Poucos temas são tão polêmicos quanto a oportunidade e as condições da volta à escola diante das incertezas da pandemia. E poucos exigem um debate menos polarizado e mais baseado em critérios científicos e sociais.
À pressão, compreensível, dos empresários do ensino privado se contrapõe, entre outras, a posição do principal sindicato de professores do Estado de São Paulo, que condiciona, com razão, a volta às atividades presenciais à priorização da cobertura vacinal para todos os funcionários do setor educacional.
Os argumentos, tomados em separado, parecem igualmente válidos. Como a esta altura já está claro que a pandemia afetou de maneira desigual setores e classes sociais, falta o passo decisivo de pensar o que poderia ser o interesse geral da sociedade.
Já está claro que crianças e jovens são particularmente afetados pelas condições do isolamento social, seja pelo prejuízo de um momento fundamental do aprendizado e formação, seja pelo impacto emocional e afetivo do afastamento de amigos e colegas que constituem seu referencial fundamental no processo de socialização.
Agregue-se que para os alunos de escolas públicos, normalmente mais pobres e com menores condições do chamado background familiar, esse prejuízo é ainda maior e reforça a nossa já obscena exclusão e desigualdade social.
Desde o fato de que a merenda escolar constitui uma base fundamental na segurança alimentar de muitas crianças até a dificuldade de famílias ou mães solo em manter as crianças em casa ou à falta de condições materiais de acesso à internet, o problema isolamento social se revela no seu inevitável caráter de classe.
Professores tem razão em alertar que embora a maioria das crianças e jovens seja mais resistente e assintomática ao vírus eles podem atuar como transmissores do vírus para os familiares, sobretudo dos grupos de risco, e para os próprios professores.
Pixino
O que fazer diante de tantas incertezas? A resposta é certamente complexa, mas alguns pontos deveriam ser claros para todos
Os defensores da volta ao ensino presencial tem razão ao argumentar que as crianças e jovens não podem continuar sendo submetidos aos prejuízos educacionais e afetivos, quando não alimentares, do prolongamento indefinido do isolamento.
O que fazer diante de tantas incertezas? A resposta é certamente complexa, mas alguns pontos deveriam ser claros para todos.
Deixar a ridícula disputa eleitoral ou ideológica em torno das vacinas e empreender um esforço conjunto no aproveitamento da infraestrutura, capilaridade e know how do SUS para uma vacinação massiva é o primeiro e óbvio.
Preparar as escolas, fisicamente e através do treinamento dos protocolos sanitários básicos para o retorno mais seguro possível é urgente e necessário.
O que é que o Estado e os municípios têm feito nesse sentido? Nossas escolas públicas passaram por manutenção espacial adaptativa neste já quase um ano de fechamento? Os funcionários foram treinados e submetidos a testes prévios? As janelas das salas de aula funcionam? Banheiros, bebedouros e expendedores de álcool gel estão prontos?
Uma pequena parte dos recursos repassados generosamente aos bancos e às empresas via isenção fiscal faria muita diferença. Neste caso, vale a máxima de que mais vontade política e menos eleitoralismo já passaram da hora.
*Carlos Ferreira Martins é professor titular do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP São Carlos