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Política e Economia

Para atrair OTAN e EUA, Ucrânia provoca Rússia: o que explica a tensão entre os países

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Conflitos na fronteira da Ucrânia com a Rússia levaram a uma recente escalada de tensão entre Moscou e Ocidente; Kremlin acusa Otan de expansionismo

Camila Araujo

São Paulo (Brasil)
2022-01-23T13:25:00.000Z

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A Ucrânia está utilizando a recente escalada de tensão com a Rússia em decorrência dos conflitos na região fronteiriça entre os dois países para negociar mais apoio dos Estados Unidos e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Essa é a opinião de Flávio Rocha, professor de Relações Internacionais da Universidade Federal do ABC e membro do Observatório de Política Externa da instituição. 

Em entrevista a Opera Mundi, Rocha afirmou que o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky “tem que escalar a tensão em relação à região de Donbass [na fronteira com a Rússia] para negociar o apoio dos Estados Unidos e Europa nessa queda de braço”. 

Segundo o especialista, estas são as razões “de fundo” para a escalada do conflito, embora ele opine que nem a Rússia nem os EUA devam efetivamente apoiar o uso de força. Donbass é uma região do leste da Ucrânia majoritariamente controlada por grupos separatistas pró-Moscou que reivindicam independência desde 2014, mesmo ano em que a península da Crimeia, até então sob domínio ucraniano, se anexou à Rússia. 

Para Rocha, a Ucrânia já aceitou que a Crimeia não é mais parte do país e que, por isso, será pior se Kiev não pressionar Moscou pelo controle de Donbass, já que o próprio país e seus aliados ocidentais não reconhecem a autonomia da região. 

O ano de 2022 começou com uma escalda de tensão entre a Rússia e países do Ocidente, somada a estreitas ligações entre Zelensky e a Casa Branca, que acusaram Moscou de estar preparando uma "invasão" à Ucrânia. O presidente norte-americano Joe Biden, em conversa com seu homólogo ucraniano no dia 2 de janeiro, deu a garantia de que Washington iria “responder de forma decisiva” caso haja uma ofensiva russa sobre o país europeu. 

Os EUA têm insistido na tese de que a Rússia planeja atacar o país vizinho, por conta de movimentações de tropas nas fronteiras. Moscou, por sua vez, reiterou em inúmeras ocasiões que nunca ameaçou a Ucrânia e que só irá utilizar a força como forma de defesa contra o expansionismo da Otan. 

"Vocês afirmam que nós temos a intenção de atacar a Ucrânia, por mais que nós já tenhamos explicado que isso não é verdade", disse o ministro das Relações Exteriores russo, Sergei Lavrov, após reunião com o secretário de Estado norte-americano Antony Blinken na última sexta-feira (21/01). 

Expansionismo da Otan para o leste

Sobre os interesses de Moscou, Rocha destaca que o Kremlin “sempre quis construir uma série de estados tampão entre a fronteira russa e os países ocidentais, que historicamente representaram uma ameaça ao seu território”. 

Entretanto, argumenta o professor, esse objetivo foi frustrado com o fim da União Soviética, em 1991, que acabou com o pacto de países que até então compunham uma aliança de repúblicas socialistas. O que sobrou foi o compromisso do então presidente George Bush que afirmou, em 1989, que a Otan não se moveria “nem um centímetro” para o leste. 

“Mas nos anos 1990, aproveitando o enfraquecimento da Rússia, eles fizeram justamente o oposto”, pondera o professor. Desde então, ao menos 13 países passaram a integrar a aliança militar ocidental. 

Segundo Rocha, do ponto de vista estratégico, econômico e agrícola, a Ucrânia era importante para a URSS. Com a queda do bloco socialista, o país ficou abalado, já que “parte do arsenal nuclear e de projetos tecnológicos eram gestados e criados ali”.

“Isso começa a mudar quando [Vladimir] Putin chega ao poder, em 2000”, declara o especialista. Segundo ele, o objetivo do então recém-eleito presidente, aliado a uma burocracia econômica e militar, era o de tirar a Rússia do “atoleiro” e recuperar “parte da influência russa nos negócios locais e mundiais”, colocando o país no mesmo patamar dos EUA e da China. 

Nesse contexto de disputa por influência que a Ucrânia entrou em ebulição em 2014. Conflitos e manifestações pelas ruas da capital Kiev culminaram na deposição do presidente Viktor Yanukovich, próximo a Moscou e a Putin, depois que ele se recusou a assinar um acordo de associação econômica com a União Europeia. 

Wikicommons
Presidente Volodymyr Zelensky ao lado do homólogo norte-americano Joe Biden

A Ucrânia, então, excluiu o idioma russo como uma das línguas oficiais no país e, em resposta, a Crimeia, então península ucraniana, se anexou à Rússia - processo que contou com referendo junto à população local com 96,8% votando pela anexação. 

Processo similar ocorreu na formação das República Popular de Donetsk e República Popular de Lugansk, ambas na região de Donbass. Em 12 de maio de 2014, as duas repúblicas separatistas conquistaram a independência por meio de um referendo em que mais de 80% da população local afirmou seu desejo de não fazer mais parte da Ucrânia. 

“A Rússia reage na Ucrânia com apoio aos separatistas na região de Donbass e na separação da Crimeia'', explica Rocha. 

Gasoduto e protestos no Cazaquistão 

Outro aspecto relevante na equação geopolítica da fronteira russo-ucraniana, segundo Rocha, é o gasoduto Nord Stream 2, que foi construído para dobrar a capacidade de transporte de gás natural da Rússia até a Alemanha. O projeto foi concluído em setembro de 2021, com 1,2 mil quilômetros de extensão, desde a cidade de Vyborg, na Rússia, até Greifswald, na Alemanha. 

O atalho criado com o Nord Stream 2 pelo Mar Báltico possibilitaria um desvio de rota para a Rússia, já que com as atuais instalações o país segue dependendo da Ucrânia, da Polônia e de países bálticos, como Estônia, Lituânia e Letônia, para transferir gás para a Europa, além do fato de ter que pagar taxas a Kiev. 

Com essa nova rota de transporte, a Ucrânia poderia perder até US$ 3 bilhões por ano, já considerando as perdas que o país teve com a criação do gasoduto TurkStream, que passou a enviar gás russo para a Turquia e Bulgária.

Para Rocha, apesar de ainda não estar em funcionamento, o gasoduto representa uma derrota para a geopolítica para Washington. “Não só o governo Trump, mas Biden também se opôs ao gasoduto. A hora que ele começar a funcionar pra valer, ele vai ser um calcanhar de Aquiles não só pra EUA e Europa, mas pra Ucrânia também”, disse. 

O professor da UFABC também elencou as manifestações que aconteceram no Cazaquistão no início do ano como um elemento importante na atual escalada de tensão entre Moscou e Kiev. O estopim para os protestos foi quando o governo do então premiê Askar Mamin anunciou uma alta no aumento do preço do gás liquefeito de petróleo (GLP), que é usado tanto nas residências como para abastecer veículos.

Com a insatisfação que se espalhou pelo país, o governo agiu rápido para tentar conter as centenas de pessoas que saíam às ruas. Algumas das medidas tomadas nesse contexto foram a renúncia do então premiê cazaque, o congelamento do preço do GLP por seis meses e o pedido de ajuda a Moscou, que enviou tropas de paz ao país por meio da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (CSTO, na sigla em inglês). 

Rocha avalia que é importante ao Cazaquistão manter boas relações tanto com a Rússia quanto com a China, pois além da proximidade estratégica, ainda há uma dependência econômica entre os países. 

“É interessante para o Cazaquistão manter boas relações com os chineses e russos, já que o país fica exatamente no meio da rota da seda”, afirma Rocha, em referência a um novo corredor comercial e logístico, marítimo e terrestre, que tem sido desenvolvido pela China. 

Ele afirma ainda que as vantagens desta relação são “questões logísticas”, mas que casos de desestabilização no Cazaquistão como os protestos recentes também podem afetar os países vizinhos. 

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Análise

Patentes na OMC é uma derrota para os países do Sul Global

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Pandemia de covid-19 reativou a debate sobre a quebra de patentes para medicamentos e vacinas. Apesar de sua união em torno do tema, países subdesenvolvidos sofreram uma derrota

Alessandra Monterastelli

Outras Palavras Outras Palavras

2022-07-06T22:35:00.000Z

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No dia 17 de junho, saiu fumaça branca das chaminés da Organização Mundial do Comércio (OMC). A entidade, responsável pela regulação de patentes internacionais, anunciou que chegara a uma conclusão sobre as vacinas contra o coronavírus. Tratava-se do pedido de isenção do acordo TRIPS – sigla em inglês para Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio. Firmado na virada do século, tal compromisso obriga os países-membros da OMC a adotar padrões mais rigorosos de proteção patentária. Consequentemente, encarece o acesso às inovações tecnológicas, inclusive no setor farmacêutico. Mas a decisão final foi amplamente criticada por ativistas da saúde e movimentos populares em todo o mundo, já que a OMC rejeitou a isenção total do TRIPS. 

Em 2020, diante da disseminação do novo coronavírus, África do Sul e Índia protocolaram a proposta de isenção do Acordo, que obteve amplo apoio dos países em desenvolvimento e de baixa renda – com exceção do Brasil. A nova decisão foi saudada pelo Secretariado da OMC e por representantes de países ricos como um resultado sem precedentes, mas ativistas condenam que, na prática, a decisão não atende as necessidades mínimas da maior fatia do mundo. “Houve um esvaziamento da proposta pelos países mais ricos. O texto perdeu totalmente sua força, não trouxe nada novo”, explica Felipe Carvalho, Coordenador Regional da Campanha de Acesso do Médicos Sem Fronteiras ao Outra Saúde.

A conclusão do órgão concedeu uma exceção temporária à restrição das quantidades de vacinas que podem ser exportadas sob licença compulsória; diagnósticos e tratamentos não estão incluídos e devem obedecer ao limite de exportação durante o tempo de licença compulsória – decretada durante emergências sanitárias, como é o caso da pandemia. Além disso, a concessão vale apenas para responder à covid-19 e não tem validade diante de outras crises de saúde. O acordo final não inclui o compartilhamento de segredos comerciais e know-how de fabricação, o que prejudicará a produção de vacinas com tecnologia avançada por países de baixa renda – como é o caso dos imunizantes de RNA.

Carvalho conta que o problema é abordado com frequência em reuniões escpecais da OMS e da ONU.  “Existe um consenso entre especialistas e órgãos multilaterais de que as patentes causam constantes crises de acesso e inovação na saúde”. Em maio, o The Guardian divulgou que a Pfizer lucrou 25,7 bilhões de dólares só no início de 2022 – mais da metade do valor está relacionado à venda de vacinas contra a covid-19. Tim Bierley, ativista do Global Justice Now, denunciou ao jornal britânico que apesar do apelo da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras organizações, a farmacêutica seguia se recusando a compartilhar a tecnologia de produção do imunizante. O diretor da OMS, Tedros Adhanon, afirmou em 2021 que a pandemia estava sendo prolongada por uma “escandalosa desigualdade” diante do acúmulo de doses de imunizantes por países ricos enquanto países pobres não conseguiam avançar em sua meta de vacinação em massa. 

“Desde a criação do acordo TRIPs nós temos um cenário de constantes crises de acesso a medicamentos essenciais”, conta Felipe. Ele relembra o caso emblemático da epidemia de HIV/AIDS, na década de 1990. “Em 1996 surgiu a primeira terapia para a doença. As pessoas pararam de morrer e passaram a conviver com o vírus. Mas essa terapia não chegou nos países onde o cenário era mais grave”, explica. O ano de 1996 foi também quando o acordo TRIPS entrou em vigor, após sua criação em 1994 e preparação em 1995. “A partir daí se criou uma coalizão na sociedade civil, da qual fazemos parte, chamada Movimento de Luta pelo Acesso a Medicamentos. A pergunta era: por que os preços eram tão altos e o tratamento se tornava inacessível para milhões de pessoas? Nos aprofundamos no sistema de patentes e entendemos que o monopólio era a causa”, relembra.

Apesar do TRIPS possuir cláusulas que permitem flexibilizações, elas são de difícil utilização devido a dois fatores principais: sua não-incorporação completa em leis de países-membros e a pressão que as farmacêuticas exercem sobre as decisões da OMC. Na década de 1990, diante da grave situação vivida na África do Sul – país com maior número de mortes pela AIDS na época – o governo então liderado por Nelson Mandela aprovou uma das medidas previstas no TRIPS para importar genéricos. Na ocasião, Mandela sofreu o processo de 39 farmacêuticas que se opuseram à decisão tomada para conter a crise de saúde pública. Apesar da derrota das corporações na justiça, “esse é um exemplo de como essas empresas e seus países-sede tentam barrar as normas legítimas existentes no TRIPS”, exemplifica Carvalho.

A OMC é uma instituição formada por 164 membros e opera com base na tomada de decisões por consenso. “A OMC falhou em fornecer uma isenção. O acordo coloca os lucros à frente das vidas e mostra que o atual regime de propriedade intelectual falha em proteger a saúde e promover a transferência de tecnologia. Essa não-renúncia estabelece um mau precedente para futuras pandemias e continuará a colocar vidas em risco” declarou Lauren Paremoer, médica e integrante do Peoples’ Health Movement na África do Sul. 

A Health Action International, referência no trabalho para expandir o acesso a medicamentos essenciais, argumentou em nota que a decisão da OMC impõe obstáculos ao licenciamento compulsório, uma das poucas flexibilidades existentes no TRIPS, em troca de uma abertura tímida para a facilitação da exportação de vacinas. Outras entidades representantes da sociedade civil já denunciaram a atuação dos países ricos e vêm aumentando a pressão sobre os governos. O objetivo, segundo seus porta-vozes, é que sejam tomadas medidas concretas para desafiar as regras de monopólio farmacêutico da OMC e garantir mais acesso a medicamentos e tecnologias. 

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