No programa 20 MINUTOS ENTREVISTAS desta sexta-feira (03/12), o jornalista Breno Altman entrevistou a bióloga e ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, que avaliou a deterioração do Brasil provocada pelo atual governo e fez um balanço da COP26 e da participação brasileira na conferência.
Segundo ela, durante os governos petistas, o Brasil adquiriu um certo softpower, que se deu em parte graças às políticas socioambientais desenvolvidas. Tudo isso, ela ressaltou, foi fragilizado pelo atual governo.
“O Brasil está entregue ao crime ambiental com essa liberação geral do desmatamento, que gera também trabalho escravo, tráfico de animais e muitos outros problemas. Essa degradação está associada a um projeto deliberado de destruição”, argumentou.
Teixeira, que ocupou a pasta entre 2010 e 2016 (governos Lula e Dilma), reforçou que a postura de Bolsonaro com relação à Amazônia, por exemplo, não é descaso, mas está direcionada a atender certos interesses “e quem ganha com isso é quem vive do crime e da lavagem de dinheiro, porque desmatar não é barato”.
Como resultado, a ex-ministra afirmou que o Brasil perdeu o controle do desmatamento e colocou os militares, “que não têm competência moral, nem técnica”, para fiscalizar de forma ineficiente.
“É por essas razões que o mundo vê o Brasil hoje com muita desconfiança. Em Glasgow, o governo escondia os números de desmatamento, negava, mesmo com a imprensa divulgando a verdade. Não somos mais ouvidos. Só vamos voltar a ficar de pé a nível internacional quando as florestas brasileiras estiverem de pé”, ponderou.
Balanço da COP26
Refletindo sobre a Conferência do Clima da ONU, concluída no mês passado e que aconteceu na Escócia, Teixeira disse que o encontro “cumpriu seu papel”. Para ela, a COP26 tinha o objetivo de operacionalizar o Acordo de Paris e foi isso que fez, inclusive propiciando uma mesa de diálogo entre China e Estados Unidos que, apesar de suas disputas geopolíticas, “decidiram que não vão disputar a nível climático”.
Ela também celebrou que se discutiu, pela primeira vez, a questão do uso das terras e das florestas para a produção de alimentos, que correspondem a 20% das emissões globais. O grande aprendizado, de acordo com a ex-ministra, foi entender que a questão climática não está mais só presa à questão energética.
“Agora não é mais só dizer que até 2050 vão zerar as emissões de carbono. Não basta mais o compromisso, agora os países vão ter que dizer como vão colocar isso em prática. Mas é verdade que tínhamos objetivos mais ambiciosos do que só esse. Por exemplo, queríamos o banimento do uso do carvão até 2030, mas se adotou uma resolução de redução por causa dos países em desenvolvimento como Índia e África do Sul, onde há pessoas sem acesso à energia. Você precisa adicionar cidadania antes de fazer a transição”, discorreu.
Por outro lado, entendeu-se a importância de se tratar simultaneamente da mitigação de efeitos e adaptação de trajetórias. Isto é, conforme os governos implementam o acesso à energia com carvão em países mais pobres, por exemplo, já trabalham ao mesmo tempo para construir mecanismos de adaptação para realizar a transição energética num período mais curto. “Mas falhamos em pensar no auxílio financeiro que o mundo precisa dar para concretizar isso”, frisou.
Fundação Heinrich Böll
Ex-ministra Izabella Teixeira foi a entrevistada desta sexta do 20 MINUTOS ENTREVISTAS
Futura agenda ambiental
Pensando nas metas urgentes que o mundo precisa atingir para evitar uma situação de emergência climática, à qual já se aproxima, Teixeira defendeu que terá de ser possível criar um capitalismo verde.
“Com a degradação ambiental intensa que estamos vivendo, não vamos ter recursos para alimentar a todos. Como vamos planejar nossa agricultura se vamos ter secas? E isso não vai atingir o mundo de maneira uniforme: os países mais vulneráveis ficarão ainda mais expostos. Muitas ilhas e arquipélagos vão desaparecer com a subida do nível do mar, vamos ter que receber essas pessoas e compensá-las pelos danos”, contextualizou.
Por isso, segundo ela, é necessário buscar novas formas de produzir, apostando em inovação tecnológica e consumo responsável: “Novos valores e estilos de vida”.
E ela enfatizou o quanto o Brasil é um país privilegiado para fazer escolhas, a curto prazo, que podem caminhar nesse sentido “sem precisar conversar com ninguém”, resolvendo apenas questões internas. Para a ex-ministra, a principal é parar de desmatar e construir uma agenda efetiva para a preservação da Amazônia, seus recursos e povos nativos.
Outro ponto importante é a questão da água, que se tornará um recurso estratégico. “Todos os países estão procurando não esgotar suas reservas e o Brasil, com a maior reserva do mundo, não é consciente. A água que nós temos está sendo usada para a irrigação”, lamentou Teixeira.
Por fim, ela citou a relevância da transição energética, que não está sendo levada a sério sob o governo Bolsonaro. Pelo contrário, “é um deboche que falem em programa de carvão sustentável com a gente podendo transitar para a energia eólica e solar”.
A ex-ministra não se mostrou contrária à construção de novas usinas hidrelétricas. “No fundo são escolhas”, disse, mas, para ela, é preciso avaliar, com base em experiências anteriores, quando essa fonte de energia realmente se justifica. “Acho que, se temos outras alternativas, não há motivos para destruir a natureza”, defendeu.
Por outro lado, ela não considera um erro a construção de hidrelétricas durante os governos petistas, como a polêmica Belo Monte. Ela relembrou que a opção da energia hidráulica foi estratégica para o país, até para gerar segurança hídrica, algo possibilitado pelos grandes reservatórios que as usinas exigem que se construa.
“Com relação a Belo Monte, a decisão foi tomada de só fazer um barramento, com concordância da Funai, para evitar inundações maiores. Mas aí os grupos socioambientais podem argumentar que não tinha que ter inundado nada, enquanto o setor elétrico também pode apontar erros porque, como resultado desse acordo, não há o aproveitamento máximo da capacidade da usina. Acho que se o Brasil voltar a discutir essa fonte, ela terá de ser pensada de outro modo, mas podemos priorizar a energia eólica, solar e o biocombustível antes”, concluiu.