O ex-governador Alan Jara, libertado ontem (3) após ficar sete anos em poder das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), disse que a guerrilha não está derrotada e ainda há muitos guerrilheiros em ação. Também criticou o presidente Álvaro Uribe.
“Nos montes, há muitos deles e a maioria é de jovens”, afirmou Jara durante coletiva de imprensa na noite de ontem. Lembrou também que ainda há ainda muitos seqüestrados em poder do grupo.
Segundo dados da imprensa colombiana, ainda há mais de 700 reféns em poder das Farc, sendo cerca de 20 considerados reféns “canjeables”, ou seja, policiais, soldados e políticos que a guerrilha pretende usar como moeda de troca para libertar os cerca de 500 guerrilheiros presos – o ex-deputado Sigifredo Lopez deve ser libertado amanhã, com os mesmos helicópteros brasileiros que resgataram Jara.
O ex-governador revelou dificuldades enfrentadas na selva. Contou que, há dois anos, dois colegas permanecem acorrentados durante todo o dia, praticamente colados um ao outro. “Se um quer ir ao banheiro, o outro tem que ir junto”.
As correntes também são usadas nas caminhadas. “É uma situação triste, dolorosa. Até os guerrilheiros parecem ter pena ao colocar as correntes”, afirmou. “Mas o mais difícil são as correntes da indiferença, e elas estão sendo pouco a pouco eliminadas”.
Ao contrário de outros reféns políticos que deixaram o cativeiro elogiando o presidente Álvaro Uribe, como Ingrid Betancourt, Alan Jara fez o contrário, segundo jornais colombianos. “Sinto de todo o coração que Uribe não fez nada pela nossa libertação”.
Para ele, aqueles que seguem em poder da guerrilha sofrem com a omissão. “Há o algoz, que são as Farc, que é quem dispara e assassina quando julga necessário, e há uma omissão quando nada é feito para impedi-los”.
O ex-governador considera que o governo peca ao não assinar um acordo humanitário, que pressupõe a libertação de guerrilheiros presos em troca de reféns. “Parece que para o presidente, a guerra no país é conveniente. E que é benéfico para as Farc ter Uribe no poder, pois ambos apontam para o mesmo lado: o não avanço do intercâmbio”.
Uribe: devolver guerrilheiros, não
Logo após as declarações, o ex-governador se encontrou com Uribe, que respeitou as críticas feitas pouco antes e se limitou a defender sua conduta. “Não se passou um só dia em que na agenda do governo não estivesse presente o tema dos seqüestrados”, disse. Segundo ele, sua administração fez esforços e cedeu em alguns pontos para que muitos conquistassem a liberdade.
Uribe destacou que diálogos com as Farc são benvindos, mas reiterou ser contra a devolução de guerrilheiros presos como moeda de troca. “Se querem um processo de paz de boa fé, estamos prontos. Se querem um intercâmbio sério, com a condição que saiam da prisão e não ingressem novamente no grupo, estamos prontos. Caso isso seja assegurado, o governo enviará pessoas amanhã para dialogar”.
Se criticou Uribe, Alan Jara se disse grato pelo empenho da senadora Piedad Córdoba e Hugo Chávez. O presidente venezuelano intermediou algumas negociações para operações de resgate, mas houve diversos atritos entre ele e Uribe.
Sete semanas caminhando
O processo de libertação do ex-governador teve início em 21 de dezembro de 2008, quando as Farc anunciaram que iriam soltar seis reféns – ainda falta um. Jara conta que, pouco antes da decisão, sua jornada pela selva começou. Disse que “caminhou durante sete semanas” e calcula ter percorrido 150 quilômetros, “sem contar um trecho feito em lancha”.
Restrepo renuncia, diz revista
O alto comissário para a paz do governo colombiano, Luis Carlos Restrepo, coordenador da parte oficial das operações de resgate, renunciou hoje ao cargo após ter sido desautorizado na decisão de impedir que a imprensa tivesse acesso ao aeroporto onde Jara desembarcou.
A informação é da revista Semana, que não citou a fonte. Procurado pela agência EFE, um porta-voz do governo disse desconhecer a decisão.
Funcionários da área de comunicação do governo teriam criticado Restrepo pela atitude relativa à imprensa, que a qualificou como censura. O debate levou o governo a desautorizar Restrepo, que imediatamente retornou a Bogotá.
Segundo a edição eletrônica do jornal El Espectador, a decisão de Restrepo desagradou a Uribe, que “pediu que essa medida fosse invalidada”. Restrepo ocupa o cargo desde agosto de 2002, quando o presidente assumiu.
NULL
NULL
NULL