O processo de reintegração dos guerrilheiros do M23 (Movimento 23 de Março), o maior grupo armado da RDC (República Democrática do Congo), à sociedade está prestes a ser concluído, afirmou o general brasileiro Carlos Alberto dos Santos Cruz, comandante da Monusco (Missão de Estabilização das Nações Unidas na República Democrática do Congo), em conversa mantida com internautas nesta terça-feira (16/12). A medida faz parte do processo de desmantelamento do grupo, derrotado militarmente em novembro de 2013, após o brasileiro assumir o comando da missão.
De acordo com o general, nos próximos dias, os cerca de 2.000 ex-combatentes que aceitaram o convite para depor as armas serão reintegrados totalmente ao convívio social, após um período de readaptação.
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Santos Cruz em trincheira nas montanhas de Munigi em agosto de 2013
“Há um problema mais político do que estrutural para essa absorção e não é fácil”. Isso porque, de acordo com o general, “essas pessoas têm um processo de participação social deformado” pelo tempo em que ficaram à margem, na luta armada. Eles participam da estratégia de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração realizado pela Monusco.
Apesar da grande existência de diversos outros grupos ainda em atuação, eles não “ameaçam o governo, não têm força para tomar o poder no país”, esclarece Santos Cruz. Em um país considerado potencialmente um dos mais ricos do mundo, os grupos armados almejam “controlar áreas ricas em recursos naturais, dominar o comércio ilegal. Querem o poder pelo poder e praticam violência contra a população, contra os mais pobres principalmente no leste do país, submetendo a população à barbárie”.
Mas, ao contrário dos outros cerca de 30 grupos armados que ainda atuam na RDC, o M23 tinha uma “pequena agenda política”, aponta o general. Criado em 2012, o grupo formado majoritariamente por pessoas da etnia tutsi objetivava controlar uma região no leste do país, tendo como base questões étnicas e como pauta temas relacionados aos direitos humanos e garantias democráticas.
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Tropas da Tanzânia durante treinamento na RDC
ONU
A ONU está na RDC desde 1999 e teve sua atuação duramente criticada pela inação diante da violência generalizada no país. Para reverter o quadro, de forma inédita, o organismo internacional estabeleceu uma brigada de intervenção com autorização de atacar e desarmar grupos no país.
A missão designada a Santos Cruz, que tem 20 mil homens de 18 países, foi reverter o descrédito da Monusco em um país onde mais de seis milhões de pessoas morreram e número ainda maior foi vítima de estupros e outras práticas violentas em mais de duas décadas de conflito.
Durante a conversa da qual também participaram representantes do site Defesa Net e do Instituto Pandiá Calógeras, o general brasileiro apontou os avanços políticos e econômicos obtidos pelo país nos últimos dois anos.
O “resultado macroeconômico, no entanto, ainda não se reflete em benefício da população de 75 milhões de pessoas. Já a situação política é de expectativa diante da proximidade das eleições presidenciais”, que serão realizadas em 2015, afirmou.
Com experiência também à frente da Minustah (Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti), Santos Cruz comentou as diferenças entre ambos os países. No latino-americano, onde não há, nem nunca houve uma guerra, a ação que impulsionou foi majoritariamente contra “grupos armados que comandavam parte de Porto Príncipe e outras cidades, ou seja, era um conflito urbano com ação de gangues”. No Congo, diferentemente, muitos grupos atuam na forma de uma guerra “não convencional”, como terrorismo, se dedicando “à morte de civis em grande escala criando situação de afastar a população do governo e desacreditando as Forças da ONU para criar um ambiente para a rebelião”, comentou.