como mera vingança contra aqueles que lutam pela libertação do País Basco.
Enquanto isso, membros destacados de grupos de extrema-direita, como os GAL (Grupos Antiterroristas de Libertação na sigla em espanhol), muito ativos nos anos 80, receberam perdão oficial por seus crimes ou foram beneficiados por inúmeras reduções de penas.