Liderados por Martin Luther King em 1964, milhares de pessoas marcharam nos EUA a favor do direito de voto aos negros. O confronto com autoridades policiais e a violenta repressão do movimento ganharam repercussão internacional, pressionando o governo no ano seguinte a aprovar a Lei de Direitos Eleitorais. A medida deu acesso às urnas a milhões de norte-americanos.
“Estou profundamente decepcionado com a Suprema Corte”. Assim classificou Barack Obama nesta terça-feira (26/06), quase 50 anos depois, a decisão da Justiça norte-americana de declarar inconstitucional parte da Lei de Direitos Eleitorais.
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Presidente Lyndon B. Johnson em reunião com Martin Luther King para debate sobre a Lei de Direitos Eleitorais
Os parágrafos derrubados ontem estabelecem que nove estados – conhecidos por promover no passado segregação racial e social – precisassem de uma autorização para fazer alterações em suas leis eleitorais. Com a decisão, os estados citados pela lei poderão solicitar ao governo federal sua própria legislação a cerca de, por exemplo, quem pode votar ou não. São eles: Alabama, Alasca, Arizona, Geórgia, Louisiana, Mississippi, Carolina do Sul, Texas e Virgínia.
A lei em questão ficou conhecida por proteger durante décadas o direito ao voto de minorias – como negros e imigrantes – das investidas conservadoras dos estados segregacionistas. Diversos congressistas republicanos, por exemplo, defendem a adoção de um documento “do governo norte-americano” para que o cidadão possa votar.
Como nos EUA o principal documento de identidade é a habilitação de motorista, uma medida como essa impediria que milhares de cidadãos, sobretudo os mais pobres, tivessem acesso às urnas. Existem outros diversos mecanismos – que os democratras chamam de “manobras” – como o da “drive license” para bloquear as camadas populares do direito ao voto.
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A questão da segregação racial e social é, sem dúvida, o ponto chave da discussão acerca da decisão da Suprema Corte ontem. “Hoje o país não está mais dividido como estava em 1965 e, após 50 anos, as coisas mudaram muito”, disse o presidente da Suprema Corte, John Roberts, no texto que definiu as alterações. “Não podemos nos basear em dados de várias décadas e em práticas erradicadas”, reiterou em alusão ao dados referentes ao racismo e discriminação social nos nove estados.
Agência Efe
Grupos conservadores acreditam que Barack Obama é o anticristo
O argumento da Suprema Corte é que o país superou os problemas raciais e que é o momento de “seguir em frente”, confiando na maturidade política e social nos EUA.
No entanto, dizem cientistas políticos, legislações locais acerca dos Direitos Eleitorais favoreceriam os conservadores, uma vez que os populares votam maciçamente nos Democratas, do afrodescendente Barack Obama. Além disso, ajudariam a promover a segregação racial, embora em número menor do que nas décadas passadas. “Ontem a Suprema Corte definiu, na verdade, que acabou o racismo nos EUA”, ironizou o cientista político, Adam Serwer, em entrevista ao portal Mother Jones.
Os exemplos de racismo e segregação acontecem diariamente nos EUA. Em 2011, em grampo telefônico do FBI, o senador republicano Scott Beason, defensor das mudanças eleitorais, foi flagrado se referindo aos negros do EUA como “aborígenas”.
Já na semana passada no Arizona, um aposentado negro foi detido sob acusação de dirigir embriagado, mesmo com o teste do bafômetro apontando 0% de álcool no organismo do motorista. “Sou parado em média cinco vezes a cada 20 quilômetros que percorro nessa cidade”, disse.
“A decisão de hoje mina décadas de práticas positivas que garantiram que o voto fosse justo, especialmente em regiões onde a discriminação tem sido historicamente muito ativa”, declarou Obama.