Vamos contar quais foram as cinco maiores vitórias eleitorais nos Estados Unidos desde o fim da Segunda Guerra. Na eleição norte-americana o voto popular não é o mais importante. O que conta mesmo é garantir pelo menos 270 votos entre os delegados eleitorais.
Mas, melhor do que ganhar com 270 votos, é ganhar no que os norte-americanos chamam de landslide – que em português a gente chama de “lavada” mesmo.
Um número expressivo de votos eleitorais é fundamental para saber até que ponto o presidente eleito vai conseguir implementar todas as suas políticas. Com uma vitória de lavada, é mais fácil fazer isso.
Spoiler: das cinco maiores vitórias nos últimos setenta anos, quatro são republicanas.
Em 1956, o então presidente republicano Dwight Eisenhower bateu o democrata Adlai Stevenson por 457 votos eleitorais contra 73. Houve um voto de um faithless elector em um político do Alabama.
Repare que a soma de votos eleitorais dá 531. Na época, o Alasca, o Distrito de Colúmbia e o Havaí ainda não votavam para presidente. Hoje são 538 votos eleitorais em jogo.
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Essa não era a primeira vez que Eisenhower e Stevenson se enfrentavam. Quatro anos antes, eles já haviam disputado a presidência. Em 1956, no entanto, o presidente conseguiu ainda mais votos eleitorais do que em 1952.
Stevenson só ganhou no sul e, mesmo assim, não em todos os Estados. Eisenhower também teve maioria substancial nos votos populares: foram mais de 35 milhões de votos, contra 26 milhões do democrata. Traduzindo em porcentagens: 57,4% para Eisenhower e 42% para Stevenson.
Este é o primeiro (e último) democrata da nossa lista. O presidente Lyndon Johnson venceu o ultrarreacionário republicano Barry Goldwater em 1964 com 486 votos eleitorais contra 52 (total aqui já é 538).
Johnson havia assumido o cargo após o assassinato do presidente John Kennedy, no ano anterior, e era relativamente popular. Foi em 64 que Johnson, inclusive, assinou o Civil Rights Act, terminando com a segregação racial – ao menos aquela oficial – em todo o país.
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E, muito por conta disso, os estados do Sul, antes muito democratas, começaram a passar para o lado republicano… da força. Foi em cinco estados do sul, e mais o Arizona, que Barry Goldwater venceu. Nós já falamos disso na história do Partido Republicano.
Johnson teve 61,1% dos votos populares; Goldwater, 31,5%. Mas a mágica, por assim dizer, não se manteve: em 1968, ele desistiu da reeleição após ganhar por pouco a primária democrata em New Hampshire – sim, havia outros candidatos sérios disputando a candidatura contra um presidente no cargo. Johnson creditou sua saída da disputa, dentre outros motivos, a problemas cardíacos. De fato, sua saúde declinava rapidamente e, mesmo sem o stress de governar o país que perdia a Guerra do Vietnã, morreu em 1973.
Um republicano reacionário contra um presidente democrata que fazia um governo mais progressista do que a média. Essa foi a disputa de 1980. O que você acha que aconteceu?
Ronald Reagan venceu o presidente Jimmy Carter por 489 votos eleitorais contra 49. Sim, quase dez vezes mais. Carter só ganhou em seis Estados e no Distrito de Colúmbia, que nunca votou em um republicano. Nos outros 44 só deu Reagan, por margens variadas. Nos votos populares, a vitória de Reagan também foi substancial: 50,7% dos votos, contra 41% de Carter.
Alguns fatores ajudam a explicar a derrota de Carter. Seu governo enfrentou uma tempestade econômica com a crise do petróleo e houve a crise com o Irã, que Reagan explorou incansavelmente.
Para piorar a situação do democrata, ele enfrentou uma concorrência séria nas primárias: embora tenha vencido, a disputa com o senador Ted Kennedy deixou sua candidatura fragilizada.
Ah, sim, são parentes: Ted é irmão do famoso John Fitzgerald Kennedy, o presidente morto em 1963, e de Robert Kennedy, que disputava as primárias do Partido Democrata em 1968 quando também foi assassinado.
Você acha que Reagan ganhou de muito? Espere mais um pouquinho.
Estamos nos aproximando da maior vitória eleitoral dos últimos setenta anos. Mas, para o segundo colocado, vamos precisar voltar alguns anos – mais precisamente, para 1972.
O roteiro aqui guarda alguma semelhança com a disputa entre Carter e Reagan: em 1972, o presidente republicano Richard Nixon tinha alta popularidade e ainda não sentia os efeitos do escândalo de Watergate. Os democratas escolheram, em uma primária tumultuada, o senador progressista George McGovern, que concorreu com uma plataforma anti-Guerra do Vietnã.
Se, por um lado, Nixon usou métodos ilegais na campanha, como a espionagem do edifício Watergate, onde havia um comitê democrata, McGovern também teve seus problemas, chegando a ter que trocar de vice no meio da campanha.
Só podia dar ruim, né? Mas, para o democrata, deu péssimo. Nixon conseguiu 520 votos eleitorais, contra apenas 17 de McGovern. E isso porque, no colégio eleitoral, um eleitor ainda votou em outro candidato e tirou um voto de Nixon. McGovern só ganhou no Distrito de Colúmbia, aquele que só vota em democratas, e em Massachusetts. E fim.
Para piorar a situação, Nixon ainda conseguiu 60,7% dos votos populares, contra 37,5% de McGovern, na que é, até hoje, a maior diferença em votos populares de todos os tempos nos EUA. Nixon só ficou dois anos no governo e foi engolido pelo escândalo de Watergate.
Chegamos ao final da nossa lista, mas com uma figurinha repetida. Você estava achando que Reagan havia estourado a boca do balão em 1980?
Em 1984 foi ainda pior. Contra o ex-vice-presidente democrata Walter Mondale, Reagan conseguiu 525 votos – sim, mais do que Nixon – e deixou apenas 13 votos bem contados para o concorrente.
Mondale ganhou só naquele lugar onde só democrata ganha – no caso, o Distrito de Colúmbia – e em seu estado natal, Minnesota.
Reagan era muito popular e fez uma campanha incentivando os norte-americanos a não trocar o que seria o certo pelo duvidoso. Além disso, neutralizou a principal preocupação de sua campanha, que era a idade avançada do presidente, 73 anos. Em um debate, Reagan se saiu com a seguinte frase:
“Não vou fazer da idade um assunto desta campanha. Não vou explorar, por motivos políticos, a juventude e a inexperiência do meu oponente”, disse.
Tempos depois, Mondale afirmou que sabia, quando ouviu a frase, que tinha perdido a eleição. Reagan acabou tendo 58,8% dos votos, contra 40,6% do democrata.
Ou seja, para evitar ser chamado de “velho”, Reagan deu um jeito supostamente elegante de chamar Mondale de “moleque”.
Chegamos ao final da nossa lista. Você reparou que não citamos nenhuma vitória de 1990 para frente? Pois é. Com a crescente polarização, está cada vez mais difícil vermos um landslide.
Não que coisas perto disso não tenham acontecido: Bill Clinton, em 1996, ganhou de Bob Dole com 379 votos eleitorais contra 159. Em 2008, Barack Obama bateu John McCain por 365 a 173.
Mas há pouco espaço, hoje, para o convencimento de eleitores para muito além do partido com o qual se identificam. Vitórias de lavada só acontecem quando um candidato consegue montar um eleitorado que supera a votação normal de seu partido.
Vamos ver se essa escrita se mantém com Joe Biden e Donald Trump.