Do lado de fora do hotel Sheraton no centro de Buenos Aires, onde chefes de Estado se reúnem na 7ª cúpula da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC), as ruas foram marcadas por mobilizações que levantam a bandeira pela causa de diferentes países. Sob o lema “Basta de ditadores”, os protestos incluíram denúncias da repressão e a militarização no Peru, que pedem por novas eleições; pedidos de justiça pelas crianças argentinas assassinadas no Paraguai e um protesto contra a ocupação militar no Haiti.
O caso do Haiti foi redigido em uma carta assinada e entregue pela Mãe da Praça de Maio, da Linha Fundadora, Nora Cortiñas, e o Prêmio Nobel da Paz argentino Adolfo Pérez Esquivel ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na tarde de segunda-feira (23/01), em um encontro com organizações de direitos humanos na Casa Rosada.
Refletindo a reivindicação de distintas organizações populares haitianas, a carta pede pela não intervenção do Brasil no país e sua retirada do Core Group, organização intergovernamental criada para intervir na política do Haiti. O Core Group é formado pela Organização das Nações Unidas (ONU), Brasil, Canadá, França, Alemanha, Espanha, União Europeia, Estados Unidos e a Organização dos Estados Americanos (OEA).
A carta denuncia a atuação de organismos como ONU e a OEA na sustentação do atual governo do primeiro-ministro Ariel Henry, e o obstáculo que estas intervenções representam na democracia e a soberania do país.
“O povo haitiano está de pé diante da enorme crise social e política a que é submetida e da ameaça de uma nova ocupação militar que os Estados Unidos impulsionam abertamente”, diz a carta. “Lutar contra as escandalosas cadeias e desigualdades que beneficiam uma pequena minoria com o apoio dos poderes imperialistas e neocolonialistas, o Fundo Monetário Internacional (FMI) e os bancos multilaterais, e condenam a maioria da população a viver em condições desumanas”.
Ricardo Stuckert
Lula e Janja se encontraram em Buenos Aires com representantes das organizaçõs Mães da Praça de Maio e Avós da Praça de Maio
“[O povo] exige a renúncia do governo interino de Ariel Henry – um governo não eleito pelo povo do Haiti, mas imposto e sustentado por esses poderes através do nefasto Core Group – e exige o respeito irrestrito à sua soberania e autodeterminação”.
Em relação ao papel do Brasil na situação do país centro-americano, a carta assinada por Cortiñas e Perez Esquivel explicita o pedido a Lula: “Chamamos em especial ao governo do Brasil que o senhor preside a apoiar os direitos do povo haitiano, sendo contrário a qualquer intervenção, retirando-se do Core Group e trabalhando por sua dissolução, pelo fechamento do Escritório das Nações Unidas para a Integração do Haiti (BINUH), e pela justiça e reparação pelos crimes cometidos contra o povo”.
Em seguida, enumeram alguns desses crimes: “a cólera, os massacres, as violações e abusos sexuais da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (MINUSTAH), a restituição das reservas de ouro roubadas pelos Estados Unidos e o Citibank, e reparações e devolução de França da dívida fraudulenta que foi cobrada ao Haiti ilegitimamente por sua independência e como compensação aos escravistas”.
O pedido foi estendido aos demais países-membros da Celac em reconhecer a luta antiescravista na região, empreendida pelo Haiti, e castigada pelos países imperialistas até hoje. A Revolução do Haiti representou a primeira ressurreição vitoriosa contra o domínio racista e escravista dos países europeus sobre a América Latina e o Caribe. Com a intervenção militar através de diversos órgãos multilaterais, o Haiti sofre com os índices mais altos de pobreza na região e luta pela sua soberania e independência, contando, para isso, com a cooperação internacional, especialmente na região.