O presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antônio Barra Torres, rebateu nesta quinta-feira (29/04) as acusações de difamação feitas pela fabricante da vacina Sputnik V e afirmou que o órgão regulador “não mentiu” nas justificativas apresentadas para negar a importação do imunizante russo ao Brasil.
“A Anvisa foi acusada de mentir, de atuar de maneira antiética e de produzir fake news sobre a identificação do adenovírus replicante (RCA). Não há nesta instituição nenhuma pessoa que tenha qualquer interesse ou júbilo em negar a importação de qualquer vacina”, disse Barra Torres.
O pedido para importação do imunizante anticovid Sputnik V foi rejeitado de forma unânime pelos cinco diretores da Anvisa na última segunda-feira (26/04).
Exibindo documentos que teriam embasado o veto à vacina russa, o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, afirmou que os números sobre “segurança específica deveriam estar zerados”, mas indicam “não mais do que 1 x 10³ adenovírus replicantes (RCA) por dose”.
“Os dados que nós avaliamos, que foram apresentados pelo Instituto Gamaleya, são dados que mostram que há presença do vírus replicante e há uma especificação; há uma aceitação do limite de produto de adenovírus replicante apenas eficaz no produto acabado. E essa especificação é definida trezentas vezes maior do que o maior limite regulatório. O esperado em vacinas é a ausência de vírus replicantes”, disse Mendes.
Pelo Twitter, a conta oficial da fabricante da Sputnik V comentou a coletiva realizada pelos representantes do órgão e disse que o pronunciamento “confirmou que [a Anvisa] não encontrou nenhum adenovírus replicante (RCA) na Sputnik V, mas se preocupou com o limite regulatório teórico russo para esse parâmetro”.
“Em carta enviada à Anvisa em 26 de março, o Instituto Gamaleya confirma que os controles de qualidade garantem que nenhum RCA esteja presente na Sputnik V”, disse o fabricante.
Ainda segundo os desenvolvedores da vacina russa, “o RCA não foi detectado na Sputnik V por todos os controles de qualidade, o que corresponde aos padrões mais rígidos, incluindo FDA e outros”.
“Que bom que a Anvisa está começando a esclarecer a confusão que criou”, concluiu.
Em sua coletiva de imprensa hoje, a Anvisa confirmou que não encontrou nenhum adenovírus replicante (RCA) na Sputnik V, mas estava preocupada com o limite regulatório teórico russo para esse parâmetro.
— Sputnik V (@sputnikvaccine) April 29, 2021
Em tom conciliador, o presidente do órgão chegou a dizer que rejeitou a importação do imunizante “com grande tristeza” e que a Anvisa está aberta “para avaliar novos estudos e informações que podem ser enviadas pelo desenvolvedor da vacina no processo de autorização de uso emergencial ou no pedido de importação”.
“Não estamos fechando a porta. Os dados apresentados podem ser revistos, corrigidos e reapresentados, mas a decisão do regulador é o retrato do momento”, disse.
Wikicommons
Presidente da Anvisa refutou acusações de que órgão regular brasileiro teria espalhado ‘informações falsas’
Fabricante diz que vai processar Anvisa por difamação
A fabricante da vacina Sputnik V havia anunciado mais cedo nesta quinta-feira que iria processar a Anvisa do Brasil por difamação por espalhar o que diz serem “informações falsas” sobre o imunizante russo.
“Após a admissão do regulador brasileiro Anvisa de que não testou a vacina Sputnik V, a Sputnik V está iniciando um processo judicial de difamação no Brasil contra a Anvisa por espalhar informações falsas e imprecisas intencionalmente”, escreveu a conta oficial da vacina no Twitter.
A fabricante afirma que o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes, teria admitido um “erro” na avaliação do imunizante, dizendo que o órgão não recebeu “amostras da vacina para teste” e que “não se fez teste para adenovírus replicado”.
Após a admissão do regulador brasileiro Anvisa de que não testou a vacina Sputnik V, a Sputnik V está iniciando um processo judicial de difamação no Brasil contra a Anvisa por espalhar informações falsas e imprecisas intencionalmente.
— Sputnik V (@sputnikvaccine) April 29, 2021
No entanto, o Fundo Russo de Investimento Direto não disse onde e quando Mendes teria proferido a frase. Por outro lado, à rádio CBN, Mendes afirmou que a agência tem sofrido pressão para aprovar o imunizante, e classificou de “lamentáveis” as críticas do Fundo Russo.
A Rússia acusa a rejeição do imunizante pela Anvisa de ter influências políticas.
Por que a Anvisa rejeitou a Sputnik V?
O pedido para importação do imunizante anticovid foi rejeitado de forma unânime pelos cinco diretores da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que alegaram problemas de ordem técnica e científica.
A agência constatou a presença de adenovírus replicante na composição da vacina, o que poderia acarretar riscos à saúde. A fórmula utiliza dois vetores adenovirais, um para cada dose, contendo sequências genéticas do coronavírus Sars-CoV-2, causador da covid-19.
Geralmente, adenovírus utilizados como vetores em vacinas são inativados para evitar sua reprodução dentro do organismo humano, mas isso não foi verificado nos lotes analisados, segundo a Anvisa.
“Um dos pontos críticos foi a presença de adenovírus replicante na vacina. Isso significa que o vírus, que deve ser utilizado apenas para carregar o material genético do coronavírus para as células humanas e promover a resposta imune, ele mesmo se replica. Isso é uma não conformidade grave”, disse Mendes.
Segundo ele, um adenovírus replicante poderia causar viroses ou se acumular em tecidos específicos do corpo humano, como o dos rins. Além disso, a diretoria da Anvisa alegou falta de documentos essenciais para a aprovação, inclusive de controle de qualidade, e problemas na fabricação por parte das empresas russas Generium e UfaVITA.
“Neste momento, o risco inerente à fabricação não é possível de ser superado, tanto para o insumo fabricado pela Generium quanto pelos produtos acabados fabricados pela Generium e pela UfaVITA, então a nossa gerência não recomenda a importação da vacina”, afirmou a gerente de Inspeção, Ana Carolina Merino.
A vacina já foi aprovada em 60 países de diferentes continentes, com uma população de três bilhões de pessoas. O imunizante é o segundo com maior número de aprovações no mundo.