O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, afirmou em entrevista divulgada nesta quarta-feira (28/04) pelo site de notícias Sputnik que não se surpreende com a pressão exercida por Washington para que o Brasil não use a vacina Sputnik V – que teve uso emergencial rejeitado pela Anvisa nesta semana.
“Não estou surpreendido com isso. Os norte-americanos não se acanham de estar fazendo este trabalho. Eles não estão escondendo isso”, disse Lavrov.
Lavrov afirmou que o governo Donald Trump (2017-2021) fez algo similar, quando o então secretário de Estado Mike Pompeo viajou pela África e pediu publicamente para que não se cooperasse e negociasse com a Rússia e China, porque estes países “têm objetivos egoístas”, enquanto os norte-americanos negociam com os países africanos “para o bem dos povos”.
“No Brasil surgiu agora um movimento contra esta privação. E se os norte-americanos admitiram que estão por trás deste resultado, então, é porque são fiéis à sua lógica de que tudo é permitido para eles e já não se acanham de dizer isso publicamente”, declarou.
Pressão dos EUA contra Sputnik V
Em março, o Instituto Gamaleya, responsável pelo imunizante russo, revelou a publicação de um relatório do Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS, na sigla em inglês) dos Estados Unidos que dizia que Washington pressionou o Brasil para não comprar a Sputnik V.
Em um ponto do documento intitulado “combatendo influências malignas nas Américas”, o HHS afirma que, através do Escritório de Assuntos Globais (OGA, na sigla em inglês), “usou relações diplomáticas nas Américas para mitigar esforços de Estados como Cuba, Venezuela e Rússia, que estão trabalhando para aumentar sua influência na região em detrimento da segurança dos EUA”.
Segundo o HHS, o OGA coordenou, “em conjunto com outras agências do governo dos EUA o fortalecimento de laços diplomáticos e ofereceu assistência técnica e humanitária para dissuadir países da região a aceitarem ajuda desses Estados mal-intencionados”.
MFA Rússia
Lavrov disse não estar surpreendido com rejeição da Sputnik V no Brasil
“Exemplos incluem o escritório de saúde do OGA persuadir o Brasil a rejeitar a vacina russa contra a covid-19 e oferecer assistência técnica do CDC (Centro de Controle de Doenças) em troca do Panamá não aceitar uma oferta de médicos cubanos”, diz o texto.
Em nota enviada a Opera Mundi, o Ministério das Relações Exteriores negou que a “Embaixada do Brasil em Washington” tenha recebido qualquer “consulta ou gestões” de autoridades ou empresas norte-americanas em relação a uma “eventual compra, pelo Brasil, da vacina russa contra a covid-19”.
Por que a Anvisa rejeitou a Sputnik V?
O pedido para importação do imunizante anticovid foi rejeitado de forma unânime pelos cinco diretores da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que alegaram problemas de ordem técnica e científica.
A agência constatou a presença de adenovírus replicante na composição da vacina, o que poderia acarretar riscos à saúde. A fórmula utiliza dois vetores adenovirais, um para cada dose, contendo sequências genéticas do coronavírus Sars-CoV-2, causador da covid-19.
Geralmente, adenovírus utilizados como vetores em vacinas são inativados para evitar sua reprodução dentro do organismo humano, mas isso não foi verificado nos lotes analisados, segundo a Anvisa.
“Um dos pontos críticos foi a presença de adenovírus replicante na vacina. Isso significa que o vírus, que deve ser utilizado apenas para carregar o material genético do coronavírus para as células humanas e promover a resposta imune, ele mesmo se replica. Isso é uma não conformidade grave”, disse o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes.
Segundo ele, um adenovírus replicante poderia causar viroses ou se acumular em tecidos específicos do corpo humano, como o dos rins. Além disso, a diretoria da Anvisa alegou falta de documentos essenciais para a aprovação, inclusive de controle de qualidade, e problemas na fabricação por parte das empresas russas Generium e UfaVITA.
“Neste momento, o risco inerente à fabricação não é possível de ser superado, tanto para o insumo fabricado pela Generium quanto pelos produtos acabados fabricados pela Generium e pela UfaVITA, então a nossa gerência não recomenda a importação da vacina”, afirmou a gerente de Inspeção, Ana Carolina Merino.
A vacina já foi aprovada em 60 países de diferentes continentes, com uma população de três bilhões de pessoas. O imunizante é o segundo com maior número de aprovações no mundo.
(*) Com Sputnik e Ansa