Diversos movimentos populares, partidos políticos e ativistas de vários países da América Latina acusam a Justiça do Paraguai de perseguir manifestantes que protestaram contra o assassinato de duas crianças de 11 anos por militares paraguaios durante uma operação contra um grupo guerrilheiro no início do mês.
Em documento intitulado “Os crimes impunes, a indignação e a denúncia castigadas”, organizações da Argentina, México, Colômbia e Paraguai acusam a Justiça do país de ter iniciado “uma perseguição contra manifestantes” que participaram de um ato realizado no último dia 5 de setembro em frente ao Panteão dos Heróis, em Assunção, que pedia punição aos responsáveis pela morte das duas meninas.
Três jovens são acusadas de terem “vandalizado” o prédio público do Panteão, por conta de pichações que pediam justiça pela morte das meninas, e “queimado bandeiras do país”.
Segundo entidades de direitos humanos do Paraguai, duas das acusadas se refugiaram na Argentina, temendo perseguição da Justiça. Uma terceira, Paloma Chaparro, se apresentou à Justiça e está presa de forma preventiva desde o dia 16 de setembro.
“Nos solidarizamos com as jovens que, movidas por sua indignação e pela vergonha que provoca o repetido silêncio da ‘opinião pública’ diante desta barbárie, realizaram um ato de repúdio que não tem a menor relevância nem comparação com o dano que a criminalidade estatal provoca”, dizem as entidades.
A Mesa de Memória Histórica e Arquivos da Repressão, entidade de direitos humanos que atua na investigação de crimes cometidos pela ditadura paraguaia, também condenou os processo judiciais contra manifestantes e pediu a libertação de Paloma.
“Essa atitude do Ministério Público supõe uma derrubada de fato das garantias constitucionais sem que haja estado de exceção. Exigimos o fim de atos arbitrários por parte dos procuradores que atuam à margem da lei”, disse a organização em nota.
Reprodução/Frente Amplio Comunicaciones
Paraguaios foram às ruas para pedir punição à ação militar que deixou duas meninas de 11 anos mortas em uma ação contra guerrilha
Poeta e escritor também foi acusado
Miguel Angel Fernández, um poeta e escritor paraguaio de 82 anos que também participou dos protestos em Assunção, foi acusado pela Justiça paraguaia por “violação da quarentena sanitária” durante o ato.
Segundo a Sociedade de Escritores do Paraguai (SEP), as acusações são “uma clara mostra de criminalização de conhecidas personalidades por expressarem seu repúdio ao crime de Estado cometido pelo Exército paraguaio”.
“Reafirmamos nossa solidariedade com o veterano colega escritor e pedimos às autoridades sua desvinculação do caso diante da falta de evidências de sua participação direta nos delitos investigados”, disse a SEP.
Duas crianças foram assassinadas
O que levou centenas de paraguaios a protestar em frente ao Panteão dos Heróis, em Assunção, no dia 5 de setembro foi o assassinato de duas crianças de 11 anos por parte da Força Tarefa Conjunta (FTC), órgão que faz parte das Forças Armadas do país, durante uma operação contra o grupo guerrilheiro de orientação marxista-leninista Exército do Povo Paraguaio (EPP).
Segundo advogados da família das vítimas, as meninas, que eram cidadãs argentinas, estavam em um acampamento do EPP para visitar os pais, que são militantes da guerrilha.
María del Carmen Villalba e Lillian Villalba foram apresentadas pelas autoridades paraguaias como “vítimas guerrilheiras” da operação. Segundo a versão dos militares, as meninas tinham entre 15 e 17 anos e portavam armas.
As declarações são refutadas pela defesa da família, que afirma que as meninas serviram como falso positivo do governo paraguaio, ou seja, foram mortas e posteriormente “vestidas como guerrilheiras”.
Após a ação que assassinou as crianças, o EPP sequestrou o ex-vice-presidente do Paraguai Óscar Denis, exigindo doação de alimentos a comunidades indígenas, veiculação pela imprensa paraguaia de vídeos da guerrilha e a libertação de presos políticos do grupo.
A família de Óscar Denis já iniciou a distribuição de cestas básicas nas regiões indicadas pelos combatentes, e os vídeos do grupo já foram ao ar em emissoras de TV e de rádio paraguaias. Entretanto, a libertação dos militantes da guerrilha que estão presos ainda não foi atendida, e o ex-vice-presidente continua sob custódia do EPP.