A menos de dez dias da eleição presidencial no Irã, a rede estatal televisiva IRIB transmitiu nesta quarta-feira (05/06) o segundo debate entre os oito candidatos.
Com foco na cultura, as discussões polarizaram os reformistas Hassan Rouhani e Mohammad Reza-Aref, de um lado, e os conservadores (e próximos do líder supremo Aiatolá Khamenei) Saeed Jalili e Mohammad-Bagher, de outro.
“Não podemos tratar nossos artistas e especialistas culturais como empregados do governo… proibindo livros e filmes de serem publicados, isso é errado”, disse Aref, vice-presidente do país durante o governo de Mohammad Khatami (1997-2005).
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“Nossa revolução [em 1979] foi uma revolução cultural e, depois de 35 anos, nós não alcançamos [nossos objetivos culturais]”, disse Rouhani, o único clérigo entre os candidatos, mas também visto como reformista moderado e ex-chefe de negociação nuclear e de segurança nacional.
Segundo Gholam-Ali Haddad-Adel, a “cultura islâmica” deveria ser considerada como a fundação da sociedade daquele país. Ele também pede por “independência cultural” do Irã em relação a influências externas. “Seremos capazes de combater a invasão cultural ocidental somente quando entendermos totalmente nossa cultura primeiro”, afirmou.
Efe
Simpatizantes do conservador Jalili mostram apoio ao candidato durante campanha na Universidade de Teerã (03/06)
Secretário do conselho de segurança nacional e chefe da equipe de negociação nuclear, Jalili disse que o filme “Argo” – que ganhou Oscar de melhor filme em 2012 – mostra como o “inimigo” quer influenciar a sociedade iraniana. Existe uma especulação de que ele seja o favorito de Khamenei, refutada pelo aiatolá durante um discurso desta terça-feira (04/06), que marcava o aniversário da morte do aiatolá Ruhollah Khomeini, fundador da República Islâmica.
Em relação à censura online, Aref afirmou que o filtro na internet ou a ilegalidade de receptores de satélite – comumente usados por cidadãos para assistir a canais estrangeiros – são a melhor solução para a influência ocidental. “Exclusão não é a resposta, mas encorajar nossos jovens a ver nossa TV ao produzir programas de alta qualidade”, defendeu.
Aref se mostrou como o candidato com as críticas mais fortes à repressão estatal contra estudantes e acadêmicos, além de censura online e restrições à mídia. Rouhani também criticou as restrições impostas em universidades, dizendo que isso levou à imigração da elite do país. Por outro lado, Jalili aparece como a figura mais linha-dura sobre manter a situação da mídia e posição do Estado.
Economia
No debate anterior, na sexta-feira (31/05), o foco da discussão foi a economia do país, que está lidando com inflação, desemprego e sanções sobre rendas vindas do petróleo. “A principal política da minha administração será uma economia independente do petróleo”, disse Aref, refletindo a fala dos outros candidatos. Khamenei já havia pedido que a República Islâmica diminuísse a dependência da exportação da commodity.
Nesta segunda-feira (03/06), o presidente dos EUA, Barack Obama, assinou uma nova leva de sanções ao Irã, desta vez com foco na moeda local e no importante setor automotivo. Elas pretendem “isolar o governo iraniano pelo contínuo descumprimento de suas obrigações internacionais”, de acordo com o comunicado do porta-voz da Casa Branca, Jay Carney.
Apesar da crise econômica, o maior temor da população, o aiatolá Ali Khamenei orientou os oito candidatos à Presidência a não fazer “concessões aos inimigos” de Teerã. “Há quem acredite erroneamente que temos que fazer concessões aos inimigos”, declarou, em um discurso televisionado. “Isso é um erro”. Rouhani havia afirmado a necessidade de se iniciar um diálogo direto com os Estados Unidos.
Wikicommons
Todos os candidatos, aliás, indicam concessões externas em algum nível, com exceção de Jalili. Eles também criticam a atual situação econômica do país. Para Aref, “o problema da economia é o domínio dos conservadores sobre ela” e, na opinião de Mohsen Rezaee, presidente de um órgão ideológico do regime, “o próximo governo deve trabalhar duro para resolver as dificuldades econômicas das pessoas”.
(Hassan Rouhani é visto como o candidato com maior propensão a dialogar com o Ocidente)
No entanto, mesmo com as críticas, os aspirantes a presidente do Irã não apresentam propostas concretas para melhorar a situação econômica. Além disso, não houve pronunciamentos oficiais sobre a nova rodada de sanções, acompanhada por avisos dos Estados Unidos sobre uma “dolorosa” e “poderosa” escalada de punições.
Múltipla escolha
Houve forte insatisfação entre os candidatos sobre o formato do último debate, que continha uma série de perguntas com respostas múltipla escolha e uma etapa em que o presidenciável deveria responder a primeira coisa que lhe viesse à mente a partir de uma imagem. Rezaee protestou dizendo que “com essas repetitivas, discontínuas e curtas respostas, o povo está sendo prejudicado e os oito aqui estão sendo insultados”.
Ambas as etapas foram canceladas antes do debate desta quarta-feira. O último debate ao vivo antes das eleições no dia 14 de junho será nesta sexta-feira (07/06).
A última eleição presidencial iraniana em 2009 foi marcada por intensos protestos nas ruas devido a suspeitas de que o atual presidente, Mahmoud Ahmadinejad, teria forjado os resultados. Seus opositores reformistas Mir Hossein Mousavi e Mehdi Karroubi estão sob liberdade condicional há dois anos.
* Com informações de Guardian e Al Jazeera